SINOPSES DOS
ESCRITOS CIENTÍFICOS DO DR. SIGM. FREUD 1877-1897 (1897)
NOTA
DO EDITOR INGLÊS
INHALTSANGABEN DER
WISSENSCHAFTLICHEN
ARBEITEN
DES PRIVATDOCENTEN DR. SIGM. FREUD
1877-1897
(a) EDIÇÕES ALEMÃS:
1897
Viena: Deuticke. 24 págs. (Edição
particular.)
1940 Int.
Z. Psychoanal, Imago 25 (1), 69-93.(Com o título “Bibliographie und
Inhaltsangaben der Arbeiten Freuds bis zu den Anfaengen der Psychoanalyse”
|Bibliografia e Sinopses dos Trabalhos de Freud até os Primórdios da
Psicanálise”|.)
1952 G.W. 1,
463-88.
(b)TRADUÇÃO INGLESA:
“Abstracts
of the Scientific Writings of Dr. Sigm. Freud (1877-1897)”
Esta tradução, a
primeira em inglês, é de James Strachey.
Freud
fora nomeado Privatdozent na Universidade de Viena em 1885. (Esse posto
era comparável, embora não muito precisamente, à Lectureship |função de
conferencista ou lente| das universidades inglesas.) A etapa seguinte seria a
nomeação como “Professor Extraordinarius” (grosseiramente equivalente ao
Assistant Professor |Professor Assistente|), mas essa nomeação sofreu
longos adiamentos, e só doze anos depois foi que Freud soube que seu nome seria
proposto ao Conselho da Faculdade por dois homens muito eminentes, Nothnagel e
Kraff-Ebing. Esse fato foi relatado numa carta a Fliess de 8 de fevereiro de
1897 (Freud, 1950a, Carta 58). Os pré-requisitos necessários incluíam um
“Curriculum Vitae” (ibid., Carta 59, de 6 de abril) e uma sinopse bibliográfica
das publicações reeditadas aqui. Ela fora concluída antes de 16 de maio (ibid.,
Carta 62) e estava evidentemente impressa em 25 de maio (ibid., Carta 63),
quando Freud enviou uma cópia a Fliess, descrevendo-a, com uma frase tomada de
Leporello, como uma “Lista de todas as belezas etc...” Todos esses
preparativos, no entanto, foram em vão, pois embora o Conselho da Faculdade,
por voto majoritário, recomendasse a nomeação, o consentimento ministerial, de
alçada superior, foi negado em grande parte, sem dúvida por razões
anti-semíticas. Somente após cinco anos, em 1902, Freud foi nomeado professor.
Será
possível notar, caso se faça uma comparação com a bibliografia completa
fornecida no último volume desta edição, que alguns itens foram omitidos da
presente lista por Freud. Esses itens ausentes são, em sua maior parte,
resenhas, artigos menores, e algumas contribuições não assinadas para obras
coletivas. Apenas um único trabalho de certa importância parece ter sido
omitido por lapso - uma conferência sobre a cocaína (1885b) -, e parece
possível que certos fatores inconscientes tenham participado dessa omissão
(Jones, 1953, 106).
A
inclusão dessas sinopses na Edição Standard fornece aos leitores um
oportuno lembrete de que as “obras psicológicas completas” de Freud estão muito
longe de coincidir com as “obras completas” de Freud, e de que os primeiros
quinze prolíficos anos de sua atividade foram inteiramente voltados para as
ciências físicas. Convém notar que o próprio Freud era às vezes algo inclinado
a tecer comentários bastante desdenhosos sobre seus escritos neurológicos,
alguns deles citados adiante. Mas outros neurologistas, mais recentes, estão
longe de concordar com Freud quanto a isso. (Cf. uma discussão do neurologista
suíço Brun, 1936.)
O
leitor poderá notar que a ordem em que Freud dispôs os itens, embora seja mais
ou menos cronológica, não respeita exatamente a seqüência de redação nem a de
publicação.
Somos
imensamente gratos ao Dr. Sabine Strich, do Departamento de Neuropatologia no
Instituto de Psiquiatria da Universidade de Londres, por ler estas sinopses e
orientar a tradução do material neurológico.
(A)
ANTES DA NOMEAÇÃO COMO PRIVATDOZENT
I
“Observações
sobre a configuração e a estrutura delicada dos órgãos lobados descritos como
testículos nas enguias.” |1877b.|
O Dr.
Syrski reconhecera recentemente um órgão disposto aos pares, lobulado e
estriado, na cavidade abdominal da enguia, como sendo o órgão sexual masculino
do animal, órgão que fora procurado por longo tempo. Por sugestão do professor
Claus, investiguei a ocorrência e os componentes tissulares desses órgãos
lobados na estação zoológica de Trieste.
II
“Sobre
a origem das raízes nervosas posteriores na medula espinhal dos Ammocoetes
(Petromyzon planeri).” |1877a|
(Do
Instituto de Fisiologia da Universidade de Viena. Com um clichê.)
A
investigação da medula espinhal dos Ammocoetes mostrou que as grandes células
nervosas descritas por Reissner como ocorrendo na parte posterior da massa
cinzenta (células posteriores) dão origem à fibras radiculares das raízes
posteriores. - As raízes espinhais anteriores e posteriores do Petromyzon, pelo
menos na região caudal, são deslocadas em suas origens umas em relação às
outras e permanecem distintas entre si em seu curso periférico.
III
“Sobre
os gânglios espinhais e a medula espinhal do Petromyzon.” |1878a.|
(Do
Instituto de Fisiologia da Universidade de Viena. Com quatro clichês e duas
xilogravuras.)
As
células ganglionares espinhais dos peixes foram por muito tempo consideradas bipolares,
enquanto as dos animais superiores eram consideradas unipolares. No que
se refere a estes últimos elementos, Ranvier mostrou que seu processo único
ramifica-se em forma de T depois de um pequeno percurso. - Pelo uso de uma
técnica de maceração do ouro foi possível fazer um levantamento completo dos
gânglios espinhais do Petromyzon; suas células nervosas exibem todas as
transições entre bipolaridade e unipolaridade, com ramificação das fibras em
forma de T; o número de fibras da raiz posterior é sistematicamente maior que o
número de células nervosas no gânglio; assim, há “fibras de passagem” e fibras
nervosas “subsidiárias”, as últimas das quais simplesmente se mesclam com os
elementos das raízes. - Um elo entre as células ganglionares espinhais e as
células posteriores da medula espinhal que foram descritas |por Reissner, ver
II acima| é fornecido, no Petromyzon, por elementos celulares expostos na
superfície da medula espinhal entre a raiz posterior e o gânglio. Essas células
dispersas indicam o caminho tomado pelas células ganglionares espinhais no
curso da evolução. - Em relação à medula espinhal do Petromyzon, o artigo
descreve ainda a ramificação bifurcada das fibras comissurais anteriores, a
intercalação das células nervosas nas porções espinhais das raízes anteriores,
e uma rede nervosa muito delicada (que pode ser corada por cloreto de ouro) na
pia máter.
IV
“Nota
sobre um método para as preparações anatômicas do sistema nervoso.” |1879a.|
Modificação
de um método recomendado por Reichert. - Uma mistura de uma parte de ácido
nítrico concentrado, três partes de água, e uma parte de glicerina concentrada,
por destruir o tecido conjuntivo e facilitar a remoção de ossos e músculos, é
útil para desnudar o sistema nervoso central com suas ramificações periféricas,
particularmente em pequenos mamíferos.
V
“Sobre
a estrutura das fibras nervosas e das células nervosas do lagostim-de-rio.”
|1882a.|
As
fibras nervosas do lagostim-de-rio, quando se examinam os tecidos vivos,
apresentam, sem exceção, uma estrutura fibrilar. As células nervosas, cuja
sobrevivência pode ser reconhecida pelos grânulos em seus núcleos, parecem ser
compostas de duas substâncias. Uma destas é reticular e se prolonga nas
fibrilas das fibras nervosas, e a outra é homogênea e se prolonga em sua
substância de base.
VI
“A
estrutura dos elementos do sistema nervoso.” |1884f.|
(Conferência
proferida ante a Sociedade Psiquiátrica, 1882)
Conteúdo
como em V.
VII
“Novo
método para o estudo dos tratos nervosos no sistema nervoso central.” (1884d.|
Quando
seções finas do órgão central, enrijecidas em cromato, são tratadas com cloreto
de ouro, uma solução forte de soda e uma solução de iodeto de cálcio a 10%,
obtém-se uma coloração vermelha a azul que afeta as bainhas medulares ou apenas
os cilindros do eixo. O método não é mais fidedigno do que outros métodos de
coloração com ouro.
VIIa
“Novo
método histológico para o estudo dos tratos nervosos no cérebro e na medula
espinhal.” |1884c.|
Conteúdo
como em VII.
VIII
“Um
caso de hemorragia cerebral com sintomas focais basais indiretos num paciente
portador de escorbuto.” |1884a.|
Relatório
de um caso de hemorragia cerebral num paciente portador de escorbuto, que teve
um rápido desfecho sob observação contínua. Os sintomas são explicados com
referência à teoria do efeito indireto das lesões focais, de Wernicke.
IX
“Sobre
a Coca.” |1884e.|
O
alcalóide da coca, descrito por Nieman |em 1860|, recebeu na época pouca
atenção do ponto de vista dos fins medicinais. Meu trabalho incluiu notas
botânicas e históricas sobre a coca, baseadas nas asserções existentes na
literatura; confirmou, através de experimentos com sujeitos normais, os
notáveis efeitos estimulantes da cocaína, bem como sua ação suspensiva da fome,
sede e sono; e se esforçou por fornecer indicações para o uso terapêutico da
droga.
Entre
essas indicações, assumiu importância, mais tarde, a referência ao possível
emprego da cocaína durante a supressão da morfina. A expectativa proclamada ao
final do trabalho, de que a propriedade de produção de anestesia local da
cocaína encontraria outras aplicações, foi logo depois realizada pelas
experiências de K. Koller com a anestesia da córnea.
X
“Contribuição
para nossos conhecimentos sobre os efeitos da coca.” |1885a.|
Demonstração
dinamométrica do aumento da força motora durante a euforia provocada pela
cocaína. A força motora (medida pela força do aperto de mão) mostra uma
oscilação regular diária (semelhante à da temperatura do corpo).
XI
“Uma
nota sobre o trato interolivar.” |1885d.|
Breves
notas sobre as conexões das raízes do nervo auditivo e a conexão entre o trato
interolivar e o corpo trapezóide transverso, baseada em preparações humanas
incompletamente mielinizadas.
XII
“Um
caso de atrofia muscular com grandes distúrbios da sensibilidade (siringomielia).”
|1885c.|
A
combinação de uma atrofia muscular bilateral, com distúrbio bilateral da
sensibilidade sob a forma de uma paralisia “parcial” e dissociada da sensação,
e com distúrbios tróficos na mão esquerda (que também exibia a mais intensa
anestesia), juntamente com a restrição dos sintomas patológicos à parte
superior do corpo, permitiu, num homem de 36 anos, um diagnóstico in vivo
de siringomielia, afecção que na época era considerada rara e difícil de
reconhecer.
(B)
APÓS A NOMEAÇÃO COMO PRIVATDOZENT
XIII
“Polineurite
aguda dos nervos espinhais e cranianos.” |1886a.)
Um
rapaz de dezoito anos adoeceu sem febre, mas com sintomas generalizados e dores
prolongadas no tórax e nas pernas. Apresentou inicialmente sintomas de
endocardite, mas depois as dores aumentaram e surgiu uma suscetibilidade à
pressão na coluna vertebral e, localizadamente, na pele, nos músculos e nos
troncos nervosos, à medida que a afecção foi tomando uma extremidade após
outra: acentuação dos reflexos, acessos de suor, emaciação localizada e, por
fim, diplopia, distúrbios da deglutinação, paresia facial e rouquidão.
Finalmente, febre, extrema aceleração do pulso e afecção pulmonar. O
diagnóstico de polineurite aguda, feito durante o curso da doença, foi
confirmado pelas constatações post-mortem, que mostraram que todos os
nervos espinhais em suas bainhas estavam injetados, vermelho-acinzentados e
como que reunidos em feixes. Alterações semelhantes nos nervos cranianos.
Endocardite. - De acordo com o patologista |Kundrat|, essa foi a primeira
constatação post-mortem de polineurite a ser feita em Viena.
XIV
“Sobre
a relação do corpo restiforme com a coluna posterior e seu núcleo, com alguns
comentários sobre dois campos da medula oblonga.”|1886b.|
Em
colaboração com o Dr. L. Darkschewitsch (Moscou).
Pelo
estudo de preparações com a medula incompletamente mielinizada pode-se dividir
o corpo restiforme em dois componentes: um “núcleo” (corpo restiforme primário)
e uma “fímbria” (corpo restiforme secundário). Esta última contém o sistema
fibroso olivar, que depois é mielinizado. O corpo restiforme primário, que é
mielinizado antes, divide-se numa “porção nuclear” e numa “porção caudal”. O
núcleo do corpo restiforme primário procede do núcleo da coluna de Burdach e
assim representa uma continuação (em sua maior parte, não cruzada) do trato
centrípeto das extremidades até o cerebelo. A continuação correspondente até o
cérebro é fornecida por meio das fibras arqueadas originárias desse mesmo
núcleo. A porção caudal do corpo restiforme primário é uma continuação direta
do trato espinhocerebelar lateral. - O campo lateral da medula oblonga permite
uma interpretação uniforme de seus componentes. Contém quatro substâncias
cinzentas com os sistemas de fibras delas provenientes, que devem ser
considerados mutuamente homólogos como substâncias em que se originam os nervos
sensoriais que partem das extremidades, e os nervos trigêmeo, vago e auditivo.
XV
“Sobre
a origem do nervo auditivo.” |1886c.|
Descrição
da origem do nervo auditivo, baseada em preparações do feto humano, ilustrada
por quatro desenhos de cortes transversais e um diagrama. O nervo auditivo
reparte-se em três porções, das quais a mais baixa (mais espinhal) termina no
gânglio auditivo e tem continuações através do corno trapezóide e dos tratos do
corpo olivar superior; a segunda pode ser acompanhada, como a raiz auditiva
“ascendente” de Roller, até o que se conhece como núcleo de Deiters; e a
terceira corre para o campo auditivo interno da medula oblonga, de onde
procedem as continuações para o cerebelo. São fornecidos detalhes do
desenvolvimento posterior desses tratos até onde foi possível segui-los.
XVI
“Observação
de um caso grave de hemianestesia num histérico.” |1886d.|
(O
órgão da visão foi examinado pelo Dr. Koenigstein.)
Caso
clínico de um gravador de 29 anos, com história familiar precária, que adoeceu
após uma discussão com seu irmão. O caso proporcionou uma demonstração do
sintoma da hemianestesia sensível e sensorial em sua forma clássica. - O
distúrbio no campo da visão e no sentido da cor é relatado pelo Dr.
Koenigstein.
XVII
“Comentários
sobre a dependência da cocaína e o medo da cocaína.”|1887d.|
(Com
referência a uma conferência de W. A. Hammond.)
O
emprego da cocaína para alívio da abstinência da morfina resultou na má
utilização da cocaína e deu aos médicos a oportunidade de observarem o novo
quadro clínico da dependência crônica da cocaína. Meu ensaio, apoiado no
pronunciamento de um neuropatologista norte-americano, procura mostrar que essa
dependência da cocaína só se manifesta em viciados em outras drogas (tais como
a morfina), não podendo a própria cocaína ser responsabilizada por isso.
XVIII
“Sobre
a hemianopsia na primeira infância.” |1888a.|
Observação
do distúrbio em metade do campo visual em duas crianças, uma de vinte e seis
meses e outra de três anos e três meses, idade em que o sintoma não fora objeto
prévio de registro médico. - Discussão sobre a inclinação lateral da cabeça e
dos olhos que seria observada num dos casos, e sobre a localização da lesão
suspeita. Ambos os casos devem ser classificados entre as “paralisias cerebrais
unilaterais das crianças”.
XIX
Sobre
a Interpretação das Afasias,
estudo crítico. |1891b.|
Depois
que uma base sólida para a compreensão dos distúrbios cerebrais da fala fora
estabelecida pela descoberta e pela localização clara de uma afasia motora e
uma afasia sensorial (Broca e Wernicke), as autoridades puseram-se a investigar
também os sintomas mais sutis da afasia até fatores de localização. Desse modo,
chegaram à hipótese de uma afasia de condução, com formas subcorticais e
transcorticais, motoras e sensoriais. Esse estudo crítico opõe-se a essa
concepção dos distúrbios da fala e procura introduzir, para sua explicação,
fatores funcionais em lugar dos topográficos. As formas descritas como
subcorticais e transcorticais não são explicáveis por uma localização
específica da lesão, mas por condições de capacidade reduzida da condução no
aparelho da fala. De fato, não há afasias causadas por lesão subcortical. Discute-se
também a justificação para se distinguir uma afasia central de uma afasia de
condução. A área da fala no córtex é antes vista como uma região contínua do
córtex, inserida entre os campos motores do córtex e os dos nervos ótico e
auditivo - uma região em que ocorrem todas as comunicações e associações que
servem à função da fala. Os chamados centros da fala revelados pela patologia
do cérebro correspondem meramente aos cantos desse campo da fala; não se
distinguem, funcionalmente, das regiões anteriores; é apenas graças a sua
posição em relação aos centros corticais contíguos que eles produzem os sinais
mais óbvios quando ficam perturbados.
A
natureza do assunto aqui tratado requereu, em muitos pontos, uma investigação
mais detalhada da delimitação entre a abordagem fisiológica e psicológica. As
concepções de Meynert e Wernicke sobre a localização das idéias nos elementos
nervosos tiveram que ser rejeitadas, e a explicação de Meynert de uma
representação do corpo no córtex cerebral exigiu uma revisão. Dois fatos da
anatomia cerebral, a saber, (1) que as massas das fibras que penetram na medula
espinhal são constantemente diminuídas ao se dirigirem para cima, devido à
interposição de massa cinzenta, e (2) que não há vias diretas da periferia do
corpo até o córtex - esses dois fatos levaram à conclusão de que uma
representação realmente completa do corpo está presente apenas na massa
cinzenta da medula (como uma “projeção”), enquanto que, no córtex, a periferia
do corpo é apenas “representada” com menos detalhes através de fibras
selecionadas, dispostas de acordo com sua função.
XX
Estudo
Clínico das Paralisias Cerebrais Unilaterais das Crianças. |1891a|.
(Em
colaboração com o Dr. O. Rie.)
(Nº
III de Beitraege zur Kinderheilkunde |Contribuições à Pediatria|,
organizado pelo Dr. M. Kassowitz.)
Monografia
descrevendo tal afecção, com base em estudos empíricos no Primeiro Instituto
Público de Doenças Infantis de Viena, dirigido por Kassowitz. Trata, em dez
seções, de (1) história e literatura das paralisias cerebrais nas crianças; (2)
trinta e cinco observações do próprio autor, sumariadas em forma tabular e
descritas individualmente; (3) análise dos sintomas individuais do quadro
clínico; (4) anatomia patológica; (5) relações da paralisia cerebral com a epilepsia
e (6) com a poliomielite infantil; (7) diagnóstico diferencial; e (8) terapia.
Uma “paresia coreática” é descrita pelos autores pela primeira vez;
distingue-se pelas características peculiares de sua instalação e seu curso, e
nela a paresia é representada desde o início pela hemicoréia. Há, além disso,
um relato das constatações de uma autópsia (esclerose lobar como conseqüência
de uma embolia da artéria cerebral média) de uma paciente descrita na Iconographie
de la Salpêtrière |3, 22-30|. Enfatizam-se as estreitas relações entre a
epilepsia e as paralisias cerebrais das crianças, em conseqüência das quais
alguns casos de aparente epilepsia mereceriam ser descritos como “paralisia
cerebral sem paralisia”. Com respeito à tão discutida questão da existência de
uma polioencephalitis acuta, que se supõe constituir a base anatômica da
paralisia cerebral unilateral e fornecer uma analogia completa com a poliomyelitis
infantilis, os autores se opõem a essa hipótese de Strümpell; mas sustentam
firmemente a expectativa de que uma concepção modificada da polyomyelitis
acuta infantilis permitirá que ela seja equiparada à paralisia cerebral em
outros termos. Na seção terapêutica, coligem-se os relatórios até então
publicados sobre a intervenção de cirurgiões cerebrais tendo como objetivo a
cura da epilepsia genuína ou da epilepsia traumática.
XXI
“Um
caso de cura pelo hipnotismo, com alguns observações sobre a origem dos
sintomas histéricos através da ‘contravontade’.” |1892-93.|
Uma
jovem mulher, após o nascimento de seu primeiro filho, foi compelida a desistir
de amamentá-lo, em virtude de um complexo de sintomas histéricos (perda de
apetite, insônia, dores nos seios, falta de leite, agitação). Quando, após o
nascimento de um segundo filho, esses obstáculos se repetiram, a hipnose
profunda em duas ocasiões, acompanhada de contra-sugestões, conseguiu remover
os obstáculos, de modo que a paciente se tornou uma excelente mãe e nutriz. O
mesmo resultado foi obtido um ano depois, em circunstâncias similares, após mais
duas hipnoses. Acrescentam-se alguns comentários sobre o fato de que é possível
se realizarem, nos pacientes histéricos, idéias angustiantes ou antitéticas
aflitivas que as pessoas normais são capazes de inibir; várias observações de
tique são relacionadas com esse mecanismo de “contravontade”.
XXII
“Charcot.”
|1893f.|
Um
obituário do mestre da neuropatologia, que morreu em 1893 e entre cujos
discípulos o presente autor se enumera.
XXIII
“Sobre
um sintoma que freqüentemente acompanha a enuresis nocturna nas
crianças.” |1893g.|
Em
cerca de metade dos casos de crianças que sofrem de enurese constatamos uma
hipertonia das extremidades inferiores cuja importância e implicações não estão
explicadas.
XXIV
“Sobre
o mecanismo psíquico dos fenômenos histéricos.”
(Comunicação
preliminar em colaboração com o Dr. J. Breuer.) |1893a.|
O
mecanismo ao qual Charcot reportou as paralisias histerotraumáticas, e cuja
pressuposição lhe permitiu provocá-las deliberadamente em pacientes histéricos
hipnotizados, pode ser também responsabilizado por numerosos sintomas do que se
descreve como histeria não-traumática. Ao hipnotizarmos o histérico e
reconduzirmos seus pensamentos até a ocasião em que o sintoma em questão
apareceu pela primeira vez, emerge nele com nitidez alucinatória a lembrança de
um trauma psíquico (ou de uma série de traumas) ligado àquele tempo,
persistindo o sintoma como um símbolo mnêmico do trauma. Assim, os histéricos
sofrem principalmente de reminiscências. Quando a cena traumática a que se
chegou dessa maneira é vividamente reproduzida, acompanhada por uma geração de
afeto, o sintoma, que até ali se mantivera obstinadamente, desaparece.
Portanto, devemos supor que a lembrança esquecida estivesse agindo na mente
como um corpo estranho, cessando o fenômeno irritante com sua remoção. Essa
descoberta, originalmente feita por Breuer em 1881, pode converter-se na base
de uma terapia dos fenômenos histéricos que merece ser descrita como
“catártica”.
As
lembranças reveladas como “patogênicas”, como as raízes dos sintomas
histéricos, são sistematicamente “inconscientes” para o paciente. Parece que,
por permanecerem inconscientes, elas escapam ao processo de desgaste a que o
material psíquico é normalmente submetido. Esse tipo de desgaste é promovido
pelo método da “ab-reação”. As lembranças patogênicas evitam ser tratadas pela
ab-reação, seja porque as experiências correlatas ocorreram em estados
psíquicos especiais a que as pessoas histéricas são intrinsecamente propensas,
seja porque tais experiências foram acompanhadas por um afeto que acarreta um
estado psíquico especial nas pessoas histéricas. Conseqüentemente, uma
tendência à “divisão (splitting) da consciência” é o fenômeno psíquico
básico nos casos de histeria.
XXV
Uma
Abordagem das Diplegias Cerebrais na Infância (em Conexão com a Doença de
Little). |1893b.|
(Nº
III, Nova Série, de Beitraege zur Kinderheilkunde |Contribuições à
Pediatria|, organizado pelo Dr. M. Kassowitz.)
Suplemento
ao Estudo Clínico das Paralisias Cerebrais Unilaterais das Crianças, resumido
antes como XX |ver em [1]|. A história, a anatomia patológica e a fisiologia da
afecção são aqui tratadas na mesma ordem que na monografia anterior, e os
quadros clínicos pertinentes são ilustrados por cinqüenta e três observações
feitas pelo próprio autor. Entretanto, foi necessário levar também em conta a
gama de formas que devem ser descritas como “diplegias cerebrais” e assinalar
sua semelhança clínica. Em face das diferenças de opinião prevalecentes na
literatura sobre esses distúrbios, o autor adotou o ponto de vista de uma
autoridade mais antiga, Little, e chegou assim à postulação de quatro tipos
principais, descritos como espasticidade geral, espasticidade paraplégica,
coréia geral e atetose bilateral, e hemiplegia espástica bilateral (diplegia
espástica).
A
espasticidade geral inclui as formas a que se costuma fazer referência como
“doença de Little”. A espasticidade paraplégica é o nome dado ao que antes se
considerava como uma afecção espinhal, tabes spastica infantilis. As
diplegias espásticas correspondem muito facilmente a uma duplicação das
paralisias cerebrais unilaterais, mas se caracterizam por uma superfluidade de
sintomas que encontra explicação na natureza bilateral da afecção cerebral. A
justificativa para incluir a coréia geral e a atetose bilateral entre esses
tipos é fornecida por numerosas características do quadro clínico e pela
existência de muitas formas mistas e transicionais que ligam todos esses tipos.
Segue-se
uma discussão das relações desses tipos clínicos com os fatores etiológicos
aqui tomados como atuantes e com o número insuficiente de constatações post-mortem
que têm sido relatadas. Chega-se às seguintes conclusões:
As
diplegias cerebrais podem ser divididas, de acordo com sua origem, em (a)
determinadas congenitamente, (b) surgidas no momento do nascimento, e (c)
adquiridas depois do nascimento. Mas só muito raramente essa distinção pode ser
estabelecida pelas peculiaridades clínicas do caso, não sendo sempre possível
fazê-la pela anamnese. Todos os fatores etiológicos das diplegias são
enumerados: pré-natais (trauma, doença ou choque afetando a mãe, posição da
criança na família); atuantes no momento do nascimento (os fatores enfatizados
por Little, a saber, nascimento prematuro, parto difícil, asfixia); e depois do
nascimento (moléstias infecciosas, trauma ou choque afetando a criança). Não se
pode considerar as convulsões como causas, mas apenas como sintomas da afecção.
O papel etiológico da sífilis hereditária é reconhecido como importante. Não há
nenhuma relação etiológica exclusiva entre uma dada etiologia entre essas e um
dado tipo de diplegia cerebral, mas as relações preferenciais são
freqüentemente evidentes. É insustentável a concepção de que as diplegias
cerebrais são afecções de etiologia única.
São
de muitos tipos as constatações patológicas nas diplegias e, em geral, são as
mesmas das hemiplegias; em sua maior parte, têm a natureza de estados
terminais, dos quais não é invariavelmente possível inferir as lesões iniciais.
Em geral, não permitem uma decisão quanto à categoria etiológica a que um caso
deve ser reportado. Tampouco costuma ser possível deduzir o quadro clínico das
constatações post-mortem, de modo que se deve rejeitar também a
pressuposição de que existam relações íntimas e exclusivas entre os tipos
clínicos e as alterações anatômicas.
A
fisiologia patológica das diplegias cerebrais tem um vínculo essencial com as
duas características pelas quais a espasticidade geral e a paraplégica se
distinguem de outras manifestações de doença orgânica cerebral. Pois em ambas
essas formas clínicas, a contratura predomina sobre a paralisia e as
extremidades inferiores são mais gravemente afetadas do que as superiores. A
discussão desse artigo chega à conclusão de que a afecção mais intensa das
extremidades inferiores em geral e a espasticidade paraplégica devem ser
ligadas à localização da lesão (hemorragia meníngea ao longo da fissura
mediana), e a preponderância de contratura deve ser ligada à superficialidade
da lesão. O estrabismo das crianças diplégicas, que é particularmente comum na
espasticidade paraplégica e quando a etiologia é o nascimento prematuro, é
atribuível às hemorragias retinianas em crianças recém-nascidas, descritas por
Koenigstein.
Uma
seção especial enfoca numerosos casos de ocorrência familiar e hereditária de
doenças infantis que apresentam uma afinidade clínica com as diplegias
cerebrais.
XXVI
“Sobre
as formas familiares de diplegias cerebrais.” |(1893d.|
Observação
de dois irmãos, um de seis anos e meio e outro de cinco, cujos pais eram
parentes consagüíneos, e que apresentavam um complicado quadro clínico que se
desenvolveu gradualmente, num dos casos, desde o nascimento, e no outro, desde
o segundo ano de vida. Os sintomas desse distúrbio familial (nistagmo lateral,
atrofia do nervo óptico, estrabismo convergente alternante, fala monótona e
como que escandida, tremor intencional dos braços, fraqueza espástica das
pernas e um alto grau de inteligência) fundamentam a postulação de uma nova
afecção, que deve ser considerada uma contraparte espástica da doença de
Friedreich e, em vista disso, classificada entre as diplegias cerebrais
familiais. Dá-se ênfase à extensa similaridade desses casos com os descritos
como esclerose múltipla por Pelizaeus, em 1885.
XXVII
|“As
diplegias cerebrais infantis.” |1893e.|
Síntese
das constatações da monografia resumida acima, Nº XXV.
XXVIII
“Considerações
para um estudo comparativo das paralisias motoras orgânicas e histéricas.”
|1893c.|
Comparação
entre as paralisias orgânicas e histéricas, feita sob a influência de Charcot a
fim de chegar a uma linha de abordagem da natureza da histeria. A paralisia
orgânica é perífero-espinhal ou cerebral. Com base nas discussões de meu estudo
crítico da afasias |Nº XIX acima|, a primeira é descrita como paralisia de projeção
e é uma paralisia en détail, enquanto a segunda é descrita como
paralisia de representação e é uma paralisia en masse. A histeria
imita apenas esta última categoria das paralisias, mas tem liberdade para se
especializar, o que a faz assemelhar-se à paralisia de projeção; ela pode
dissociar as áreas de paralisia que ocorrem regularmente nas afecções
cerebrais. A paralisia histérica tende a um excessivo desenvolvimento; pode ser
extremamente intensa e, no entanto, restringir-se estritamente a uma pequena
área, enquanto a paralisia cortical aumenta sistematicamente de extensão
paralelamente ao aumento de sua intensidade. A sensibilidade comporta-se de
maneira diamentralmente oposta nos dois tipos de paralisia.
As
características especiais da paralisia cortical são determinadas pelas
peculiaridades da estrutura cerebral e nos permitem inferir a anatomia do
cérebro. A paralisia histérica, pelo contrário, comporta-se como se a anatomia
cerebral não existisse. A histeria nada sabe sobre a anatomia cerebral. A
alteração que subjaz à paralisia histérica não pode ter nenhuma semelhança com
as lesões orgânicas, devendo, antes, ser buscada nas condições que regem o
acesso a algum círculo específico de representações.
XXIX
“As
neuropsicoses de defesa: tentativa de formulação de uma teoria psicológica da
histeria adquirida, de muitas fobias e obsessões e de certas psicoses
alucinatórias.” |1894a.|
Primeiro
de uma série de artigos breves que aparecem em seguida e se voltam para a
tarefa de preparar uma exposição geral das neuroses em novas bases agora
acessíveis.
A
divisão da consciência não é uma característica primária dessa neurose, baseada
na fraqueza degenerativa, como insiste Janet. É conseqüência de um processo
psíquico peculiar, conhecido como “defesa”, que alguns curtos relatos de
análises mostram estar presente não só na histeria, mas também em inúmeras
outras neuroses e psicoses. A defesa entra em ação quando surge uma situação de
incompatibilidade na vida representativa entre uma determinada representação e
o “ego”. O processo da defesa pode ser figurativamente representado como se a
carga de excitação fosse extraída da representação a ser recalcada e fosse
utilizada de outra maneira. Isso pode ocorrer de vários modos: na histeria, a
soma de excitação liberada é transformada em inervação somática (histeria de
conversão); na neurose obsessiva,ela persiste no campo psíquico e se
vincula a outras representações não incompatíveis em si mesmas e que assim substituem
a representação recalcada. A fonte das representações incompatíveis sujeitas à
defesa é única e exclusivamente a vida sexual. A análise de um caso de psicose
alucinatória mostra que também essa psicose representa um método de chegar à
defesa.
XXX
“Obsessões
e fobias: seu mecanismo psíquico e sua etiologia”. |1895c|
As
obsessões e fobias devem ser distinguidas da neurastenia como afecções
neuróticas independentes. Em ambas |obsessões e fobias| trata-se do vínculo
entre uma representação e um estado afetivo. Nas fobias, este último é sempre o
mesmo, a saber, a angústia; nas obsessões verdadeiras, o afeto pode ser de
vários tipos (autocensura, sentimento de culpa, dúvida etc.). O estado afetivo
emerge como o elemento essencial da obsessão, já que permanece inalterado em
cada caso, enquanto a representação a ele vinculada se modifica. A análise
psíquica mostra que o afeto da obsessão é justificado em todos os casos, mas
que a representação a ele vinculada representa um substituto de uma
representação derivada da vida sexual, que é mais adequada ao afeto e sucumbiu
ao recalcamento. Esse estado de coisas é ilustrado por numerosas análises
curtas de casos de folie du doute, mania de lavar, aritmomania etc., nos
quais a reinstalação da representação recalcada teve êxito e foi acompanhada de
proveitosos efeitos terapêuticos. As fobias, stricto senso, são
examinadas no artigo sobre a neurose de angústia (Nº XXXII).
XXXI
Estudos
sobre a Histeria |1895d.|
(Em
colaboração com o Dr. J. Breuer.)
Esse
volume contém a complementação do assunto aventado na “Comunicação Preliminar”
(Nº XXIV), versando sobre o mecanismo psíquico dos fenômenos histéricos. Embora
resulte de trabalho conjunto dos dois autores, está dividido em seções
separadas, das quais quatro casos clínicos detalhados, juntamente com suas
discussões e o ensaio de uma “Psicoterapia da Histeria” constituem minha parte.
Nesse livro, o papel etiológico desempenhado pela sexualidade é frisado com
maior ênfase do que na “Comunicação Preliminar”, e o conceito de “conversão” é
utilizado para lançar luz sobre a formação dos sintomas histéricos. O ensaio
sobre psicoterapia procura fornecer alguns esclarecimentos sobre a técnica do
procedimento psicanalítico, o único que é capaz de levar à investigação do
conteúdo inconsciente da mente, e de cujo emprego também se pode esperar que
leve a importantes descobertas psicológicas.
XXXII
“Fundamentos
para destacar da neurastenia uma síndrome específica denominada ‘neurose de
angústia’.” |1895b.|
A
conjunção de um agrupamento constante de sintomas com um determinante etiológico
específico possibilita destacar do campo múltiplo da “neurastenia” uma síndrome
que merece o nome de “neurose de angústia”, porque todos os seus componentes
procedem dos sintomas de angústia. Estes devem ser considerados como
manifestações imediatas de angústia ou como rudimentos e equivalentes delas (E.
Hecker), e estão freqüentemente em completa oposição aos sintomas que
constituem a neurastenia propriamente dita. A etiologia das duas neuroses
também aponta para uma oposição desse tipo. Enquanto a neurastenia verdadeira
decorre de emissões espontâneas ou é adquirida através da masturbação, os
fatores pertinentes à etiologia da neurose de angústia são tais que
correspondem a um refreamento da excitação sexual - por exemplo, a abstinência
quando a libido está presente, a excitação não consumada e, acima de tudo, o
coito interrompido. Na vida real, as neuroses aqui distinguidas costumam
aparecer combinadas, embora também seja possível demonstrar casos puros. Quando
se submete esse tipo de neurose mista à análise, é possível indicar uma mistura
de várias etiologias específicas.
A
tentativa de chegar a uma teoria da neurose de angústia leva a uma fórmula
segundo a qual seu mecanismo reside no desvio da excitação sexual somática
do campo psíquico e num conseqüente emprego anormal dessa excitação. A
neurose de angústia é a libido sexual transformada.
XXXIII
“Resposta
às críticas a meu artigo sobre a neurose de angústia.” |1895f.|
Réplica
às objeções feitas por Loewenfeld ao conteúdo do Nº XXXII. O problema da
etiologia da patologia das neuroses é aqui enfocado para justificar a divisão
dos fatores etiológicos que aparecem em três categorias: (a)
precondições; (b) causas específicas e (c) causas concorrentes ou
auxiliares. As chamadas precondições são os fatores que, embora indispensáveis
para produzir o efeito, não podem por si mesmos produzi-lo, mas necessitam,
adicionalmente, das causas específicas. As causas específicas distinguem-se das
precondições pelo fato de figurarem em apenas algumas fórmulas etiológicas,
enquanto as precondições desempenham o mesmo papel em numerosas afecções. As
causas auxiliares são de tal ordem que nem precisam estar invariavelmente
presentes, nem podem, por si mesmas, produzir o efeito em questão. - No caso
das neuroses, é possível que a precondição seja a hereditariedade; a causa
específica reside nos fatores sexuais; tudo o mais que, afora isso, é apontado
como formador da etiologia das neuroses (sobrecarga de trabalho, emoção, doença
física), constitui uma causa auxiliar e não pode nunca substituir inteiramente
o fator específico, embora sem dúvida possa servir como substituto dele no que
concerne à quantidade. A forma de uma neurose depende da natureza da
causa sexual específica; a ocorrência efetiva de uma doença neurótica é
determinada por fatores que atuam quantitativamente; a hereditariedade funciona
como um multiplicador inserido num circuito elétrico.
XXXIV
“Sobre
o distúrbio de Bernhardt da sensibilidade na coxa.” |1895e.|
Auto-observação
dessa afecção inofensiva, provavelmente atribuível à neurite local; e relatório
sobre alguns outros casos, inclusive bilaterais.
XXXV
“Observações
adicionais sobre as neuropsicoses de defesa.” |1896b.|
(1) A
etiologia específica da histeria. A continuação do trabalho psicanalítico
com sujeitos histéricos teve o resultado uniforme de mostrar que os eventos
traumáticos suspeitados (como símbolos mnêmicos dos quais os sintomas
histéricos persistem) ocorrem na primeira infância dos pacientes e devem
ser descritos como abusos sexuais no sentido mais restrito.
(2) A
natureza e o mecanismo da neurose obsessiva. As representações obsessivas
são, invariavelmente, autocensuras transformadas, que reemergiram do
recalcamento e estão sempre relacionadas com algum ato sexual praticado com
prazer na infância. Investiga-se o curso tomado por esse retorno do recalcado,
bem como o trabalho de defesa primária e secundária.
(3) Análise
de um caso de paranóia crônica. Essa análise, relatada em detalhe, indica
que a etiologia da paranóia deve ser buscada nas mesmas experiências sexuais da
primeira infância, nas quais já fora descoberta a etiologia da histeria e da
neurose obsessiva. Os sintomas desse caso de paranóia são detalhadamente
reportados às atividades de defesa.
XXXVI
“A
etiologia da histeria.” |1896c.|
Relatos
mais detalhados das experiências sexuais infantis que se demonstrou
constituírem a etiologia das psiconeuroses. Em seu conteúdo, essas experiências
devem ser descritas como “perversões”, e os responsáveis devem ser procurados,
em geral, entre os parentes mais próximos do paciente. Discussão das
dificuldades que têm de ser superadas na descoberta dessas lembranças
recalcadas e das objeções que se podem levantar aos resultados assim obtidos.
Demonstra-se que os sintomas histéricos são derivados de lembranças que atuam
inconscientemente, pois só aparecem em colaboração com tais lembranças. A
presença de experiências sexuais infantis é uma condição indispensável para que
os esforços defensivos (que ocorrem também em pessoas normais) resultem na
produção de efeitos patogênicos - ou seja, de neuroses.
XXXVII
“A
hereditariedade e a etiologia das neuroses.” |1896a.|
As
constatações a que a psicanálise chegou até agora sobre a etiologia das
neuroses são aqui empregadas para criticar teorias atuais da onipotência da
hereditariedade na neuropatologia. O papel desempenhado pela hereditariedade
tem sido superestimado em vários sentidos. Primeiramente, por incluir entre as
doenças neuropáticas hereditárias estados como as dores de cabeça, as nevralgias
etc, que são muito provavelmente atribuíveis, em geral, a afecções orgânicas
das cavidades cranianas (o nariz). Em segundo lugar, por considerar qualquer
enfermidade nervosa que se descubra entre os parentes como evidência de uma
tara hereditária, e assim, desde logo, não deixando nenhum espaço para as
doenças neuropáticas adquiridas que não possuam força comprobatória
similar. Em terceiro lugar, o papel etiológico da sífilis tem sido mal
compreendido e as moléstias nervosas dela derivadas têm sido atribuídas à
hereditariedade. Mas, além disso, é viável levantar-se uma objeção geral contra
uma forma de hereditariedade descrita como “herança dissimilar” (ou herança com
modificação da forma da doença), à qual se concede um papel muito mais
importante que o atribuído à herança “similar”. Contudo, quando se demonstra
uma tara hereditária numa família pelo fato de seus membros serem
alternadamente afetados por toda sorte de doenças nervosas - coréia, epilepsia,
histeria, apoplexia etc. -, sem qualquer determinante mais preciso, então, ou
necessitamos de um conhecimento das leis segundo as quais essas doenças se
sucedem, ou fica aberto o espaço para as etiologias individuais que determinam
precisamente a escolha do estado neuropático que efetivamente resulta delas. Se
existem tais etiologias particulares, são elas as tão almejadas causas
específicas das várias formas clínicas diferentes, e a hereditariedade é
restituída ao papel de requisito ou precondição.
XXXVIII
Paralisias
Cerebrais Infantis. |1897a.|
Esse
é um resumo dos dois trabalhos sobre o mesmo tema publicados em 1891 e 1893
|Nos. XX e XXV|, juntamente com os acréscimos e alterações que desde então se
fizeram necessários. Estes afetam o capítulo sobre a poliomyelitis acuta,
que nesse ínterim foi reconhecida como uma doença não-sistemática, o capítulo
sobre a encefalite como um processo inicial de hemiplegia espástica, e o
capítulo sobre a interpretação dos casos de espasticidade paraplégica, cuja
natureza cerebral tem sido recentemente posta em dúvida. Uma discussão especial
refere-se às tentativas de fracionar o conteúdo das diplegias cerebrais em
várias entidades clínicas claramente divididas, ou pelo menos de destacar o que
se conhece como “doença de Little”, como individualidade clínica, da mistura de
formas de afecções similares. As dificuldades em que esbarram tais tentativas
são assinaladas, e se sustenta como única posição justificável a de que a
“paralisia cerebral infantil” deve ser mantida, no momento, como um conceito
clínico coletivo para todo um conjunto de afecções similares com etiologia
exógena. O rápido incremento das observações de distúrbios nervosos familiares
e hereditários em crianças, que se assemelham em muitos pontos às paralisias
cerebrais infantis, tem criado a premência de se coligirem essas novas formas e
de se buscar traçar uma distinção fundamental entre elas e as paralisias
cerebrais infantis.
APÊNDICE
A. Obras
escritas sob minha influência
E.
Rosenthal, Contribution à l’étude des diplégies cérébrales de l’enfance.
Thèse de Lyon. (Médaille d’argent.) (1892.).
L. Rosenberg, Casuistische Beitraege zur Kenntnis der cerebralen
Kinderlaehmungen und der Epilepsie. (Nº IV, Nova Série, de Beitraege zur Kinderheilkunde, organizado
por Kassowitz.) (1893.).
B. Traduções
do francês.
J.-M.
Charcot, Neue Vorlesungen über die Krankheiten des Nervensystems,
insbesondere über Hysterie. (Toeplitz & Deuticke, Viena.) |1886f.|
H. Bernheim, Die Suggestion und ihre Heilwirkung. (Fr. Deuticke,
Viena.) |1888-89.| (Segunda edição, 1896.)
H. Bernheim, Neue Studien über Hypnotismus, Suggestion und
Psychotherapie. (Fr. Deuticke, Viena.) |1892a.|
J.-M. Charcot, Poliklinische Vortraege. Vol. I. (Leçons du
Mardi.) Com notas do tradutor.
(Fr. Deuticke, Viena.) |1892-94.|
A SEXUALIDADE NA
ETIOLOGIA DAS NEUROSES (1898)
DIE SEXUALITAET IN
DER AETIOLOGIE DER NEUROSEN
(a)EDIÇÕES ALEMÃS:
1898 Wien.
klin. Rdsch., 12 (2), 21-2, (4), 55-7, (5), 70-2, (7), 103-5. (9, 23 e 30
de janeiro e 13 de fevereiro.)
1906 S.K.S.N., 1, 181-204. (1911, 2ª ed.; 1922, 4ª ed.)
1925 G.S., 1,
439-64.
1952 G.W., 1,
491-516.
(b)TRADUÇÃO INGLESA:
“Sexuality
in the Aetiology of the Neuroses”
1924 C.P.,
1, 220-48. (Trad. de J. Bernays.)
A presente tradução é
uma versão modificada da publicada em 1924.
Este
artigo foi concluído em 9 de fevereiro de 1898, como nos informa uma carta a
Fliess (Freud, 1950a, Carta 83.) Já fora iniciado um mês antes (ibid., Carta
81) e, em ambas as cartas, Freud o trata desdenhosamente como um artigo “Gartenlaube”.
Este era o título (literalmente, “caramanchão”) de uma revista de assuntos
domésticos cujo nome se tornara proverbial por suas histórias sentimentais. Mas
ele acrescenta que o artigo “é bastante impudente e basicamente destinado a
criar caso, no que sem dúvida terá êxito. Breuer dirá que me causei muitos
prejuízos.”
Dois
anos se haviam passado desde o último artigo de Freud sobre psicopatologia, “A
Etiologia da Histeria” (1896c), e durante esses dois anos muita coisa
acontecera para ocupar sua mente. Talvez a menos importante (pelo menos do nosso
ponto de vista) tenha sido a conclusão, em inícios de 1897, de seu tratado de
trezentas páginas sobre as paralisias infantis para a grande enciclopédia de
medicina de Nothnagel, no qual estivera ocupado por vários anos, muito a
contragosto, e que foi seu último trabalho neurológico. Cf., por exemplo, as
cartas a Fliess de 20 e 31 de outubro e 8 de novembro de 1895, 4 de julho e 2
de novembro de 1896, e 24 de janeiro de 1897 (Freud, 1950a, Cartas 32, 33, 35,
47, 50 e 57). Uma vez ultrapassada essa tarefa, ele podia devotar-se mais
completamente à psicologia, e logo se envolveu num evento que se revelaria um
marco memorável - sua própria auto-análise.Esta começou no verão de 1897 e, já
pelo outono, conduzira a algumas descobertas fundamentais: o abandono da teoria
traumática da etiologia das neuroses (21 de setembro, Carta 69), a descoberta
do complexo de Édipo (15 de outubro, Carta 71) e o reconhecimento gradual da
sexualidade infantil como um fato normal e universal (p.ex. 14 de novembro,
Carta 75.)
De
todos esses desenvolvimentos (e dos avanços paralelos na compreensão de Freud
da psicologia do sonho) não há praticamente nenhum vestígio no presente artigo,
o que sem dúvida explica o desdém de seu autor por ele. Quanto aos aspectos
fundamentais, ele não vai além do ponto atingido dois anos antes: Freud se
reservava para seu grande esforço subseqüente, que ocorreria dali a mais dois
anos, em A Interpretação dos Sonhos (1900a).
Mas,
se a primeira parte do trabalho contém pouco mais que uma reafirmação das concepções
anteriores de Freud sobre a etiologia das neuroses, a argumentação também nos
apresenta algo de novo - uma abordagem de problemas sociológicos. A crítica sem
rodeios aqui feita à atitude da profissão médica em relação aos assuntos
sexuais, particularmente à masturbação, ao uso de anticoncepcionais e às
dificuldades da vida conjugal, prenuncia toda uma série de restrições
posteriores de Freud às convenções sociais da civilização - começando com o
artigo sobre “Moral Sexual ‘Civilizada’” (1908d) e findando com O Mal-Estar
na Cultura (1930a).
A
SEXUALIDADE NA ETIOLOGIA DAS NEUROSES
Pesquisas
exaustivas durante os últimos anos levaram-me a reconhecer que as causas mais
imediatas e, para fins práticos, mais importantes de todos os casos de doença
neurótica são encontradas em fatores emergentes da vida sexual. Essa teoria não
é inteiramente nova. Uma certa dose de importância tem sido concedida aos
fatores sexuais na etiologia das neuroses desde tempos imemoriais e por todos
os autores que trataram do assunto. Em certas áreas marginais da medicina
sempre se prometeu, simultaneamente, a cura das “queixas sexuais” e da
“fraqueza nervosa”. Uma vez que a validade da teoria deixe de ser negada,
portanto, não será difícil contestar sua originalidade.
Em
alguns artigos sucintos que apareceram nos últimos anos no Neurologisches
Zentralblatt |1894a, 1895b e 1896b), na Revue Neurologique |1895c e
1896a| e na Wiener Klinische Rundschau|1895f e 1896c| tentei dar uma
indicação do material e dos pontos de vista que oferecem apoio científico à
teoria da “etiologia sexual das neuroses”. Falta ainda, entretanto, uma
apresentação completa, principalmente porque, no esforço de lançar luz sobre o
que se reconhece como a situação atual, deparamos sempre com novos problemas
para cuja solução ainda não se realizou o trabalho preliminar necessário. Não
me parece nada prematuro, porém, tentar dirigir a atenção dos profissionais da
medicina para o que acredito serem os fatos, de modo que eles possam
convencer-se da verdade de minhas asserções e, ao mesmo tempo, dos benefícios
que podem extrair, na prática, do conhecimento delas.
Bem
sei que se farão esforços, pelo uso de argumentos com um colorido ético, para
impedir o médico de levar o assunto adiante. Quem quer que pretenda certificar-se
de que as neuroses de seus pacientes estão ou não realmente ligadas à vida
sexual deles não pode evitar interrogá-los sobre sua vida sexual e insistir em
receber um depoimento verdadeiro sobre ela. Mas nisso, afirma-se, está o perigo
para o indivíduo e para a sociedade. O médico, segundo ouço dizer, não tem o
direito de se intrometer nos segredos sexuais de seus pacientes, nem de ferir
grosseiramente seu recato (especialmente tratando-se de pacientes do sexo
feminino) com interrogatórios desse tipo. Sua mão inábil só conseguirá arruinar
a felicidade da família, ofender a inocência dos jovens e usurpar a autoridade
dos pais; e no que concerne aos adultos, ele passará a partilhar de
conhecimentos incômodos e destruirá suas próprias relações com os pacientes. A
conclusão, portanto, é que é seu dever ético manter-se afastado de toda a
questão sexual.
A
isso se pode muito bem replicar que não passa da expressão de um puritanismo
indigno de um médico e que esconde insuficientemente sua fraqueza por trás de
argumentos precários. Se os fatores procedentes da vida sexual precisam
realmente ser reconhecidos como causas de doença, então, por essa mesma razão,
a investigação e a discussão deles incluem-se automaticamente na esfera do
dever do médico. A ofensa ao pudor de que ele é culpado nesse caso não é
diferente nem pior, como se pode supor, do que sua insistência em examinar os
órgãos genitais de uma mulher a fim de curar uma afecção local - pedido em que
ele tem o compromisso de insistir por sua própria formação médica. Até hoje se
ouve com freqüência mulheres mais velhas que passaram sua juventude nas
províncias, contarem como, em curta época, ficaram reduzidas a um estado de
esgotamento por hemorragias genitais excessivas porque não conseguiam
decidir-se a permitir que um médico contemplasse sua nudez. A influência
educativa exercida no público pelo mundo da medicina, no decorrer de uma
geração, alterou de tal modo as coisas que uma objeção desse tipo é uma
ocorrência extremamente rara entre as jovens de hoje. Se viesse a ocorrer,
seria condenada como puritanismo absurdo, como recato fora de lugar. Será que
estamos vivendo na Turquia, perguntaria um marido, onde tudo o que uma mulher
doente pode mostrar ao médico é seu braços através de um buraco na parede?
Não é
verdade que o interrogatório dos pacientes e o conhecimento de suas
preocupações sexuais forneçam ao médico um grau perigoso de poder sobre eles.
Em épocas anteriores, a mesma objeção pôde ser feita ao uso de anestésicos, que
privam o paciente de sua consciência e do exercício de sua vontade, deixando a
critério do médico determinar se e quando ele os recuperará. No entanto, hoje
em dia, os anestésicos tornaram-se indispensáveis para nós, porque podem,
melhor do que qualquer outra coisa auxiliar o médico em seu trabalho; e entre
suas várias outras obrigações sérias, ele assume a responsabilidade por seu
uso.
Um
médico sempre pode causar danos, quando é inábil ou inescrupuloso, e isso não
se aplica mais nem menos à investigação da vida sexual dos pacientes do que a
outras áreas. Naturalmente, se alguém, após um auto-exame honesto, sentir que
não possui o tato, a seriedade e a discrição necessários para interrogar
pacientes neuróticos, e se estiver ciente de que as revelações de caráter
sexual lhe provocariam arrepios lascivos, em vez de interesse científico, ele
estará certo em evitar o tópico da etiologia das neuroses. Tudo o que pedimos,
além disso, é que se abstenha também de tratar pacientes nervosos.
Tampouco
é verdade que os pacientes levantam obstáculos insuperáveis à investigação de
sua vida sexual. Após uma ligeira hesitação, os adultos costumam adaptar-se à
situação, dizendo: “Afinal, estou diante do médico; posso dizer-lhe qualquer
coisa”. Inúmeras mulheres, que acham bastante difícil passar a vida escondendo
seus sentimentos sexuais, ficam aliviadas ao descobrir que, com o médico,
nenhuma consideração sobrepuja a de sua recuperação, e lhe são gratas por
permitir, ao menos uma vez na vida, que se comportem humanamente em relação às
coisas sexuais. O vago conhecimento da esmagadora importância dos fatores
sexuais na produção das neuroses (um conhecimento que estou tentando resgatar
para a ciência) parece nunca ter passado despercebido à consciência dos leigos.
Quantas vezes testemunhamos cenas como essa: um casal em que um dos membros
sofre de uma neurose procura-nos para uma consulta. Depois de tecermos inúmeros
comentários introdutórios e justificativos, no sentido de que não deve existir
nenhuma barreira entre eles e o médico, que quer ser útil em tais casos etc.,
falamo-lhes de nossa suspeita de que a causa da doença resida na forma
antinatural e prejudicial de relações sexuais que eles devem ter escolhido
desde o último parto da mulher. Dizemos que os médicos em geral não se
interessam por esses assuntos, mas que isso é repreensível neles, mesmo que os
pacientes não gostem que lhes falem sobre essas coisas etc. Nisso, um dos
cônjuges cutuca o outro e diz: “Está vendo? Eu sempre lhe disse que isso ia me
deixar doente”. Ao que o outro responde: “É, eu sei, eu também achava, mas que
se há de fazer?”
Em
algumas outras circunstâncias, quando se está lidando com mocinhas que, afinal,
são sistematicamente educadas para esconderem sua vida sexual, é preciso
contentar-se com uma dose muito pequena de sinceridade nas respostas da
paciente. Mas aqui entra uma consideração importante - a saber, que o médico
experiente nessas coisas não está despreparado ao se defrontar com seus
pacientes e, em geral, não precisa pedir-lhes informações, mas apenas uma
confirmação de suas suspeitas. Quem seguir minhas indicações de como elucidar a
morfologia das neuroses e traduzi-la em termos etiológicos necessitará, além
disso, de muito poucas revelações adicionais de seus pacientes; na própria
descrição de seus sintomas, que todos estão prontos a fornecer, eles costumam
apresentar ao médico, ao mesmo tempo, os fatores sexuais que estão ocultos.
Seria
muito vantajoso que as pessoas doentes tivessem maior conhecimento da segurança
com que o médico está agora em condições de interpretar suas queixas neuróticas
e de inferir delas a etiologia sexual atuante. Sem dúvida, isso estimularia
tais pessoas a abandonarem seu sigilo a partir do momento em que se decidissem
a buscar ajuda para seus sofrimentos. Além disso, é do interesse geral que se torne
um dever, entre homens e mulheres, um grau mais alto de franqueza sobre as
coisas sexuais do que se tem esperado deles até agora. Isso só pode
constituir-se em benefício para a moral sexual. Em matéria de sexualidade,
somos todos, no momento, doentes ou sãos, não mais do que hipócritas. Será
muito bom se obtivermos, em conseqüência dessa franqueza geral, uma certa dose
de tolerância quanto às questões sexuais.
Os
médicos costumam interessar-se muito pouco pelas questões discutidas entre os
neuropatologistas com relação às neuroses: se é justificável, por exemplo,
estabelecer uma diferenciação estrita entre histeria e neurastenia, se é
possível distinguir ao lado delas a histeroneurastenia, se as obsessões devem
ser classificadas juntamente com a neurastenia ou reconhecidas como uma neurose
distinta, e assim por diante. E a rigor, é bem possível que essas distinções
sejam irrelevantes para o profissional, desde que não haja outras conseqüências
das decisões a que se tenha chegado - nenhum aprofundamento maior da
compreensão e nenhuma indicação para um tratamento terapêutico - e desde que o
paciente seja sempre enviado a um estabelecimento hidropático e informado de
que não há nenhum problema com ele. A situação será diferente, entretanto, se
for adotado nosso ponto de vista sobre as relações causais entre a sexualidade
e as neuroses. Nesse caso, um novo interesse será despertado pela
sintomatologia dos diferentes casos neuróticos, e passará a ter importância
prática que se possa decompor corretamente o complicado quadro em seus
componentes, assim como nomeá-los com acerto. E isso porque a morfologia das
neuroses pode ser traduzida, com pouca dificuldade, em sua etiologia, e o
conhecimento desta última leva, naturalmente, a novas indicações quanto aos
métodos de cura.
Assim,
a importante decisão que precisamos tomar - e pode-se tomá-la com segurança em
todos os casos, se os sintomas forem cuidadosamente avaliados - é se o caso tem
as características da neurastenia ou de uma psiconeurose (histeria, obsessões).
(Os casos mistos, em que os sinais da neurastenia se combinam com os de uma
psiconeurose, são de ocorrência muito freqüente, mas deixaremos sua
consideração para mais tarde.) É apenas nas neurastenias que a inquirição do
paciente consegue desvendar os fatores etiológicos em sua vida sexual. Esses
fatores, é claro, são conhecidos dele e pertencem ao momento atual, ou, mais
exatamente, ao período de sua vida que se estende desde a maturidade sexual
(embora essa delimitação não cubra todos os casos). Nas psiconeuroses, esse
tipo de inquirição traz pouco resultado. Talvez nos forneça um conhecimento dos
fatores que devem ser reconhecidos como precipitantes, e que podem estar ou não
ligados à vida sexual. Quando essa ligação existe, eles mostram não diferir, quanto
a sua natureza, dos fatores etiológicos da neurastenia, isto é, falta-lhes
inteiramente qualquer relação específica com a causação da psiconeurose. Não
obstante, em todos os casos, a etiologia das psiconeuroses reside também no
campo da sexualidade. Por um singular percurso tortuoso de que falarei mais
adiante, é possível chegar a um conhecimento dessa etiologia e compreender por
que o paciente era incapaz de nos dizer qualquer coisa a esse respeito. Pois os
acontecimentos e influências que estão na raiz de toda psiconeurose pertencem,
não ao momento atual, mas a uma época da vida há muito passada,que é, por assim
dizer, pré-histórica - à época da primeira infância; e eis por que o paciente
também nada sabe deles. Ele os esqueceu - embora apenas em determinado sentido.
Assim,
em todo caso de neurose há uma etiologia sexual; mas nas neurastenia é uma
etiologia de tipo contemporâneo, enquanto nas psiconeuroses os fatores são de
natureza infantil. Esse é o primeiro grande contraste na etiologia das
neuroses. Um segundo emerge ao considerarmos uma diferença na sintomatologia da
própria neurastenia. Aqui, por um lado, encontramos casos em que se destacam
certas queixas que são características da neurastenia (pressão intracraniana,
propensão à fadiga, dispesia, constipação, irritação espinhal etc.); em outros
casos, esses sinais desempenham um papel menor e o quadro clínico se compõe de
outros sintomas, apresentando todos uma relação com o sintoma nuclear, o de
angústia (ansiedade, inquietação, expectativa angustiada, ataques de angústia
completos, rudimentares ou complementares, vertigem locomotora, agorafobia,
insônia, maior sensibilidade à dor, e assim por diante). Reservei para o
primeiro tipo o nome de neurastenia, mas distingui o segundo como “neurose de angústia”,
e forneci as razões para essa separação em outro texto, onde também levei em
conta o fato de que, em geral, as duas neuroses aparecem juntas. Para o
presente propósito, basta enfatizar que, paralelamente à diferença nos sintomas
dessas duas formas de doença, há uma diferença em sua etiologia. A neurastenia
sempre pode ser reportada a um estado do sistema nervoso como o que é adquirido
pela masturbação excessiva ou decorre espontaneamente de emissões freqüentes; a
neurose de angústia revela sistematicamente influências sexuais que têm em
comum o fator da continência ou da satisfação incompleta - como o coito
interrompido, a abstinência ao lado de uma libido viva, a chamada excitação não
consumada, e outros. Em meu breve artigo que tencionou apresentar a neurose de
angústia, propus a fórmula de que a angústia é sempre a libido que foi desviada
de seu emprego |normal|.
Quando
surge um caso em que os sintomas da neurastenia e da neurose de angústia se
combinam - ou seja, quando temos um caso misto -, basta nos atermos a nossa
proposição empiricamente obtida de que a mistura de neuroses implica a
colaboração de vários fatores etiológicos para constatarmos, em todas as
situações, a confirmação de nossa expectativa. A freqüência com que esse
fatores etiológicos se ligam entre si organicamente, por meio da interação de
processos sexuais - por exemplo, coito interrompido ou potência insuficiente no
homem, paralelamente à masturbação -, bem merece uma discussão separada.
Depois
de diagnosticar com segurança um caso de neurose neurastênica e classificar
seus sintomas corretamente, estamos em condições de traduzir a sintomatologia
em etiologia; e podemos então, confiantemente, solicitar do paciente a
confirmação de nossas suspeitas. Não nos devemos deixar enganar pelas negativas
iniciais. Se sustentarmos firmemente aquilo que inferimos, acabaremos por
quebrar qualquer resistência, enfatizando a natureza inabalável de nossas
convicções. Desse modo, aprendemos sobre a vida sexual de homens e mulheres
toda sorte de coisas, que preencheriam um volume útil e instrutivo; e
aprendemos também a lamentar, por todos os pontos de vista, que a ciência
sexual hoje em dia ainda seja desacreditada. Já que os pequenos desvios de uma vita
sexualis normal são por demais comuns para que possamos atribuir qualquer
valor a sua descoberta, concederemos peso explicativo apenas às anormalidades
sérias e prolongadas na vida sexual de um paciente neurótico. Ademais, a idéia
de que se poderia, pela insistência, fazer um paciente psiquicamente normal
acusar-se falsamente de delitos sexuais - tal idéia pode seguramente ser
descartada como um perigo imaginário.
Ao se
proceder dessa maneira com os pacientes, adquire-se também a convicção de que,
no que se refere à teoria da etiologia sexual da neurastenia, não há casos
negativos. Quando a mim, pelo menos, essa convicção tornou-se tão firme que,
nos casos em que a inquirição mostra um resultado negativo, também tiro
proveito disso para fins de diagnóstico. Em outras palavras, digo a mim mesmo
que tal caso não pode ser de neurastenia. Desse modo, fui levado, em várias
oportunidades, a presumir a presença de uma paralisia progressiva em vez de
neurastenia, por não ter conseguido comprovar o fato - necessário para minha
teoria - de que o paciente se entregava livremente à masturbação; e o curso
posterior desses casos confirmou minha posição. Em outro caso, o paciente, que
não apresentava nenhuma alteração orgânica evidente, queixava-se de pressão
intracraniana, dores de cabeça e dispepsia, mas refutava minhas suspeitas sobre
sua vida sexual de maneira franca e com uma certeza inabalável; ocorreu-me
então a possibilidade de que ele tivesse uma supuração latente numa de suas
cavidades nasais. Um colega meu, especialista nessa área, confirmou a
inferência que eu fizera a partir dos resultados sexuais negativos de minha
inquirição, retirando o pus da cavidade do paciente e aliviando-o de suas
queixas.
Entretanto,
a existência aparente de “casos negativos” também pode surgir de outra maneira.
Algumas vezes, a interrogação revela a presença de uma vida sexual normal num
paciente cuja neurose, num exame superficial, de fato se assemelha
estreitamente a uma neurastenia ou uma neurose de angústia. Mas uma
investigação mais aprofundada revela, sistematicamente, o verdadeiro estado de
coisas. Por trás desses casos, tomados como neurastenia, há uma psiconeurose -
histeria ou neurose obsessiva. A histeria, em especial, que imita tantas
afecções orgânicas, pode facilmente assumir a aparência de uma das “neuroses
atuais”, elevando os sintomas destas à categoria de sintomas histéricos. Tais
histerias, sob a forma de neurastenia, não são sequer muito raras. Todavia,
recorrer à psiconeurose, quando um caso de neurastenia apresenta um resultado
sexual negativo, não é uma saída fácil para o problema: a prova de que estamos
certos deve ser obtida pelo único método capaz de desmascarar a histeria com
certeza - o método da psicanálise, a que logo nos referiremos.
Entretanto,
talvez haja algumas pessoas dispostas a reconhecer a etiologia sexual de seus
pacientes neurastênicos, mas que, apesar disso, encaram como parcialidade o
fato de não serem solicitadas a prestar atenção também a outros fatores sempre
mencionados pelas autoridades como causas da neurastenia. Ora, nunca me
ocorreria substituir pela etiologia sexual das neuroses toda e qualquer outra
etiologia, e assim afirmar que estas não têm nenhuma força atuante. Isso seria
um equívoco. O que penso, antes, é que, além de todos os conhecidos fatores
etiológicos já reconhecidos por essas autoridades - provavelmente de forma
acertada - como conducentes à neurastenia, os fatores sexuais, que até hoje não
foram suficientemente apreciados, também devem ser levados em conta. Em minha
opinião, porém, esses fatores sexuais merecem que se lhes conceda um lugar
especial na série etiológica. Porque só eles nunca estão ausentes de todos os
casos de neurastenia, só eles são capazes de produzir a neurose sem nenhuma
ajuda adicional, de modo que os outros fatores parecem reduzir-se ao papel de
etiologia auxiliar e complementar, e só eles permitem ao médico reconhecer
relações sólidas entre sua natureza diversificada e a multiplicidade dos
quadros clínicos. Quando, por outro lado, agrupo todos os pacientes que
aparentemente se tornaram neurastênicos por excesso de trabalho, agitação
emocional, ou por um efeito posterior da febre tifóide, e assim por diante,
eles não me apresentam nada em comum nos seus sintomas. A natureza de sua
etiologia não me dá nenhuma idéia de que tipo de sintomas esperar, assim como,
inversamente, o quadro clínico por eles apresentado não me faculta inferir a
etiologia neles atuante.
As
causas sexuais são também as que mais profundamente oferecem ao médico um pouco
de apoio para sua influência terapêutica. A hereditariedade é sem dúvida um
fator importante, quando está presente; possibilita a manifestação de um forte
efeito patológico onde, de outra maneira, o resultado seria apenas um efeito
muito fraco. Mas a hereditariedade é inacessível à influência do médico; todos
nascem com suas próprias tendências hereditárias à doença e nada podemos fazer
para alterá-las. Tampouco devemos esquecer que é precisamente na etiologia das
neurastenias que devemos, necessariamente, negar o primeiro lugar à
hereditariedade.A neurastenia (em ambas as suas formas) é uma dessas afecções
que qualquer um pode facilmente adquirir sem ter nenhuma tara hereditária. Se
assim não fosse, o enorme crescimento da neurastenia de que se queixam todas as
autoridades, seria impensável. No que se refere à civilização, entre cujos
pecados as pessoas tão freqüentemente incluem a responsabilidade pela
neurastenia, é bem possível que essas autoridades estejam certas (embora o modo
como isso se dá difira bastante, provavelmente, do que elas imaginam). Mas o
estado de nossa civilização, mais uma vez, é algo inalterável pelo indivíduo.
Além disso, sendo esse um fator comum a todos os membros da mesma sociedade,
ele nunca poderá explicar a seletividade da incidência da doença. O médico que
não é neurastênico está tão exposto a essa mesma influência de uma civilização
supostamente prejudicial quanto o paciente neurastênico de que tem que tratar.
Sujeitos a essas limitações, os fatores de estafa retêm sua importância. Mas o
elemento do “excesso de trabalho”, que os médicos tanto gostam de apontar a
seus pacientes como causa de suas neuroses, é com demasiada freqüência
indevidamente usado. É bem verdade que qualquer pessoa que, devido a
perturbações sexuais, tenha-se predisposto à neurastenia, tolera mal o trabalho
intelectual e as exigências psíquicas da vida; mas ninguém se torna neurótico
apenas por efeito do trabalho ou da agitação. O trabalho intelectual é, antes,
uma proteção contra a neurastenia; são precisamente os mais incansáveis
trabalhadores intelectuais que escapam da neurastenia, e aquilo de que os
neurastênicos se queixam como “excesso de trabalho que os faz adoecerem” não
merece, em geral, ser chamado de “trabalho intelectual”, seja por sua
qualidade, seja por sua quantidade. Os médicos terão que se acostumar a explicar
aos empregados de escritório que se “esgotaram” em suas escrivaninhas, ou às
donas-de-casa para quem se tornaram pesadas demais as tarefas domésticas, que
eles adoeceram, não por terem tentado executar tarefas facilmente realizáveis
por um cérebro civilizado, mas porque, durante todo o tempo, negligenciaram e
prejudicaram flagrantemente sua vida sexual.
Além
disso, somente a etiologia sexual nos possibilita compreender todos os detalhes
da história clínica dos neurastênicos, as misteriosas melhoras em meio ao
decurso da doença e as deteriorações igualmente incompreensíveis, ambas
usualmente relacionadas por médicos e pacientes a qualquer tratamento que tenha
sido adotado. Em meus registros, que incluem mais de duzentos casos, há, por
exemplo, a história de um homem que, uma vez fracassado o tratamento prescrito
pelo médico da família, procurou o pastor Kneipp e, durante um ano após ter
sido tratado por ele, apresentou uma extraordinária melhora no meio de sua
doença. Mas quando, um ano depois, seus sintomas tornaram a piorar e ele voltou
a Woerishofen em busca de ajuda, o segundo tratamento fracassou. Uma olhadela
na crônica familiar do paciente resolveu o duplo enigma. Seis meses e meio após
seu primeiro retorno de Woerishofen, sua mulher lhe deu um filho. Isso
significa que ele a deixara no começo de uma gravidez da qual ainda não estava
informado; após seu retorno, pôde praticar o coito natural com ela. Ao
fim desse período, que teve nele um efeito curativo, sua neurose ressurgiu por
ele ter voltado a recorrer ao coito interrompido; o segundo tratamento estava
destinado ao fracasso, já que essa foi a última gravidez de sua esposa.
Houve
um caso semelhante em que, mais uma vez, o tratamento teve um efeito inesperado
que requeria uma explicação. Esse caso revelou-se ainda mais instrutivo, pois
exibia uma enigmática alternância nos sintomas da neurose. Um jovem paciente
neurótico fora enviado por seu médico a um conceituado estabelecimento
hidropático devido a uma neurastenia típica. Lá, seu estado teve, a princípio,
uma melhora constante, de modo que tudo indicava que ele receberia alta como um
grato discípulo da hidroterapia. Mas na sexta semana ocorreu uma mudança
completa: o paciente “não podia mais tolerar a água”, tornou-se cada vez mais
nervoso e, por fim, deixou o estabelecimento após mais duas semanas, não curado
e insatisfeito. Quando se queixou a mim dessa fraude terapêutica, fiz-lhe
algumas perguntas sobre os sintomas que o tinham acometido em meio ao
tratamento. Muito curiosamente, eles haviam sofrido uma mudança completa. O
paciente entrara no sanatório com pressão intracraniana, fadiga e
dispepsia; os sintomas que o perturbaram durante o tratamento tinham
sido agitação, ataques de dispnéia, vertigem ao caminhar e distúrbios do sono.
Pude então dizer-lhe “Você está cometendo uma injustiça contra a hidroterapia.
Você mesmo sabia muito bem que tinha adoecido em conseqüência da masturbação
prolongada. No sanatório, abandonou essa forma de satisfação e, por isso,
recuperou-se depressa. Ao sentir-se bem, entretanto, você procurou
imprudentemente manter relações com uma dama - uma paciente do mesmo
estabelecimento, suponhamos -, o que só podia levar à excitação sem satisfação
normal. As belas caminhadas pelas imediações do estabelecimento lhe deram ampla
oportunidade para isso. Foi esse relacionamento, e não uma repentina
impossibilidade de tolerar a hidroterapia, que o fez adoecer de novo. Além
disso, seu atual estado de saúde me leva a concluir que você está continuando a
manter esse relacionamento também aqui na cidade.” Posso garantir a meus
leitores que o paciente confirmou o que eu dissera, ponto por ponto.
O
atual tratamento da neurastenia - que talvez seja executado com mais êxito nos
estabelecimentos hidropáticos - tem como objetivo a melhora do estado nervoso
através de dois fatores: proteção e fortalecimento do paciente. Nada tenho a
dizer contra esse método de tratamento, exceto que ele não leva em conta as
circunstâncias da vida sexual do paciente. Segundo minha experiência, é
altamente desejável que os diretores médicos de tais estabelecimentos se
conscientizem adequadamente de que estão lidando, não com vítimas da
civilização ou da hereditariedade, mas - sit venia verbo - com pessoas
sexualmente aleijadas. Eles seriam então, por um lado, mais facilmente capazes
de explicar seus sucessos e seus fracassos, e, por outro, obteriam novos
sucessos, que estiveram até agora à mercê do acaso ou do comportamento
espontâneo do paciente. Se afastarmos de casa uma neurastênica que sofra de
angústia e a enviarmos a um estabelecimento hidropático, e se lá, liberada de
todas as suas obrigações, ela for levada a tomar banhos, fazer exercícios e
comer muito bem, certamente nos inclinaremos a pensar que a melhora -
freqüentemente brilhante - obtida em algumas semanas ou meses se deve ao
repouso de que ela desfrutou e aos efeitos revigorantes da hidroterapia. É
possível que seja assim, mas estamos desconsiderando o fato de que seu
afastamento de casa implica também uma interrupção das relações conjugais, e
que é apenas a eliminação temporária dessa causa patogênica que possibilita a
recuperação da paciente com o auxílio do tratamento favorável. O desprezo por
esse ponto de vista etiológico é posteriormente vingado, quando o que se
afigurava uma cura tão gratificante revela-se uma recuperação muito
transitória. Logo depois de o paciente retornar à vida do dia-a-dia, os
sintomas da enfermidade reaparecem e o obrigam a passar parte de sua existência
improdutivamente, de tempos em tempos, em estabelecimentos desse tipo, ou a dirigir
suas esperanças de recuperação para outro lugar. Portanto, está claro que, na
neurastenia, os problemas terapêuticos devem ser atacados, não em instituições
hidropáticas, mas dentro do contexto da vida do paciente.
Em
outros casos, nossa teoria etiológica pode ajudar o médico encarregado da
instituição, lançando luz sobre a fonte dos fracassos que ocorrem na própria
instituição, e pode sugerir-lhe meios de evitá-los. A masturbação é muito mais
comum entre as meninas crescidas e os homens maduros do que se costuma supor, e
tem efeito nocivo não só por produzir sintomas neurastênicos, mas também por
manter os pacientes vergados sob o peso do que eles consideram ser um segredo
vergonhoso. Os médicos não acostumados a traduzir a neurastenia em masturbação
explicam o estado patológico do paciente reportando-o a algum rótulo como
anemia, subnutrição, excesso de trabalho etc., e esperam então curá-lo
aplicando uma terapia projetada para se opor a esses estados. Para seu espanto,
contudo, os períodos de melhora se alternam no paciente com períodos em que
todos os seus sintomas pioram e são acompanhados de grave depressão. O
resultado de tal tratamento é, em geral, duvidoso. Se os médicos soubessem que
o paciente estava lutando contra seu hábito sexual, e que estava em desespero
por ter sido mais uma vez obrigado a ceder a ele, se compreendessem como
extrair dele esse segredo, torná-lo menos grave a seus olhos e apoiá-lo em sua
luta contra o hábito, o êxito de seus esforços terapêuticos bem poderia ser
assim assegurado.
Arrancar
o paciente do hábito da masturbação é apenas uma das novas tarefas terapêuticas
impostas ao médico que leva em conta a etiologia sexual dessa neurose; e parece
que precisamente essa tarefa, tal como a cura de qualquer outro vício, só pode
ser efetuada numa instituição e sob supervisão médica. Entregue a si mesmo, o
masturbador está acostumado, sempre que acontece alguma coisa que o deprime, a
retornar a sua cômoda forma de satisfação. O tratamento médico, nesse caso, não
pode ter nenhum outro objetivo senão o de reconduzir o neurastênico, que agora
recobrou suas forças, ao contato sexual normal. Pois a necessidade sexual, uma
vez despertada e satisfeita por algum tempo, não pode mais ser silenciada; só
pode ser deslocada por outro caminho. Aliás, o mesmo se aplica a todos os
tratamentos para romper com um vício. Seu sucesso será apenas aparente enquanto
o médico se contentar em privar seus pacientes da substância narcótica, sem se
importar com a fonte de que brota sua necessidade imperativa. O “hábito” é uma
simples palavra, sem nenhum valor explicativo. Nem todos os que têm
oportunidade de tomar morfina, cocaína, hidrato de cloral etc. por algum tempo
adquirem dessa forma “um vício”. A pesquisa mais minuciosa geralmente mostra
que esses narcóticos visam a servir - direta ou indiretamente - de substitutos
da falta de satisfação sexual; e sempre que a vida sexual normal não pode mais
ser restabelecida, podemos contar, com certeza, com uma recaída do paciente.
Outra
tarefa é colocada para os médicos pela etiologia da neurose de angústia.
Consiste em induzir o paciente a desistir de todas as formas prejudiciais de
prática sexual e adotar relações sexuais normais. Esse dever, como é
compreensível, recai primordialmente sobre o médico de confiança do paciente -
seu médico de família; e este infligirá ao paciente um grave dano se se
considerar respeitoso demais para interferir nesse campo.
Uma
vez que nesses casos trata-se quase sempre de questões conjugais,os esforços do
médico logo tropeçam em planos malthusianos para limitar o número de concepções
no casamento. Parece-me não haver dúvida de que essas propostas vêm ganhando
cada vez mais terreno entre a classe média. Tenho encontrado alguns casais que
já começaram a praticar métodos para impedir a concepção tão logo tiveram seu
primeiro filho, e outros cujas relações sexuais, desde a noite de núpcias,
foram praticadas de modo a atender a esse objetivo. O problema do
malthusianismo é extenso e complexo, e não tenho intenção de abordá-lo aqui da
maneira exaustiva que seria realmente necessária para o tratamento das
neuroses. Examinarei apenas qual a melhor atitude a ser tomada por um médico
que reconheça a etiologia sexual das neuroses em face desse problema.
A
pior coisa que ele pode fazer, obviamente - sob qualquer pretexto -, é tentar
ignorá-lo. Nada que seja necessário pode estar abaixo de minha dignidade como
médico; e é necessário fornecer a um casal que tencione limitar o número de
seus filhos a assistência da orientação médica, se não se quiser expor um ou
ambos os seus membros a uma neurose. Não se pode negar que, em qualquer
casamento, as medidas preventivas malthusianas se tornarão necessárias num ou
noutro momento; e, do ponto de vista teórico, seria um dos maiores triunfos da
humanidade, uma das mais tangíveis liberações das restrições da natureza a que
está sujeita a espécie humana, se pudéssemos elevar o ato responsável de
procriar filhos ao nível de uma atividade deliberada e intencional,
libertando-o de seu embaraçoso envolvimento com a satisfação necessária de uma
necessidade natural.
O
médico perspicaz tomará a si, portanto, decidir em que condições se justifica o
uso de medidas preventivas da concepção e, entre essas medidas, terá que
separar as nocivas das inofensivas. Tudo o que impede a ocorrência de
satisfação é nocivo. Mas, como se sabe, não possuímos no momento nenhum método
de impedir a concepção que preencha todos os requisitos legítimos - isto é, que
seja seguro e cômodo, que não diminua a sensação de prazer durante o coito e que
não fira a sensibilidade da mulher. Isso impõe aos médicos uma tarefa prática
para cuja solução eles poderiam concentrar suas energias com resultados
compensadores. Quem preencher essa lacuna em nossa técnica médica terá
preservado o prazer da vida e mantido a saúde de inúmeras pessoas, muito
embora, é verdade, tenha também preparado o terreno para uma drástica mudança
em nossas condições sociais.
Isso
não esgota as possibilidades decorrentes do reconhecimento da etiologia sexual
das neuroses. O principal benefício que dele extraímos para os neurastênicos
reside na esfera da profilaxia. Se a masturbação é a causa da neurastenia na
juventude e se, mais tarde, ela adquire importância etiológica também para a
neurose de angústia, devido à redução de potência que acarreta, então a
prevenção da masturbação em ambos os sexos é uma tarefa que merece mais atenção
do que tem recebido até agora. Quando refletimos sobre todos os danos, dos mais
graves aos mais insignificantes, que provêm da neurastenia - distúrbio que, segundo
dizem, está se tornando cada vez mais freqüente -, verificamos que,
positivamente, é de interesse público que os homens ingressem nas relações
sexuais com toda a sua potência. Em matéria de profilaxia, entretanto, o
indivíduo está relativamente desamparado. Toda a comunidade precisa
interessar-se pelo assunto e dar seu apoio à criação de regulamentos
genericamente aceitáveis. No momento, estamos ainda muito longe dessa situação
que prometeria alívio, e é por esse motivo que podemos justificadamente considerar
a civilização como também responsável pela difusão da neurastenia. Muitas
coisas teriam que ser mudadas. É preciso romper a resistência de toda uma
geração de médicos que já não conseguem lembrar-se de sua própria juventude; o
orgulho dos pais, que não se dispõem a descer ao nível da humanidade ante os
olhos de seus filhos, precisa ser superado; e o puritanismo insensato das mães
deve ser combatido - das mães que consideram um golpe incompreensível e
imerecido do destino que “justamente os filhos delas sejam os que se
tornam neuróticos”. Mas, acima de tudo, é necessário criar um espaço na opinião
pública para a discussão dos problemas da vida sexual. Tem que ser possível
falar sobre essas coisas sem que se seja estigmatizado como um arruaceiro ou uma
pessoa que tira proveito dos mais baixos instintos. E também aqui há trabalho
suficiente para se fazer nos próximos cem anos - nos quais nossa civilização
terá que aprender a conviver com as reivindicações de nossa sexualidade.
O
valor da elaboração de um diagnóstico correto, separando as psiconeuroses da
neurastenia, é também demonstrado pelo fato de que as psiconeuroses requerem
uma avaliação prática diferente e medidas terapêuticas especiais. Elas aparecem
em conseqüência de dois tipos de determinantes, seja independentemente, seja no
rastro das “neuroses atuais” (neurastenia e neurose de angústia). Neste último
caso, estamos tratando de um novo tipo de neurose - aliás, muito freqüente -,
uma neurose mista. A etiologia das “neuroses atuais” tornou-se uma etiologia
auxiliar das psiconeuroses. Surge um quadro clínico em que, digamos, a neurose
de angústia predomina, mas que contém também traços de neurastenia pura, de
histeria e de neurose obsessiva. Quando nos confrontamos com uma mistura desse
tipo, no entanto, não nos será conveniente desistirmos de separar os quadros
clínicos próprios de cada doença neurótica, pois, afinal, não é difícil
explicar o caso da maneira que se segue. O lugar predominantemente ocupado pela
neurose de angústia mostra que a doença surgiu sob a influência etiológica de
uma perturbação sexual “atual” |i.e., do momento presente|. Mas a pessoa em
questão estava, à parte isso, predisposta a uma ou mais psiconeuroses, devido a
uma etiologia especial e seria em algum momento acometida de uma psiconeurose,
espontaneamente ou pelo advento de algum outro fator enfraquecedor. Desse modo,
a etiologia auxiliar da psiconeurose que ainda falta é suprida pela etiologia
atual |corrente| da neurose de angústia.
Nesses
casos, a prática terapêutica passou a ser, muito acertadamente, a
desconsideração dos componentes psiconeuróticos do quadro clínico, tratando-se
exclusivamente da “neurose atual”. Em inúmeros casos é possível superar também
a |psico|neurose que aparece concomitantemente, desde que a neurastenia seja
efetivamente tratada. Mas deve-se adotar uma visão diferente nos casos de
psiconeuroses que aparecem espontaneamente ou que permanecem como uma entidade
independente depois de a doença composta de neurastenia e psiconeurose ter
percorrido seu curso. Quando falo no aparecimento “espontâneo” de uma
psiconeurose, não quero dizer que a investigação anamnésica não nos mostre
nenhum elemento etiológico. Sem dúvida, isso pode ocorrer; mas também é
possível que nossa atenção seja dirigida para algum fator irrelevante - um
estado emocional, uma debilitação devida a uma doença física, e assim por
diante. Entretanto, deve-se ter em mente, em todos esses casos, que a
verdadeira etiologia das psiconeuroses não se acha nessas causas precipitantes,
mas permanece fora do alcance do exame anamnésico comum.
Como
sabemos, foi numa tentativa de preenher essa lacuna que se pressupôs uma
predisposição neuropática especial (que aliás, se existisse, não deixaria muita
esperança de êxito ao tratamento de tais condições patológicas.) A própria
predisposição neuropática é encarada como um sinal de degeneração geral, e
assim, esse cômodo termo médico veio a ser copiosamente usado contra os pobres
pacientes a quem os médicos são inteiramente incapazes de ajudar. Felizmente, a
situação é outra. A predisposição neuropática sem dúvida existe, mas devo negar
que seja suficiente para a criação de uma psiconeurose. Devo ainda negar que a
conjunção de uma predisposição neuropática com as causas precipitantes que
ocorrem em épocas posteriores da vida constitua uma etiologia suficiente para
as psiconeuroses. Ao reportarmos as vicissitudes da enfermidade de um indivíduo
às experiências de seus ancestrais, fomos longe demais; esquecemos que, entre a
concepção e a maturidade de um indivíduo, há um longo e importante período da
vida - sua infância -, no qual se podem adquirir os germes da doença posterior.
E isso é o que efetivamente ocorre com a psiconeurose. Sua verdadeira etiologia
é encontrada nas experiências infantis, e mais uma vez - exclusivamente -, nas
impressões referentes à vida sexual. Erramos ao ignorar inteiramente a vida
sexual das crianças; segundo minha experiência, as crianças são capazes de
todas as atividades sexuais psíquicas, e também de muitas atividades somáticas.
Assim como a totalidade do aparelho sexual humano não está compreendida nos
órgãos genitais externos e nas duas glândulas reprodutoras, também a vida
sexual humana não começa apenas na puberdade, como poderia parecer a um exame
superficial. Contudo, é verdade que a organização e a evolução da espécie
humana se esforçam por evitar uma ampla atividade sexual durante a infância.
Aparentemente, no homem, as forças pulsionais sexuais destinam-se a ser
armazenadas, de modo que, com sua liberação na puberdade, possam servir a
grandes fins culturais. (W. Fliess.) Uma consideração dessa espécie possibilita
compreender por que as experiências sexuais na infância estão fadadas a ter um
efeito patogênico. Mas, no momento em que ocorrem, elas só produzem efeito em
grau muito reduzido; muito mais importante é seu efeito retardado, que
só pode ocorrer em períodos posteriores do crescimento. Esse efeito retardado
se origina - como não poderia deixar de ser - nos traços psíquicos deixados
pelas experiências sexuais infantis. Durante o intervalo entre as experiências
dessas impressões e sua reprodução (ou melhor, o reforço dos impulsos
libidinais delas provenientes), tanto o aparelho sexual somático como o
aparelho psíquico sofrem um importante desenvolvimento; e é assim que a
influência dessas experiências sexuais primitivas leva então a uma reação
psíquica anormal e à existência de estruturas psicopatológicas.
Nestas
breves indicações, não posso fazer mais do que mencionar os principais fatores
em que se baseia a teoria das psiconeuroses: a natureza adiada do efeito e o
estado infantil do aparelho sexual e do instrumento mental. Para se chegar a
uma verdadeira compreensão do mecanismo pelo qual se produzem as psiconeurose,
seria necessária uma exposição mais extensa. Acima de tudo, seria indispensável
formular como dignas de crença certas hipóteses, que me parecem novas, sobre a
composição e o funcionamento do aparelho psíquico. Num livro sobre a
interpretação dos sonhos em que estou agora trabalhando, terei oportunidade de
tocar nesses elementos fundamentais para uma psicologia das neuroses, pois os
sonhos pertencem ao mesmo conjunto de estruturas psicopatológicas que as idées
fixes histéricas, as obsessões e os delírios.
Já
que as manifestações das psiconeuroses provêm da ação retardada de traços
psíquicos inconscientes, elas são acessíveis à psicoterapia. Mas, nesse caso, a
terapia deve seguir caminhos diferentes do único até hoje seguido: o da
sugestão, com ou sem hipnose. Baseando-me no método “catártico” introduzido por
Josef Breuer, elaborei quase completamente, nos últimos anos, um processo
terapêutico que proponho descrever como “psicanalítico”. Devo a ele
grande número de êxitos, e espero poder ainda aumentar-lhe consideravelmente a
eficácia. As primeiras explicações sobre a técnica e o alcance desse método
foram fornecidas nos Estudos sobre a Histeria, escritos conjuntamente
com Breuer e publicados em 1895. Desde então, creio poder dizer que muita coisa
foi alterada para melhor. Enquanto, naquela época, declaramos modestamente que
só podíamos encarregar-nos de eliminar os sintomas da histeria, mas não de
curar a histeria em si, essa distinção parece-me hoje sem substância, de modo
que há uma perspectiva de cura genuína da histeria e das obsessões. Portanto,
foi com o mais vívido interesse que li nas publicações de colegas que, “nesse
caso, o engenhoso processo concebido por Breuer e Freud fracassou”, ou “o
método não realizou o que parecia prometer”. Isso meu deu um pouco da sensação
de um homem que lê no jornal seu próprio obituário, mas pode tranqüilizar-se
por seu melhor conhecimento dos fatos. Pois o método é tão difícil que,
definitivamente, tem que ser aprendido; e não me lembro de um só de meus
críticos que tenha expressado o desejo de aprendê-lo comigo. Nem acredito que,
como eu, eles se tenham ocupado do método com intensidade suficiente para
poderem descobri-lo sozinhos. As observações feitas nos Estudos sobre a
Histeria são totalmente insuficientes para permitir ao leitor o domínio da
técnica, nem pretendem de modo algum transmitir tal instrução completa.
A
terapia psicanalítica não é, no momento, aplicável a todos os casos. Tem, a meu
ver, as seguintes limitações. Requer um certo grau de maturidade e compreensão
nos pacientes, e portanto não é adequada para os jovens ou os adultos com
debilidade mental ou sem instrução. Fracassa também com as pessoas muito idosas
porque, devido ao acúmulo de material nelas, o tratamento tomaria tanto tempo
que, ao terminar, elas teriam chegado a um período da vida em que já não se dá
valor à saúde nervosa. Finalmente, o tratamento só é possível quando o paciente
tem um estado psíquico normal a partir do qual o material patológico pode ser
controlado. Durante um estado de confusão histérica ou uma mania ou melancolia
interpolada, nada se pode fazer por meios psicanalíticos. Tais casos, contudo,
podem ser tratados pela análise depois de se acalmarem as manifestações
violentas pelas medidas usuais. Na prática atual, os casos crônicos de
psiconeurose são muito mais acessíveis ao método do que os casos com crises
agudas, nos quais a maior ênfase é posta, naturalmente, na rapidez com que as
crises possam ser tratadas. Por essa razão, o campo de trabalho mais favorável
a essa nova terapia é proporcionado pelas fobias histéricas e pelas várias
formas de neurose obsessiva.
Que o
método se restrinja a esses limites se explica, em grande parte, pelas
circunstâncias em que tive que elaborá-lo. Meu material consiste, de fato, em
casos nervosos crônicos derivados das classes mais cultas. Acho muito provável
que seja possível conceber métodos complementares para o tratamento de crianças
e das pessoas que recebem assistência médica nos hospitais. Devo também dizer
que, até o momento, experimentei meu tratamento exclusivamente em casos graves
de histeria e de neurose obsessiva; não sei dizer como ele se sairia nos casos
brandos que, ao menos aparentemente, são curados ao cabo de alguns meses por
algum tipo de tratamento inespecífico. É fácil compreender que uma nova terapia
que exija muitos sacrifícios só pode contar com a procura de pacientes que já
tenham tentado sem sucesso os métodos geralmente aceitos, ou cujo estado
justifique a inferência de que eles nada poderiam esperar desses procedimentos
terapêuticos mais breves e supostamente mais convenientes. Assim, ocorre que
fui obrigado a enfrentar de imediato as mais duras tarefas com um instrumento
imperfeito. O teste se revelou extramamente convincente.
As
principais dificuldades que ainda restam no caminho do método terapêutico
psicanalítico não se devem a ele próprio, mas à falta de compreensão, entre
médicos e leigos, da natureza das psiconeuroses. Não passa de um corolário
necessário dessa completa ignorância que os médicos se sintam justificados para
usar as mais infundadas certezas para consolar seus pacientes ou para
induzi-los a adotarem medidas terapêuticas. “Venha para meu sanatório por seis
semanas”, dizem eles, “e você ficará livre de seus sintomas” (angústia nas
viagens, obsessões, e assim por diante). Os sanatórios são, na verdade, indispensáveis
para acalmar os ataques agudos que podem surgir no curso da psiconeurose,
distraindo a atenção do paciente, alimentando-o e cuidando dele. Mas, quanto à
eliminação dos estados crônicos, não conseguem rigorosamente nada: e os
melhores sanatórios, supostamente norteados por fundamentos científicos, não
fazem mais do que os estabelecimentos hidropáticos comuns.
Seria
mais digno, e também mais útil para o paciente - que, afinal, tem que conviver
com suas aflições - que o médico dissesse a verdade, tal como a conhece por sua
prática diária. As psiconeuroses, enquanto categoria, não são em absoluto
doenças brandas. Quando a histeria se instala, ninguém pode prever quando
terminará. A maioria de nós se consola com a vã profecia de que “um dia ela
desaparecerá repentinamente”. A recuperação, muitas vezes, mostra ser
simplesmente um acordo de tolerância mútua estabelecido entre a parte doente do
paciente e sua parte sadia, ou então resulta da transformação de um sintoma
numa fobia. A histeria de uma menina, dominada com dificuldade, revive nela
quando se torna esposa, após o breve intervalo da primeira felicidade conjugal.
A única diferença é que a outra pessoa, o marido, é agora movida por seus
próprios interesses a guardar silêncio quanto a seu estado. Mesmo quando uma
doença desse tipo não acarreta nenhuma incapacidade visível de os pacientes
levarem sua vida, ela quase sempre impede o livre desdobramento de seus poderes
mentais. As obsessões se repetem por toda a vida deles; e as fobias e outras
restrições da vontade têm sido até aqui intratáveis por qualquer tipo de
terapia. Tudo isso é ocultado do conhecimento do leigo. Por conseguinte, o pai
de uma menina histérica fica horrorizado quando, por exemplo, é solicitado a
concordar em que ela receba tratamento por um ano, quando talvez só tenha
estado doente por alguns meses. O leigo está, por assim dizer, profundamente
convencido de que todas essas psiconeuroses são desnecessárias; portanto, não
tem paciência com os processos da doença, nem nenhuma disposição de fazer
sacrifícios para seu tratamento. Se, em face de um tifo que dura três semanas,
ou de uma perna quebrada que leva seis meses para se curar, ele adota uma
atitude mais compreensiva, e se, tão logo seu filho mostra os primeiros sinais
de uma curvatura na espinha, ele acha razoável que se deva proceder a um
tratamento ortopédico por vários anos, essa diferença de comportamento se deve
aos melhores conhecimentos por parte do médico, que são por ele honestamente
transmitidos ao leigo. A honestidade por parte do médico e a aquiescência
voluntária por parte do leigo hão de ser estabelecidas também para as neuroses,
tão logo a compreensão da natureza dessas afecções se transforme num patrimônio
comum do mundo da medicina. O tratamento radical desses distúrbios requererá
sempre, sem dúvida, uma formação especial, e será incompatível com outros tipos
de atividade médica. Por outro lado, a essa classe de médicos, que acredito que
se amplie no futuro, abre-se a perspectiva de obter resultados notáveis, assim
como um discernimento satisfatório da vida mental da espécie humana.
O MECANISMO PSÍQUICO
DO ESQUECIMENTO (1898)
ZUM
PSYCHISCHEN MECHANISMUS DER VERGESSLICHKEIT
(a)EDIÇÕES ALEMÃS:
1898 Mschr.
Psychiat. Neurol., 4 (6), 436-443. (Dezembro.)
1952 G.W., 1,
519-27.
(b)TRADUÇÃO INGLESA:
“The
Psychical Mechanism of Forgetfulness”
A presente tradução,
de Alix Strachey, parece ter sido a primeira para o inglês.
O
episódio que é objeto deste artigo ocorreu durante a visita de Freud à costa do
Adriático em setembro de 1898. Enviou a Fliess uma breve narrativa dele, quando
de seu retorno a Viena, em carta datada de 22 de setembro (Freud, 1950a, Carta
96), e relatou, poucos dias depois (27 de setembro, ibid., Carta 91), ter
enviado este artigo à revista em que foi publicado logo em seguida. Esta foi a
primeira história publicada de um ato falho e Freud a transformou na base do
capítulo de abertura de seu trabalho mais longo sobre o assunto, três anos
depois (1901b); a Introdução do Editor inglês a este último (Edição Standard
Brasileira, Vol. VI, IMAGO Editora, 1976) discute toda essa questão mais
minuciosamente. O presente artigo só foi reeditado após a morte de Freud, mais
de cinqüenta anos depois de sua primeira publicação. Havia uma pressuposição
genérica, com base nas observações de Freud no início do primeiro capítulo de Sobre
a Psicopatologia da Vida Cotidiana, Ibid., ver em [1], de que este artigo
não passasse de um rascunho da versão posterior. A comparação efetiva dos dois
trabalhos mostra agora que apenas as linhas principais do tema são as mesmas,
que a argumentação está aqui disposta de modo diferente, e que o material é
ampliado em um ou dois pontos.
O
MECANISMO PSÍQUICO DO ESQUECIMENTO
O
fenômeno do esquecimento, que eu gostaria de descrever e em seguida explicar
neste artigo, já foi sem dúvida experimentado por qualquer um em si próprio ou
observado em outras pessoas. Afeta, em particular, o uso dos nomes próprios - nomina
propria - e se manifesta da seguinte maneira. Em meio a uma conversa,
vemo-nos obrigados a confessar à pessoa com quem falamos que não conseguimos
descobrir um nome que desejaríamos mencionar naquele momento, o que nos força a
pedir sua ajuda - em geral, ineficaz. “Como é mesmo o nome dele? Eu sei tão
bem! Está na ponta da língua. De repente, me escapou.” Um inequívoco sentimento
de irritação, semelhante ao que acompanha a afasia motora, junta-se então a
nossos esforços adicionais para descobrir o nome que sabemos ter estado em
nossa mente apenas um minuto antes. Nas situações características, dois traços
concomitantes merecem ser notados. Em primeiro lugar, a concentração enérgica e
deliberada da função que chamamos de atenção se revela impotente, por mais que
persista, para descobrir o nome esquecido. Em segundo lugar, em vez do nome que
estamos procurando, surge prontamente um outro nome, que reconhecemos ser
incorreto e rejeitamos, mas que insiste em retornar. Ou então, em vez do nome
substituto, encontramos em nossa memória uma única letra ou sílaba que
reconhecemos ser parte do nome que estamos buscando. Dizemos, por exemplo:
“Começa com ‘B’.” Quando finalmente conseguimos, de um modo ou de outro,
descobrir o nome buscado, verificamos que, na grande maioria dos casos, este
não começa com “B” e nem sequer contém essa letra.
A
melhor técnica para captar o nome que falta é, como se sabe, “não pensar nele”
- isto é, desviar dessa tarefa a parcela da atenção sobre a qual se exerce
controle voluntário. Passado algum tempo, o nome desaparecido “irrompe” na
mente; e o sujeito não consegue impedir-se de enunciá-lo em voz alta, para
grande espanto do interlocutor, que já se havia esquecido do episódio e que, de
qualquer forma, se interessara muito pouco pelos esforços do locutor. “Escute”,
é provável que diga, “não faz muita diferença qual é mesmo o nome do homem;
continue com sua história”. Durante o tempo todo, até que a questão seja
esclarecida, e mesmo depois do desvio intencional |de sua atenção|, a pessoa
fica preocupada a um ponto que, a rigor, não pode ser explicado pelo volume de
interesse que o caso todo possua.
Em
alguns casos em que eu próprio passei por essa experiência de esquecer nomes,
consegui, através da análise psíquica, explicar a mim mesmo a seqüência de
eventos; e agora descreverei detalhadamente o caso mais simples e nítido desse
tipo.
Durante
minhas férias de verão, fiz certa vez uma viagem de trem da encantadora cidade
de Ragusa até uma cidadezinha próxima, na Herzegovina. A conversa com meu
companheiro de viagem girou, como era natural, em torno da situação dos dois
países (Bósnia e Herzegovina) e das características de seus habitantes. Eu
falava sobre as várias peculiaridades dos turcos que lá viviam, tais como
descrevera, anos antes, um amigo e colega que vivera entre eles por muitos anos
como médico. Pouco depois, nossa conversa voltou-se para o tema da Itália e das
pinturas, e tive oportunidade de recomendar enfaticamente a meu companheiro que
algum dia visitasse. Orvieto, para lá contemplar os afrescos do fim do mundo e
do Juízo Final com que fora decorada uma das capelas da catedral por um grande
artista. Mas o nome do artista escapou-me e não consegui lembrá-lo. Exerci
minhas faculdades de recordação, fazendo desfilar pela memória todos os
detalhes do dia que passara em Orvieto, e me convenci de que nem sequer a mais
íntima parte dele fora obliterada ou se tornara vaga. Pelo contrário, eu era
capaz de evocar os quadros com maior nitidez sensorial do que me era comum. Vi
diante de meus olhos, com nitidez especial, o auto-retrato do artista - com o
rosto sério e as mãos cruzadas -, que ele pusera no canto de um dos quadros,
próximo ao retrato de seu predecessor na obra, Fra Angelico da Fiesole; mas o
nome do artista, geralmente tão familiar para mim, permanecia obstinadamente
oculto, sem que meu companheiro de viagem pudesse me ajudar. Meus esforços
contínuos não tiveram nenhum êxito, a não ser pela evocação dos nomes de dois
outros artistas, que eu sabia não serem os nomes corretos. Eram eles Botticelli
e, em segundo lugar, Boltraffio. A repetição do som “Bo” em ambos os nomes
substitutos talvez levasse um neófito a supor que esse som pertencia também ao
nome esquecido, mas tomei cuidado de passar ao largo dessa expectativa.
Como
não tivesse qualquer acesso a livros de consulta em minha viagem, tive que
suportar por vários dias esse lapso de memória e o tormento interno a ele
associado, que recorria todos os dias com intervalos freqüentes, até que
esbarrei num italiano culto que me libertou desse sofrimento ao dizer-me o
nome: Signorelli. Eu próprio pude acrescentar o primeiro nome do
artista, Luca. Imediatamente, minha lembrança ultranítida dos traços do
mestre, tal como representados em seu retrato, esmaeceu-se.
Que
influências me teriam levado a esquecer o nome Signorelli, que me era
tão familiar e que se grava tão facilmente na memória? E que caminhos teriam
levado a sua substituição por Botticelli e Boltraffio? Uma breve
excursão de volta às circunstâncias em que ocorrera o esquecimento bastou para
lançar luz sobre ambas as questões.
Pouco
antes de chegar ao assunto dos afrescos na catedral do Orvieto, eu estivera
contando a meu companheiro de viagem algo que ouvira de meu colega, anos antes,
sobre os turcos da Bósnia. Estes tratam os médicos com respeito especial e
exibem, em marcante contraste com nosso próprio povo, uma atitude de resignação
ante os desígnios do destino. Se um médico tem que informar a um pai de família
que um de seus parentes está à morte, a resposta é: “Herr |Senhor|, que
se há de fazer? Se houvesse uma maneira de salvá-lo, sei que o senhor o
ajudaria.” Outra lembrança próxima disso estava em minha memória. Esse mesmo
colega me falara da suprema importância que esses bosnianos atribuem aos
prazeres sexuais. Certa vez, um de seus pacientes lhe disse: “Sabe, Herr,
se isso acabar, a vida não vale mais nada.” Naquela ocasião, pareceu ao
médico e a mim que se podia presumir que os dois traços de caráter do povo
bosniano assim ilustrados estivessem estreitamente ligados. Mas, ao relembrar
essas histórias em minha viagem para Herzegovina, suprimi a segunda, em que se
abordava o tema da sexualidade.Foi logo depois disso que o nome Signorelli
me escapou e os nomes Botticelli e Boltraffio apareceram como
substitutos.
A
influência que tornara o nome Signorelli inacessível à memória, ou, como
costumo dizer, aquilo que o “recalcara”, só podia proceder da história que eu
havia suprimido sobre o valor atribuído à morte e ao gozo sexual. Se assim
fosse, deveríamos poder descobrir as idéias intermediárias que serviram para
ligar os dois temas. A afinidade entre o conteúdo deles - de um lado, o
Juízo Final, o “Dia do Juízo”, e de outro, a morte e a sexualidade - parece
muito superficial; e já que se tratava do recalcamento da lembrança de um nome,
era provável, a julgar pelas aparências, que a conexão estivesse entre um e
outro nome. Ora, “Signor” significa “Herr |Senhor|”, e “Herr”
está também presente no nome “Herzegovina”. Além disso, decerto não era
irrelevante que ambos os comentários dos pacientes por mim recordados
contivessem um “Herr” como forma de dirigir-se ao médico. A tradução de
“Signor” por “Herr” fora, portanto, o meio pelo qual a história
que eu havia suprimido arrastara consigo para o recalcamento o nome que eu
estava procurando. Todo o processo fora claramente facilitado pelo fato de que,
nos últimos dias passados em Ragusa, eu falara italiano continuamente - isto é,
acostumara-me a traduzir mentalmente do alemão para o italiano.
Quando
tentei recuperar o nome do artista, resgatando-o do recalcamento, a influência
do laço em que o nome se enredara no intervalo fez-se inevitavelmente sentir.
De fato, descobri o nome de um artista, mas não o correto. Era um nome
deslocado, e a orientação do deslocamento fora dada pelos nomes contidos no
tema recalcado. “Boticelli”; contém as mesmas sílabas finais que “Signorelli;
portanto, as sílabas finais - que, diversamente da primeira parte da palavra, “Signor”,
não podiam estabelecer uma ligação direta com o nome “Herzegovina” - tinham
retornado; mas a influência do nome “Bósnia”, regularmente associado com o nome
“Herzegovina”, evidenciara-se ao dirigir a substituição para dois nomes de
artistas que começavam com a mesma sílaba, “Bo”: “Botticelli” e, depois,
“Boltraffio”.Verifica-se, pois, que a descoberta do nome “Signorelli” sofrera a
interferência do tema que estava por trás dele, no qual apareciam os nomes
“Bósnia” e “Herzegovina”.
Para
que esse tema pudesse produzir tais efeitos, não seria bastante que eu o
tivesse suprimido uma vez na conversa - coisa que se deu por motivos casuais.
Devemos, antes, presumir que o próprio tema estivesse também intimamente ligado
a fluxos de representações em mim presentes em estado de recalque - isto é,
fluxos de representações que, a despeito da intensidade do interesse nelas
depositado, deparassem com uma resistência que os impedisse de serem elaborados
por uma dada instância psíquica, e portanto, de se tornarem conscientes. Que
isso realmente se aplicou, na época, ao tema “morte e sexualidade”, é algo de
que tenho muitas provas que não preciso abordar aqui, extraídas de minha
própria auto-observação. Mas posso chamar atenção para uma conseqüência dessas
representações recalcadas. A experiência ensinou-me a insistir em que todo
produto psíquico é elucidável e até mesmo sobredeterminado. Conseqüentemente,
pareceu-me que o segundo nome substituto, “Boltraffio”, exigia outra
determinação, pois, até ali, apenas suas letras iniciais tinham sido
explicadas, por sua assonância com “Bósnia”. Recordei-me então de que essas
representações recalcadas nunca me haviam absorvido mais do que algumas semanas
antes, depois de ter recebido uma certa notícia. O lugar onde a notícia me
chegou chamava-se “Trafoi”, e esse nome é por demais semelhante à segunda
metade do nome “Boltraffio” para não ter tido um efeito determinante em minha
escolha deste último. No pequeno diagrama esquemático que se segue |Fig. 1|,
tentei reproduzir as relações agora trazidas à luz.
Fig.
1
Talvez
não deixe de haver um interesse intrínseco em se poder perscrutar a história de
um evento psíquico desse tipo, que está entre os mais triviais distúrbios que
podem afetar o controle do aparelho psíquico, e que é compatível com um estado
de saúde psíquica sem outras perturbações. Mas o exemplo aqui elucidado ganha
um enorme interesse adicional ao sabermos que ele pode servir como nada menos do
que um modelo dos processos patológicos a que devem sua origem os sintomas
psíquicos das psiconeuroses - histeria, obsessões e paranóia. Em ambos os
casos, encontramos os mesmos elementos e a mesma interação de forças entre
esses elementos. Do mesmo modo que aqui e por meio de associações superficiais
similares, um fluxo de representações recalcado se apodera, na neurose, de uma
ingênua impressão recente e a faz imergir com ele no recalque. O mesmo
mecanismo que faz os nomes substitutos “Botticelli” e “Boltraffio” emergirem de
“Signorelli” (uma substituição por meio de representações intermediárias ou
conciliatórias) rege também a formação das representações obsessivas e das
paramnésias paranóicas. Além disso, vimos que esses casos de esquecimento têm a
característica de liberar um desprazer contínuo até o momento em que o problema
é resolvido - uma característica que seria ininteligível a não ser por isso, e
algo que |no exemplo que mencionei| foi de fato ininteligível para a pessoa com
quem eu estava falando |ver em [1]|; mas há uma completa analogia com isso no
modo pelo qual os conjuntos de representações recalcadas ligam sua capacidade
de gerar afeto a algum sintoma cujo conteúdo psíquico parece, em nosso
julgamento, inteiramente inadequado a tal liberação de afeto. Finalmente, a
dissolução de toda a tensão pela comunicação do nome correto por uma fonte
externa é, em si mesma, um bom exemplo da eficácia da terapia psicanalítica,
que visa a corrigir os recalques e deslocamentos e que elimina os sintomas pela
reinstalação do verdadeiro objeto psíquico.
Portanto,
entre os vários fatores que contribuem para o fracasso de uma recordação ou
para uma perda de memória, não se deve menosprezar o papel desempenhado pelo
recalcamento, e isso pode ser demonstrado não só nos neuróticos, mas também (de
modo qualitativamente idêntico) nas pessoas normais. Pode-se afirmar, muito
genericamente, que a facilidade (e em última instância, também a fidelidade)
com que dada impressão é despertada na memória depende não só da constituição
psíquica do indivíduo, da força da impressão quando recente, do interesse
voltado para ela nessa ocasião, da constelação psíquica no momento atual, do
interesse agora voltado para sua emergência, das ligações para as quais
a impressão foi arrastada etc. - não só de coisas como essas, mas também da
atitude favorável ou desfavorável de um dado fator psíquico que se recusa a
reproduzir qualquer coisa que possa liberar desprazer, ou que possa
subseqüentemente levar à liberação de desprazer. Assim, a função da memória,
que gostamos de encarar como um arquivo aberto a qualquer um que sinta
curiosidade, fica desse modo sujeita a restrições por uma tendência da vontade,
exatamente como qualquer parte de nossa atividade dirigida para o mundo
externo. Metade do segredo da amnésia histérica é desvendado ao dizermos que as
pessoas histéricas não sabem o que não querem saber; e o tratamento
psicanalítico, que se esforça por preencher tais lacunas da memória no decorrer
de seu trabalho, leva-nos à descoberta de que a tarefa de resgatar essas
lembranças perdidas enfrenta certa resistência, que tem de ser contrabalançada
por um trabalho proporcional a sua magnitude. No caso de processos psíquicos
que são basicamente normais, não se pode, naturalmente, alegar que a influência
desse fator tendencioso na revivescência das lembranças de algum modo supere,
regularmente, todos os outros fatores que devem ser levados em conta.
Como
respeito à natureza tendenciosa de nosso recordar e esquecer, vivi, não faz
muito tempo, um exemplo instrutivo - instrutivo pelo que traiu -, do qual
gostaria de acrescentar um relato. Eu tencionava fazer uma visita de vinte e
quatro horas a um amigo que, lamentavelmente, mora muito longe, e estava
repleto de coisas para lhe contar. Antes disso, porém, senti-me na obrigação de
visitar uma família conhecida em Viena, da qual um dos membros se mudara para a
cidade em questão, de modo a levar comigo seus cumprimentos e recados para o
parente ausente. Eles me disseram o nome da pension onde ele morava,
assim como o nome da rua e o número da casa, e, em vista de minha memória
precária, escreveram o endereço num cartão, que coloquei em minha carteira. No
dia seguinte, ao chegar à casa de meu amigo, anunciei: “Só tenho um dever a
cumprir que pode atrapalhar minha estada com você; é uma visita, e será a
primeira coisa que vou fazer. O endereço está em minha carteira”. Para meu
espanto, contudo, não o achei lá. Assim, no final das contas, eu tinha que
recorrer a minha memória. Minha memória para nomes não é particularmente boa,
mas é incomparavelmente melhor do que para números e algarismos. Posso fazer
visitas médicas a uma casa por um ano inteiro e, ainda assim, se tiver que ser
levado até lá por um cocheiro, terei dificuldade em recordar o número da casa. Nesse
caso, porém, eu o gravara especialmente; ele estava ultranítido, como que para
zombar de mim - pois nenhum traço do nome da pension ou da rua ficara em
minha lembrança. Eu havia esquecido todos os dados do endereço que poderiam
servir como ponto de partida para descobrir a pension; e, contrariando
muito meu hábito, retivera o número da casa, que era inútil para esse fim. Por
conseguinte, não pude fazer a visita. Consolei-me com notável rapidez e
dediquei-me inteiramente a meu amigo. Ao retornar a Viena e me postar diante da
minha escrivaninha, eu soube, sem um momento de hesitação, o lugar em que, em
minha “distração”, eu pusera o cartão com o endereço. O fator atuante em minha
ocultação inconsciente da coisa fora a mesma intenção que atuara em meu ato
curiosamente modificado de esquecimento.
LEMBRANÇAS
ENCOBRIDORAS (1899)
NOTA
DO EDITOR INGLÊS
ÜBER DECKERINNERUNGEN
(a) EDIÇÕES ALEMÃS:
1899 Mschr.
Psychiat. Neurol., 6 (3), 215-30. (Setembro.)
1925 G.S., 1,
465-88.
1952 G.W., 1,
531-54.
(b)TRADUÇÃO INGLESA:
“Screen
Memories”
1950 C.P.,
5, 47-69 (Trad. de James Strachey.)
A presente tradução é
uma reedição ligeiramente revista da que foi publicada em 1950.
Uma
carta inédita de Freud a Fliess, de 25 de maio de 1899, narra que, naquela
data, este artigo fora enviado ao editor do periódico em que apareceria mais
tarde, naquele mesmo ano. Freud acrescenta que ficara imensamente satisfeito
durante sua produção, fato que considerava um mau presságio para seu futuro
destino.
O
conceito de “lembranças encobridoras” foi aqui introduzido por Freud pela
primeira vez. Sem dúvida fora trazido à baila por seu exame do caso específico
que ocupa a maior parte do artigo, caso esse a que ele aludira numa carta a
Fliess de 3 de janeiro de 1899 (Carta 101). Entretanto, esse tema estava
intimamente relacionado com vários outros que já vinham ocupando sua mente por
muitos meses - de fato, desde que ele se envolvera em sua auto-análise, no
verão de 1897 -, problemas referentes ao funcionamento da memória e suas
distorções, à importância e raison d’être das fantasias, à amnésia que
cobre nossos primeiros anos de vida e, por trás de tudo isso, à sexualidade
infantil. Os leitores das cartas a Fliess encontrarão muitas abordagens da
presente discussão. Ver, por exemplo, os comentários sobre as fantasias no
Rascunho M, de 25 de maio de 1897, e na Carta 66, de 7 de julho de 1897. As
lembranças encobridoras analisadas por Freud ao final do Capítulo IV da edição
de 1907 de Sobre a Psicopatologia da Vida Cotidiana (1901b) remontam a esse
mesmo verão de 1897.
É
curioso que o tipo de lembrança encobridora predominantemente examinado neste
artigo - o tipo em que uma lembrança anterior é usada como uma tela para
encobrir um evento posterior - quase desaparece da literatura subseqüente. O que
passou desde então a ser considerado como o tipo usual - aquele em que um
acontecimento anterior é encoberto por uma lembrança posterior - mal chega a
ser mencionado aqui, embora passasse a ser o tipo abordado por Freud, de
maneira quase exclusiva, apenas dois anos depois, no capítulo de Sobre a
Psicopatologia da Vida Cotidiana acima mencionado. (Ver também nota de
rodapé, ver em [1].)
O
interesse intrínseco deste artigo foi imerecidamente obscurecido por um fato
externo a ele. Não era difícil adivinhar que o incidente nele descrito era
realmente autobiográfico, o que se converteu numa certeza após o aparecimento
da correspondência com Fliess. Muitos dos detalhes, entretanto, podem ser
encontrados nos escritos publicados de Freud. Assim, as crianças da lembrança
encobridora eram, de fato, seu sobrinho John e sua sobrinha Pauline, que
aparecem em vários pontos de A Interpretação dos Sonhos (1900a). (Cf.,
por exemplo, Edição Standard Brasileira, Vol. V, ver em [1], [2], [3],
[4] [5], IMAGO Editora, 1972.) Eram filhos de seu meio-irmão mais velho,
mencionado no Capítulo X de Sobre a Psicopatologia da Vida Cotidiana
(1901b), ibid., Vol. VI, ver em [1], IMAGO Editora, 1976. Esse irmão, depois da
dispersão da família em Freiberg, quando Freud tinha três anos, estabeleceu-se
em Manchester, onde Freud o visitou aos dezenove anos de idade - e não aos
vinte, como implicado aqui (ver em [1]) -, visita essa a que é feita uma alusão
na mesma passagem de Sobre a Psicopatologia da Vida Cotidiana, e também
em A Interpretação dos Sonhos (ibid., Vol. V, ver em [1], IMAGO Editora,
1972). Sua idade na ocasião da primeira volta a Freiberg era também um ano
menos do que a aqui indicada. Ele estava com dezesseis anos, como nos diz na
“Carta ao Burgomestre de Príbor” (1931e), ibid., Vol. XXI, ver em [1], IMAGO
Editora, 1974. Ficamos sabendo, também por essa fonte, que a família com que se
hospedou chamava-se Fluss, e uma das filhas dessa família, Gisela, é a figura
central da presente história. O episódio é integralmente descrito no primeiro
volume da biografia de Ernest Jones (1953, 27-9 e 35-7).
LEMBRANÇAS
ENCOBRIDORAS
No
curso de meu tratamento psicanalítico de casos de histeria, neurose obsessiva
etc., tenho freqüentemente lidado com recordações fragmentárias dos primeiros
anos da infância, que permaneceram na memória dos pacientes. Como mostrei em
outros textos, deve-se atribuir grande importância patogênica às impressões
dessa época da vida. Mas o tema das lembranças da infância está, de qualquer
modo, destinado a ser de interesse psicológico, pois elas põem em notável
relevo uma diferença fundamental entre o funcionamento psíquico das crianças e
dos adultos. Ninguém contesta o fato de que as experiências dos primeiros anos
de nossa infância deixam traços inerradicáveis nas profundezas de nossa mente.
Entretanto, ao procurarmos averiguar em nossa memória quais as
impressões que se destinaram a influenciar-nos até o fim da vida, o resultado
é, ou absolutamente nada, ou um número relativamente pequeno de recordações
isoladas, que são freqüentemente de importância duvidosa ou enigmática. É
somente a partir do sexto ou sétimo ano - em muitos casos, só depois dos dez
anos - que nossa vida pode ser reproduzida na memória como uma cadeia
concatenada de eventos. Daí em diante, porém, há também uma relação direta
entre a importância psíquica da experiência e sua retenção na memória. O que
quer que pareça importante por seus efeitos imediatos ou diretamente
subseqüentes é recordado; o que quer que seja julgado não essencial é
esquecido. Quando consigo relembrar um acontecimento por muito tempo após sua
ocorrência, encaro o fato de tê-lo retido na memória como uma prova de que ele
causou em mim, na época, uma profunda impressão. Surpreendo-me ao esquecer uma
coisa importante, e talvez me sinta ainda mais surpreso ao recordar alguma
coisa aparentemente irrelevante.
É
apenas em certos estados mentais patológicos que torna a deixar de aplicar a
relação mantida, nos adultos normais, entre a importância psíquica de um evento
e sua retenção na memória. Por exemplo, o histérico habitualmente mostra uma
amnésia em relação a algumas ou todas as experiências que levaram à instalação
de sua doença, as quais, por isso mesmo, tornaram-se importantes para ele, e
que, independentemente disso, podem ter sido importantes por si mesmas. A
analogia entre esse tipo de amnésia patológica e a amnésia normal que afeta
nossos primeiros anos de vida parece-me fornecer um valioso indício da íntima
ligação que existe entre o conteúdo psíquico das neuroses e nossa vida infantil.
Estamos
tão acostumados a essa falta de lembrança das impressões infantis que tendemos
a desconsiderar o problema subjacente a ela, e nos inclinamos a explicá-lo como
uma conseqüência óbvia do caráter rudimentar das atividades mentais das
crianças. Na verdade, porém, uma criança normalmente desenvolvida de três ou
quatro anos já exibe uma ampla margem de funcionamento mental altamente
organizado, tanto em suas comparações e inferências quanto na expressão de seus
sentimentos; e não há nenhuma razão evidente pela qual a amnésia deva incidir
sobre esses atos psíquicos, que não são menos importantes do que os de idade
posterior.
Antes
de abordarmos problemas psicológicos ligados às mais antigas lembranças da
infância, seria essencial, é claro, fazer uma coleta de material, enviando
circulares a um número bastante grande de adultos e descobrindo que espécie de
recordações eles são capazes de fornecer desses primeiros anos. Um primeiro
passo nessa direção foi dado em 1895 por V. e C. Henri, que circularam um
formulário de perguntas por eles preparado. Os resultados altamente sugestivos
desse questionário, que colheu respostas de cento e vinte e três pessoas, foram
publicados pelos dois autores em 1897. Não tenho intenção de discutir, no
momento, o assunto como um todo, e assim me contentarei em enfatizar os poucos
pontos que me permitirão introduzir a idéia do que denominei de “lembranças
encobridoras”.
A
idade a que o conteúdo dessas primeiras lembranças da infância costuma remontar
é o período entre dois e quatro anos. (Esse é o caso de oitenta e oito pessoas
na série observada pelos Henris.) Há alguns indivíduos, entretanto, cujas
lembranças recuam ainda mais - até mesmo ao período antes de completarem seu
primeiro aniversário; por outro lado, há aqueles cujas recordações mais antigas
remontam apenas aos seis, sete ou mesmo oito anos. Não há nada, por ora, que
mostre o que mais está relacionado com essas diferenças individuais; mas convém
notar, dizem os Henris, que uma pessoa cuja primeira recordação remonta a uma
idade muito tenra - ao primeiro ano de vida, talvez - terá também a seu dispor
outras lembranças isoladas dos anos seguintes, e poderá reproduzir suas
experiências como uma cadeia contínua a partir de um ponto mais recuado no
tempo - por exemplo, a partir dos cinco anos - do que é possível para outras
pessoas, cuja primeira lembrança data de época posterior. Assim, em casos
particulares, não apenas a data do aparecimento da primeira recordação, mas
também toda a função da memória, pode ser avançada ou retardada.
Um
interesse muito especial prende-se à questão do conteúdo usual dessas
primeiras lembranças da infância. A psicologia dos adultos nos levaria
necessariamente a esperar que fossem selecionadas como dignas de recordação as
experiências que tivessem despertado alguma emoção poderosa ou que, em virtude
de suas conseqüências, tivessem sido reconhecidas como importantes logo após
sua ocorrência. E, de fato, algumas das observações coligidas pelos Henris
parecem atender a essa expectativa. Eles relatam que o conteúdo mais freqüente
das primeiras lembranças da infância constitui-se, de um lado, das situações de
medo, vergonha, dor física etc. e, de outro, de acontecimentos importantes como
doenças, mortes, incêndios, nascimentos de irmãos e irmãs etc. Poderíamos,
portanto, inclinar-nos a presumir que o princípio que rege a escolha das
lembranças é o mesmo, tanto no caso de crianças quanto de adultos. É
compreensível - embora esse fato mereça ser explicitamente mencionado - que as
lembranças retidas da infância evidenciem, necessariamente, a diferença entre o
que desperta o interesse da criança e o do adulto. Isso explica facilmente por
que, por exemplo, uma mulher relata lembrar-se de diversos acidentes ocorridos
com suas bonecas quando ela contava dois anos de idade, mas não tem nenhuma
recordação dos eventos sérios e trágicos que possa ter observado na mesma
época.
Agora,
entretanto, estamos diante de um fato diametralmente oposto a nossas
expectativas e que fatalmente nos assombra. Somos informados de que há algumas
pessoas cujas recordações mais remotas da infância relacionam-se com eventos
cotidianos e irrelevantes, que não poderiam produzir qualquer efeito emocional
nem mesmo em crianças, mas que são recordados (com demasiada nitidez,
fica-se inclinado a dizer) em todos os detalhes, enquanto outros acontecimentos
aproximadamente contemporâneos não foram retidos em sua memória, mesmo que,
segundo o testemunho de seus pais, tenham-nos comovido intensamente na ocasião.
Assim, os Henris mencionam um professor de filologia cuja lembrança mais
antiga, situada entre os três e quatro anos, mostrava-lhe uma mesa posta para
uma refeição e, sobre ela, uma bacia com gelo. Na mesma época, ocorreu a morte
de sua avó, o que, de acordo com seus pais, foi um rude golpe para o garoto.
Mas o atual professor de filologia não tem nenhuma recordação dessa perda; tudo
de que se lembra daqueles dias é a bacia de gelo. Outro homem relata que sua
lembrança mais antiga é um episódio durante um passeio a pé, no qual ele quebrou
um galho de árvore. Ele acredita que ainda é capaz de identificar o local onde
isso ocorreu. Havia várias outras pessoas presentes, e uma delas o ajudou.
Os
Henris descrevem tais casos como sendo raros. Segundo minha experiência, que em
sua maior parte, é verdade, baseia-se em neuróticos, eles são bastante
freqüentes. Um dos sujeitos da investigação dos Henris fez uma tentativa de
explicar a ocorrência dessas imagens mnêmicas cuja inocência as torna tão
misteriosas, e sua explicação me parece extremamente pertinente. Ele acha que,
nesses casos, a cena relevante pode ter sido retida na memória apenas incompletamente,
e essa talvez seja a razão de parecer tão pouco esclarecedora: as partes
esquecidas continham, provavelmente, tudo o que era digno de nota na experiência.
Posso confirmar a veracidade dessa concepção, embora prefira dizer que esses
elementos da experiência foram omitidos, em vez de esquecidos. Tenho
conseguido com freqüência, por meio do tratamento psicanalítico, descobrir as
partes que faltam numa experiência infantil, provando assim que a impressão da
qual não se reteve mais do que um fragmento na memória, uma vez restaurada em
sua íntegra, mostra efetivamente confirmar o pressuposto de que as coisas mais
importantes é que são recordadas. Isso, entretanto, não fornece nenhuma
explicação para a notável escolha feita pela memória entre os elementos da
experiência. Devemos primeiro indagar por que se suprime precisamente o que é
importante, retendo-se o irrelevante; e não encontraremos uma explicação para
isso enquanto não tivermos investigado mais a fundo o mecanismo desses
processos. Verificaremos então que há duas forças psíquicas envolvidas na
promoção desse tipo de lembranças. Uma dessas forças encara a importância da
experiência como um motivo para procurar lembrá-la, enquanto a outra - uma
resistência - tenta impedir que se manifeste qualquer preferência dessa ordem.
Essas duas forças opostas não se anulam mutuamente, nem qualquer delas
predomina (com ou sem perda para si própria) sobre a outra. Em vez disso,
efetua-se uma conciliação, numa analogia aproximada com a resultante de um
paralelogramo de forças. E a conciliação é a seguinte: o que é registrado como
imagem mnêmica não é a experiência relevante em si - nesse aspecto, prevalece a
resistência; o que se registra é um outro elemento psíquico intimamente
associado ao elemento passível de objeção - e, nesse aspecto, o primeiro
princípio mostra sua força: o princípio que se esforça por fixar as impressões
importantes, estabelecendo imagens mnêmicas reprodutíveis. O resultado do
conflito, portanto, é que, em vez da imagem mnêmica que seria justificada pelo
evento original, produz-se uma outra, que foi até certo ponto associativamente deslocada
da primeira. E já que os elementos da experiência que suscitaram objeção foram
precisamente os elementos importantes, a lembrança substituta perde
necessariamente esses elementos importantes e, por conseguinte, é muito
provável que se nos afigure trivial.Ela nos parece incompreensível porque nos
inclinamos a buscar a razão de sua retenção em seu próprio conteúdo, ao passo
que essa retenção se deve, de fato, à relação que existe entre seu conteúdo e
um conteúdo diferente, que foi suprimido. Há entre nós um dito corrente sobre
as falsificações, no sentido de que, em si mesmas, elas não são feitas de ouro,
mas estiveram perto de algo realmente feito de ouro. É bem possível
aplicar essa mesma comparação a algumas das experiências infantis retidas na
memória.
Há
numerosos tipos possíveis de casos em que um conteúdo psíquico aparece em lugar
de outro, e estes se manifestam numa multiplicidade de constelações
psicológicas. Um dos casos mais simples é obviamente o que ocorre nas
lembranças infantis que nos interessam aqui - isto é, o caso em que os
elementos essenciais de uma experiência são representados na memória pelos
elementos não essenciais da mesma experiência. Trata-se de um caso de
deslocamento para alguma coisa associada por continuidade; ou, examinando-se o
processo como um todo, de um caso de recalcamento acompanhado de substituição
por algo próximo (seja no espaço ou no tempo). Em outra oportunidade tive
ocasião de descrever um exemplo muito semelhante de substituição ocorrida na
análise de uma paciente que sofria de paranóia. A mulher em questão tinha alucinações
com vozes que lhe repetiam longas passagens do romance Die Heiterethei,
de Otto Ludwig. Mas as passagens escolhidas pelas vozes eram as mais
insignificantes e irrelevantes do livro. A análise mostrou, contudo, que havia
outras passagens na mesma obra que tinham suscitado na paciente os mais
aflitivos pensamentos. O afeto aflitivo motivara a construção de uma defesa
contra essas idéias, mas os motivos para levá-las adiante recusaram-se a ser
suprimidos. O resultado foi uma conciliação, pela qual as passagens inocentes
emergiam na memória da paciente com força e nitidez patológicas. O processo que
aqui vemos em ação - conflito, recalcamento e substituição envolvendo uma
conciliação - retorna em todos os sintomas psiconeuróticos e nos fornece a
chave para compreendermos sua formação. Portanto, não deixa de ter importância
que possamos mostrar o mesmo processo em ação na vida mental de indivíduos
normais. O fato de esse processo influenciar, nas pessoas normais, precisamente
a escolha de suas lembranças infantis parece proporcionar mais um indício das
íntimas relações em que vimos insistindo entre a vida mental das crianças e o
material psíquico das neuroses.
Os
processos da defesa normal e patológica e os deslocamentos em que resultam são
claramente de grande importância. Mas, ao que eu saiba até hoje os psicólogos
não fizeram nenhum estudo sobre eles, e resta ainda definir em que camadas da
atividade psíquica e em que condições eles entram em ação. É bem possível que a
razão dessa negligência esteja no fato de que nossa vida mental, na medida em
que é objeto de nossa percepção interna consciente, nada nos mostra
desses processos, salvo pelos casos que classificamos de “raciocínio falho” e
por algumas operações mentais que visam produzir um efeito cômico. A asserção
de que é possível deslocar uma intensidade psíquica de uma representação (que é
então abandonada) para outra (que daí por diante desempenha o papel psicológico
da primeira) é tão desnorteante para nós quanto certas características da
mitologia grega - por exemplo, quando se diz que os deuses vestem alguém de
beleza como se esta fosse um véu, enquanto nós pensamos apenas num rosto
transfigurado por uma mudança de expressão.
As
investigações adicionais dessas lembranças infantis irrelevantes ensinaram-me
que elas podem também originar-se de outras maneiras, e que uma insuspeitada
riqueza de significados se oculta por trás de sua aparente inocência. Quanto a
esse aspecto, porém, não me contentarei com uma simples asserção, mas
fornecerei um relato pormenorizado de um caso particular que me parece o mais
instrutivo dentre um número considerável de casos similares. Seu valor é
seguramente aumentado pelo fato de relacionar-se com alguém que de modo algum é
neurótico, ou que só o é muito levemente.
O
sujeito dessa observação é um homem de instrução universitária, com trinta e
oito anos de idade. Embora sua profissão se situe em campo muito diferente, ele
passou a se interessar por questões psicológicas desde a ocasião em que
consegui livrá-lo de uma leve fobia por meio da psicanálise. No ano passado,
ele me chamou atenção para suas lembranças infantis, que já tinham desempenhado
certo papel em sua análise. Após estudar a pesquisa efetuada por V. e C. Henri,
ele me forneceu o seguinte relato sumarizado de sua própria experiência.
“Disponho
de um bom número de antigas lembranças da infância, que posso datar com grande
certeza, pois, por volta dos três anos de idade, deixei o lugarejo onde nascera
e me mudei para uma grande cidade; e todas essas minhas lembranças
relacionam-se com meu lugar de nascimento e correspondem, portanto, ao segundo
e terceiro anos de minha vida. Em sua maioria, são cenas curtas, mas muito bem
conservadas e providas de todos os detalhes da percepção sensorial, em completo
contraste com minhas lembranças dos anos adultos, às quais falta inteiramente o
elemento visual. Dos três anos em diante, minhas recordações tornam-se mais
escassas e menos claras; há lacunas nelas que devem cobrir mais de um ano; e
creio que é só depois dos seis ou sete anos que o fluxo de minhas lembranças
torna-se contínuo. As lembranças anteriores à época em que deixei minha
primeira residência dividem-se em três grupos. O primeiro grupo consiste em
cenas que meus pais me descreveram repetidamente desde então. Quanto a estas,
não sei ao certo se já tinha sua imagem mnêmica desde o início, ou se só a
reconstruí depois de ouvir uma dessas descrições. Posso assinalar, entretanto,
que há também acontecimentos dos quais não tenho nenhuma imagem mnêmica, apesar
de terem sido freqüentemente relatados com minúcias por meus pais. Atribuo mais
importância ao segundo grupo. Este compreende cenas que não me foram descritas
(pelo menos ao que eu saiba), algumas das quais, na verdade, não poderiam
ter-me sido descritas, já que não voltei a encontrar os outros participantes
delas (minha babá e meus companheiros de brincadeiras) desde sua ocorrência.
Logo chegarei ao terceiro grupo. No que se refere ao conteúdo dessas cenas e à
conseqüente razão de serem lembradas, gostaria de dizer que não estou
inteiramente perdido. A rigor, não posso sustentar que as lembranças que retive
sejam lembranças dos acontecimentos mais importantes desse período, ou dos que
eu hoje reputaria como os mais importantes. Não tomei conhecimento do
nascimento de uma irmã dois anos e meio mais nova que eu, e minha partida,
minha primeira visão da estrada de ferro e a longa viagem de charrete até ela -
nada disso deixou qualquer traço em minha memória. Por outro lado, consigo
lembrar-me de duas pequenas ocorrências durante a viagem de trem; estas, como o
senhor se lembrará, emergiram na análise de minha fobia. Mas o que mais deveria
ter-me impressionado foi um ferimento em meu rosto, que causou considerável
perda de sangue e devido ao qual um cirurgião teve que me dar alguns pontos.
Ainda posso sentir a cicatriz resultante desse acidente, mas não sei de nenhuma
lembrança que o aponte, nem direta nem indiretamente. É verdade que eu talvez
tivesse menos de dois anos nessa época.
“Decorre
daí que não sinto nenhuma surpresa diante dos quadros e cenas desses dois
primeiros grupos. Sem dúvida, são lembranças deslocadas cujo elemento
essencial, na maioria dos casos, foi omitido. Mas em alguns ele é ao menos
sugerido, e em outros, é-me fácil completá-lo seguindo certos indícios. Ao
fazê-lo, consigo estabelecer uma sólida conexão entre os fragmentos separados
das lembranças e chegar a uma compreensão clara de qual foi o interesse
infantil que recomendou essas ocorrências específicas a minha memória. Isso não
se aplica, entretanto, ao conteúdo do terceiro grupo, que não discuti até aqui.
Vejo-me aí defrontado por um material - uma cena bastante longa e vários
quadros menores - com o qual não consigo fazer nenhum progresso. A cena me
parece bem irrelevante, e não posso compreender por que se fixou em minha
memória. Deixe-me descrevê-la para o senhor. Vejo uma pradaria retangular com
um declive bastante acentuado, verde e densamente plantada; no relvado há um
grande número de flores amarelas - evidentemente, dentes-de-leão comuns. No topo
da campina há uma casa de campo e, frente a sua porta, duas mulheres conversam
animadamente - uma camponesa com um lenço na cabeça e uma babá. Três crianças
brincam na grama. Uma delas sou eu mesmo (na idade de dois ou três anos); as
duas outras são meu primo, um ano mais velho que eu, e sua irmã, que tem quase
exatamente a minha idade. Estamos colhendo as flores amarelas e cada um de nós
segura um ramo de flores já colhidas. A garotinha tem o ramo mais bonito e,
como que por um acordo mútuo, nós - os dois meninos - caímos sobre ela e
arrebatamos suas flores. Ela sobe correndo a colina, em lágrimas, e a título de
consolo a camponesa lhe dá um grande pedaço de pão preto. Mal vemos isso,
jogamos fora as flores, corremos até a casa e pedimos pão também. E de fato o
recebemos; a camponesa corta as fatias com uma longa faca. Em minha lembrança,
o pão tem um sabor delicioso - e nesse ponto a cena se interrompe.
“Ora,
o que há nessa ocorrência para justificar o dispêndio de memória que ela me
acarretou? Em vão quebrei a cabeça para descobrir. Será que a ênfase está em
nosso comportamento desagradável para com a garotinha? Será que a cor amarela
dos dentes-de-leão - uma flor que hoje, é claro, estou longe de admirar - me
agradou tanto assim? Ou será que, em conseqüência de minha corrida pela grama,
o pão me pareceu tão mais saboroso do que de hábito, a ponto de me deixar uma
impressão inesquecível? Também não consigo descobrir nenhuma ligação entre essa
cena e o interesse que (como pude descobrir sem qualquer dificuldade) mantinha
unidas as outras cenas de minha infância. Grosso modo, parece-me que
alguma coisa não está muito certa nessa cena. O amarelo das flores é um
elemento desproporcionalmente destacado na situação como um todo, e o gosto
saboroso do pão me parece exagerado de maneira quase alucinatória. Não consigo
deixar de me lembrar de uns quadros que vi certa vez numa exposição de um
teatro de variedades. Certas partes desses quadros, e naturalmente as menos
apropriadas, em vez de serem pintadas, destacavam-se em três dimensões - por
exemplo, as anquinhas das damas. Bem, o senhor saberia indicar algum meio de
encontrar uma explicação ou interpretação para essa lembrança redundante de
minha infância?”
Achei
recomendável perguntar-lhe desde quando se ocupava com essa recordação: se
achava que ela vinha retornando periodicamente a sua lembrança desde a
infância, ou se ela teria emergido em alguma ocasião posterior que pudesse ser
recordada. Essa pergunta foi tudo o que se fez necessário para que eu
contribuísse para a solução do problema; o resto foi descoberto por meu próprio
colaborador, que não era neófito em tarefas desse tipo.
-Eu
ainda não havia pensado nisso, respondeu ele. - Agora que o senhor levantou a
questão, parece-me quase com certeza que essa lembrança infantil nunca me
ocorreu em meus primeiros anos. Mas lembro-me também da ocasião que levou à
recuperação dessa e de muitas outras recordações de minha tenra infância.
Quando tinha dezessete anos e estava na escola secundária, voltei pela primeira
vez a minha terra natal para passar férias com uma família que fora nossa amiga
desde aquela época remota. Sei muito bem da abundância de impressões que se
apossou de mim nessa ocasião. Mas vejo agora que terei que contar-lhe um longo
trecho de minha história: ele é pertinente a isso e o senhor mesmo o suscitou
com sua pergunta. Portanto, escute. Meus pais eram originalmente pessoas
abastadas e que, imagino, viviam com bastante conforto naquele cantinho de
província. Quando eu tinha cerca de três anos, o ramo industrial em que meu pai
trabalhava sofreu uma catástrofe. Ele perdeu todos os seus bens e fomos
forçados a deixar a localidade, mudando-nos para uma cidade grande. Seguiram-se
alguns anos longos e difíceis, dos quais, parece-me, nada é digno de ser lembrado.
Nunca me senti realmente à vontade na cidade. Acredito agora que nunca me
livrei da saudade dos lindos bosques próximos de nossa casa, onde (como me diz
uma de minhas recordações daqueles dias) eu costumava fugir de meu pai, quase
antes mesmo de aprender a andar. Aquelas férias aos dezessete anos foram minhas
primeiras férias no campo e, como já disse, hospedei-me com uma família da qual
éramos amigos e que tinha conseguido uma grande ascensão social desde nossa
mudança. Pude comparar o conforto reinante por lá com nosso próprio estilo de
vida em casa, na cidade. Mas não adianta continuar a fugir do assunto: devo
admitir que houve outra coisa que me excitou poderosamente. Eu estava com
dezessete anos e na família com que me hospedei havia uma filha de quinze anos,
por quem me apaixonei imediatamente. Esse foi meu primeiro amor, e foi bastante
intenso, mas eu o mantive em completo segredo. Passados alguns dias, a menina
voltou a sua escola (de onde também viera passar férias em casa), e foi essa
separação, depois de um contato tão breve, que realmente levou minha saudade ao
auge. Passei muitas horas em caminhadas solitárias pelos bosques adoráveis que
havia redescoberto, e passava o tempo construindo castelos no ar. Curiosamente,
eles não se relacionavam com o futuro, mas procuravam melhorar o passado. Que
bom se a bancarrota não tivesse ocorrido! Ah, se eu tivesse ficado e crescido
no campo, e me tornado forte como os rapazes da casa, os irmãos de minha amada!
E se tivesse seguido a profissão de meu pai, e finalmente casado com ela, pois
a teria conhecido intimamente por todos aqueles anos! É claro que eu não tinha
a menor dúvida de que, nas circunstâncias criadas por minha imaginação, eu a
teria amado tão apaixonadamente quanto de fato me parecia amá-la nessa época. É
estranho, porque agora, quando a vejo vez por outra - ela se casou com uma
pessoa daqui - ela me é extraordinariamente indiferente. No entanto, lembro-me
muito bem que, durante um bom tempo depois disso, eu era afetado pela cor
amarela do vestido que ela estava usando quando nos encontramos pela primeira
vez, em toda parte onde visse a mesma cor.
Isso
soa muito parecido com seu comentário entre parênteses de que você não gosta
mais do dente-de-leão comum. Não acha que pode haver uma ligação entre o
amarelo do vestido da menina e o amarelo ultranítido das flores em sua cena
infantil? |Cf. nota de rodapé 3, ver em [1].|
-É
possível, mas não era o mesmo amarelo. O vestido era mais de um
marrom-amarelado, mais parecido com a cor do goivo. Mas posso dar-lhe pelo
menos uma idéia intermediária que talvez lhe seja útil. Numa ocasião posterior,
quando estava nos Alpes, vi como certas flores que têm uma coloração clara nas
planícies adquirem tons mais escuros em grandes altitudes. Se não estou muito
equivocado, encontra-se freqüentemente, nas regiões montanhosas, uma flor muito
semelhante ao dente-de-leão, mas que é amarelo-escura, o que coincidiria
exatamente com a cor do vestido da jovem de quem eu tanto gostava. Mas ainda
não terminei. Vou lhe falar agora de uma segunda ocasião que avivou em mim
certas impressões da infância, e que data de época não muito distante da
primeira. Eu tinha dezessete anos quando revi minha cidade natal. Três anos
depois, durante as férias, fui visitar meu tio e reencontrei seus filhos, que
tinham sido meus primeiros parceiros de brincadeiras - os mesmos dois primos, o
menino um ano mais velho que eu a a menina de minha idade, que aparecem na cena
infantil com os dentes-de-leão. Essa família deixara minha cidade natal na
mesma época que nós e prosperara numa cidade muito distante.
E
você voltou a se apaixonar - dessa vez por sua prima -, e se entregou a um novo
grupo de fantasias?
-Não,
dessa vez as coisas foram diferentes. Nessa época eu estava na universidade e
era escravo de meus livros. Não me sobrava nada para minha prima. Tanto quanto
posso perceber, não tive nenhuma fantasia semelhante nessa ocasião. Mas creio
que meu pai e meu tio haviam arquitetado um plano pelo qual eu deveria trocar o
tema obscuro de meus estudos por alguma coisa de maior valor prático,
estabelecer-me, depois de concluir meus estudos, no lugar onde meu tio morava,
e desposar minha prima. Sem dúvida, quando perceberam o quanto eu estava
absorto em minhas próprias intenções, o plano foi abandonado; mas imagino que
eu certamente me dera conta de sua existência. Só mais tarde, quando já era um
cientista inexperiente, duramente pressionado pelas exigências da vida, e
quando tive que aguardar muito tempo até conseguir uma colocação aqui, é que
devo ter pensado, algumas vezes, que meu pai tivera boas intenções ao planejar
aquele casamento, para compensar a perda em que a catástrofe inicial tinha
envolvido toda a minha existência.
Nesse
caso, tendo a acreditar que a cena infantil que estamos examinando tenha emergido
nessa época, quando você estava lutando pelo pão de cada dia - desde,
naturalmente, que você possa confirmar minha idéia de que foi durante esse
mesmo período que teve seu primeiro contato com os Alpes.
-Sim,
é isso mesmo: o montanhismo era o único divertimento que eu me permitia nessa
época. Mas ainda não consigo acompanhar seu raciocínio.
Já
chego lá. O elemento que você mais enfatizou em sua cena infantil foi o fato de
o pão feito no interior ter um sabor tão delicioso. Parece claro que essa
representação, que equivalia quase a uma alucinação, correspondia a sua
fantasia na vida confortável que teria levado se tivesse ficado no campo e
casado com aquela moça |de vestido amarelo| - ou, em linguagem simbólica, de
como seria doce o sabor do pão pelo qual você vinha tendo de lutar tão
arduamente nos últimos anos. Também o amarelo das flores aponta para essa mesma
moça. Mas há ainda alguns elementos da cena infantil que só podem estar
relacionados com a segunda fantasia - a de desposar sua prima. Jogar fora as
flores em troca do pão não me parece ser um mau disfarce para o esquema que seu
pai lhe tinha preparado: você deveria desistir de suas idéias impraticáveis e
dedicar-se a uma ocupação “pão com manteiga”, não é mesmo?
-Então,
parece que combinei os dois conjuntos de fantasias sobre como minha vida
poderia ter sido mais fácil: de um lado, o “amarelo” e o “pão feito no campo”
e, de outro, as flores jogadas fora e as pessoas reais envolvidas.
Sim.
Você projetou as duas fantasias uma na outra e fez delas uma lembrança
infantil. O elemento das flores alpinas constitui, por assim dizer, um selo
indicando a data da fabricação. Posso garantir-lhe que as pessoas muitas vezes
constroem essas coisas inconscientemente - quase como obras de ficção.
-Mas,
se é assim, não houve nenhuma lembrança infantil, apenas uma fantasia
recolocada na infância. No entanto, sinto que a cena é autêntica. Como se
explica isso?
Em
geral, não há nenhuma garantia quanto aos dados produzidos por nossa memória.
Mas estou pronto a concordar com você em que a cena é autêntica. Nesse caso,
você a selecionou dentre inúmeras outras da mesma espécie ou não, porque,
graças a seu conteúdo (em si mesmo irrelevante), ela se prestava bem para
representar as duas fantasias, tão importantes para você. Uma recordação como
essa, cujo valor reside no fato de representar na memória impressões e
pensamentos de uma data posterior cujo conteúdo está ligado a ela por elos
simbólicos ou semelhantes, pode perfeitamente ser chamada de “lembrança
encobridora”. De qualquer modo, você deixará de se sentir surpreso pela
freqüente repetição dessa cena em sua mente. Ela não pode mais ser considerada
inocente, já que, como descobrimos, é a conta certa para ilustrar os mais
importantes pontos críticos de sua vida, a influência das duas mais poderosas
forças motivacionais - a fome e o amor.
-É,
ela representou bem a fome. Mas, e o amor?
No
amarelo das flores, a meu ver. Mas não posso negar que, nessa sua cena
infantil, o amor é representado com muito menos destaque do que eu poderia
esperar com base em minha experiência prévia.
-Não,
o senhor está enganado. A essência dela é a representação do amor. Agora estou
entendendo pela primeira vez. Pense um instante! Tirar as flores de uma menina
significa deflorá-la. Que contraste entre o despudor dessa fantasia e minha
timidez na primeira ocasião, e minha indiferença na segunda.
Posso
assegurar-lhe que a timidez juvenil costuma ter como complemento esse tipo de
fantasias despudoradas.
-Mas,
nesse caso, a fantasia que se transformou nessas lembranças infantis não seria
uma fantasia consciente de que eu pudesse lembrar-me, e sim uma fantasia
inconsciente, não é?
Pensamentos
inconscientes que são um prolongamento dos pensamentos conscientes. Você pensa
consigo mesmo, “Ah, se eu tivesse casado com fulana”, e por trás desse
pensamento há um impulso a formar um quadro daquilo em que realmente consiste
esse “estar casado”.
-Agora
posso prosseguir sozinho. A parte mais sedutora de todo esse assunto para um
molecote é o quadro da noite de núpcias. (Que lhe importa o que vem depois?)
Mas esse quadro não pode arriscar-se à luz do dia: a atitude predominante de
acanhamento e respeito perante a mocinha o mantém suprimido. Assim, ele
permanece inconsciente…
E
resvala para uma lembrança infantil. Você tem toda razão. É precisamente o
elemento grosseiramente sensual da fantasia que explica por que ela não evolui
para uma fantasia consciente, devendo antes contentar-se em se
transformar alusivamente e sob um disfarce floreado numa cena infantil.
-Mas
o que eu gostaria de saber é por que justamente numa cena infantil?
Por
sua inocência, talvez. Você seria capaz de imaginar um contraste maior com
essas intenções de agressão sexual grosseira do que uma brincadeira infantil?
Entretanto, há fundamentos mais gerais que têm uma influência decisiva na
promoção do deslizamento dos pensamentos e desejos recalcados para lembranças
infantis, pois você constatará que a mesma coisa acontece invariavelmente nos
pacientes histéricos. Além disso, é como se a própria recordação do passado
remoto fosse facilitada por algum motivo prazeroso: forsan et haec olim
meminisse juvabit.
-Sendo
assim, perdi toda a confiança na autenticidade da cena dos dentes-de-leão. Eis
como vejo tudo isso: nas duas ocasiões em questão, e com o apoio de motivos
realistas muito compreensíveis, ocorreu-me o seguinte pensamento: “Se eu
tivesse desposado essa ou aquela moça, minha vida se teria tornado muito mais
agradável.” A corrente sensual de minha mente se apossou do pensamento contido
na prótase e a repetiu em imagens de um tipo capaz de proporcionar a mesma
satisfação sensual atual. Essa segunda versão do pensamento permaneceu
inconsciente, graças a sua incompatibilidade com a predisposição sexual
dominante; mas o próprio fato de permanecer inconsciente permitiu-lhe persistir
em minha mente muito depois de as mudanças na situação real se terem desfeito
por completo da versão consciente. Segundo uma lei geral, como diz o senhor, a
oração que permanecera inconsciente procurou transformar-se numa cena infantil
que, por sua inocência, poderia tornar-se consciente. Para isso, ela teve que
sofrer uma nova transformação, ou melhor, duas novas transformações. Uma destas
eliminou o elemento passível de objeção na prótase, expressando-o
figurativamente; a segunda impôs à apódose uma forma passível de representação
visual - usando, para esse fim, as representações intermediárias de “pão” e de
“ocupações pão-com-manteiga” |prosaicas|. Vejo que, ao produzir uma fantasia
como essa, eu estava promovendo, por assim dizer, a realização dos dois desejos
recalcados - de defloramento e de conforto material. Mas agora que dei uma
explicação tão completa dos motivos que me levaram à produção da fantasia dos
dentes-de-leão, não posso deixar de concluir que estou lidando com uma coisa
que nunca aconteceu, mas foi injustificada e sub-repticiamente introduzida em
minhas lembranças infantis.
Vejo
que preciso tomar a defesa da autenticidade dela. Você está indo longe demais.
Aceitou minha afirmação de que toda fantasia suprimida dessa espécie tende a
deslizar para uma cena infantil. Mas suponha agora que isso não possa ocorrer,
a menos que haja um traço mnêmico cujo conteúdo ofereça à fantasia um ponto de
contato - como se andasse meio caminho até ela. Uma vez encontrado um ponto de
contato desse tipo - no presente caso, foi o defloramento, o retirar as flores
-, o conteúdo remanescente da fantasia é remodelado com a ajuda de todos os
pensamentos intermediários legítimos - tome o pão como um exemplo -, até que
possa encontrar outros pontos de contato com o conteúdo da cena infantil. É
muito possível que, no decorrer desse processo, a própria cena infantil também
sofra mudanças; considero certo que também é possível promover falsificações da
memória dessa maneira. No seu caso, a cena infantil parece apenas ter tido
algumas de suas linhas gravadas mais profundamente: pense na ênfase exagerada
no amarelo e na qualidade excessivamente saborosa do pão. Mas a matéria-prima
era utilizável. Não fosse por isso, não teria sido possível que essa lembrança
particular, em vez de quaisquer outras, ganhasse acesso à consciência. Nenhuma
cena desse tipo lhe teria ocorrido como uma lembrança infantil, ou talvez lhe
ocorresse alguma outra - pois você sabe como é fácil para nossa engenhosidade
construir pontes de ligação entre dois pontos quaisquer.E afora seu sentimento
subjetivo, que não estou inclinado a subestimar, há mais uma coisa que depõe a
favor da autenticidade de sua lembrança dos dentes-de-leão. Ela contém
elementos que não foram solucionados pelo que você me disse e que, a rigor, não
se coadunam com o sentido requerido pela fantasia. Por exemplo, seu primo
ajudando-o a roubar as flores da garotinha - faz algum sentido para você o
pensamento de ser ajudado num defloramento? ou o da camponesa e da babá
defronte à casa?
-Não
que eu possa perceber.
Logo,
a fantasia não coincide completamente com a cena infantil. Baseia-se nela
apenas em certos pontos, e isso depõe a favor da autenticidade da lembrança
infantil.
-O
senhor acha que uma interpretação como essa, de uma lembrança infantil
aparentemente inocente, é aplicável com freqüência?
Muito
freqüentemente, em minha experiência. Que tal nos divertimos verificando se os
dois exemplos dados pelos Henris podem ser interpretados como lembranças
encobridoras, ocultando experiências e desejos subseqüentes? Refiro-me à
lembrança da mesa posta para uma refeição, com uma bacia de gelo sobre ela, que
se supôs ter alguma ligação com a morte da avó do sujeito, e à outra lembrança,
de uma criança quebrando um galho de árvore durante um passeio e sendo ajudada
por alguém.
Ele
refletiu um pouco e respondeu:
-Não
consigo deduzir coisa alguma da primeira. É muito provável que se trate de um
caso de deslocamento em ação; mas é impossível adivinhar os passos
intermediários. Quanto ao segundo caso, eu teria condições de fazer uma
interpretação, se a pessoa envolvida não fosse um francês.
Não
estou acompanhando seu raciocínio. Que diferença isso faz?
-Muita
diferença, já que o passo intermediário entre uma lembrança encobridora e
aquilo que ela esconde tende a ser fornecido por uma expressão verbal. Em
alemão, “quebrar um galho” é uma expressão vulgar muito comum para designar a
masturbação. A cena equivaleria, portanto, a recolocar na primeira infância uma
tentação a se masturbar - com a ajuda de alguém - efetivamente ocorrida num
período posterior. Mesmo assim, isso não se ajusta, pois na cena infantil havia
diversas outras pessoas presentes.
Ao
passo que a tentação dele a se masturbar deve ter ocorrido na solidão e em
segredo. É justamente esse contraste que me inclina a aceitar sua visão: mais
uma vez, ele serve para tornar a cena inocente. Você sabe o que significa
vermos, num sonho, “uma porção de estranhos”, como acontece tão freqüentemente
nos sonhos de nudez em que nos sentimos tão terrivelmente embaraçados? Nada
mais, nada menos, do que o sigilo, que ali se expressa novamente por seu
oposto. Entretanto, nossa interpretação permanece como uma brincadeira, já que
não sabemos se um francês reconheceria uma alusão à masturbação nas palavras casser
une branche d’un arbre ou em alguma expressão apropriadamente retificada.
Essa
análise, que reproduzi tão acuradamente quanto possível, terá, espero,
esclarecido até certo ponto o conceito de “lembrança encobridora” como aquela
que deve seu valor enquanto lembrança não a seu próprio conteúdo, mas às
relações existentes entre esse conteúdo e algum outro que tenha sido suprimido.
É possível distinguir diferentes classes de lembranças encobridoras, conforme a
natureza dessa relação. Encontramos exemplos de duas dessas classes entre o que
se descreve como as primeiras lembranças da infância - isto é, se incluirmos na
categoria de lembranças encobridoras as cenas infantis incompletas, que são
inocentes justamente por sua incompletude. Pode-se prever que as lembranças
encobridoras também hão de ser formadas de resíduos de lembranças relativas a
etapas posteriores da vida. Quem quer que tenha em mente seu traço
característico - a saber, que elas são extremamente bem lembradas, mas seu
conteúdo é completamente irrelevante - evocará facilmente vários exemplos dessa
espécie de sua própria memória. Algumas dessas lembranças encobridoras,
versando sobre eventos posteriores da vida, devem sua importância a uma ligação
com experiências da juventude que permaneceram suprimidas. Tal ligação é o
reverso da existente no caso que analisei, onde uma lembrança infantil foi
explicada por experiências posteriores. A lembrança encobridora pode ser
descrita como “regressiva” ou “progressiva”, conforme exista uma ou outra
relação cronológica entre o encobrimento e a coisa encoberta. De outro ponto de
vista, podemos distinguir as lembranças encobridoras positivas das negativas
(ou lembranças refratárias), cujo conteúdo estabelece uma relação antitética
com o material suprimido. Todo esse assunto merece um exame mais completo,
porém devo contentar-me em assinalar que há processos complicados - processos
que, aliás, são inteiramente análogos à formação dos sintomas histéricos -
envolvidos na construção de nosso estoque de lembranças.
Nossas
primeiras lembranças infantis serão sempre um tema de especial interesse,
porque o problema mencionado no início deste artigo (o fato de as impressões de
maior importância para todo o nosso futuro geralmente não deixarem quaisquer imagens
mnêmicas atrás de si) leva-nos a refletir sobre a origem das lembranças
conscientes em geral. A princípio, sem dúvida, tendemos a isolar as lembranças
encobridoras que são objeto deste estudo como elementos heterogêneos entre os
resíduos das recordações infantis. No que concerne às imagens remanescentes, é
provável que adotemos o ponto de vista simplista de que elas emergem
simultaneamente a uma experiência, como conseqüência imediata da impressão por
ela causada, e que, daí por diante, retornam de tempos em tempos, de acordo com
as leis de reprodução conhecidas. Uma observação mais minuciosa, entretanto,
revela certos traços que não combinam com essa concepção. Há, sobretudo, o
seguinte aspecto: na maioria das cenas infantis importantes e, em outros aspectos,
incontestáveis, o sujeito se vê na recordação como criança, sabedor de que essa
criança é ele mesmo; no entanto, vê essa criança tal como a veria um observador
externo à cena. Os Henris chamam devidamente a atenção para o fato de que
muitos dos que participaram de sua pesquisa enfatizaram expressamente essa
peculiaridade das cenas infantis. Ora, é evidente que tal quadro não pode ser
uma repetição exata da impressão originalmente recebida, pois, na época, o
sujeito estava em meio à situação e não prestava atenção a si mesmo, mas sim ao
mundo externo.
Sempre
que numa lembrança o próprio sujeito assim aparecer como um objeto entre outros
objetos, esse contraste entre o ego que age e o ego que recorda pode ser tomado
como uma prova de que a impressão original foi elaborada. É como se um traço
mnêmico da infância se retraduzisse numa forma plástica e visual em época
posterior - na época do despertar da lembrança. Mas nenhuma reprodução da
impressão original jamais penetrou na consciência do sujeito.
Há um
outro fato que proporciona uma prova ainda mais convincente em favor dessa
segunda visão. Dentre várias das lembranças infantis de experiências
importantes, todas com nitidez e clareza similares, há algumas cenas que,
quando verificadas (por exemplo, pelas recordações dos adultos), revelam ter
sido falsificadas. Não que sejam completas invenções; são falsas no sentido de
terem transposto um acontecimento para um lugar onde ele não ocorreu - é o caso
de um dos exemplos citados pelos Henris -, ou de terem fundido duas pessoas
numa só, ou substituído uma pela outra, ou então as cenas como um todo dão
sinal de serem combinações de duas experiências separadas. A simples imprecisão
da recordação não desempenha aqui um papel considerável, em vista do alto grau
de intensidade sensorial de que as imagens são dotadas e da eficiência da
função da memória nos jovens; a investigação detalhada mostra, antes, que esses
falseamentos das lembranças são tendenciosos - isto é, que servem aos objetivos
de recalque e deslocamento de impressões abjetáveis ou desagradáveis. Segue-se,
portanto, que essas lembranças falsificadas também devem ter-se originado num
período da vida em que se tornou possível conferir um lugar na vida mental a
esse tipo de conflitos e aos impulsos ao recalcamento - muito posterior,
portanto, ao período a que pertence seu conteúdo. Mas também nesses casos a
lembrança falsificada é a primeira de que tomamos conhecimento: a matéria-prima
dos traços mnêmicos de que a lembrança foi forjada permanece desconhecida para
nós em sua forma original.
O
reconhecimento desse fato deve reduzir a distinção que traçamos entre as
lembranças encobridoras e outras lembranças derivadas de nossa infância. Com
efeito, pode-se questionar se temos mesmo alguma lembrança proveniente
de nossa infância: as lembranças relativas à infância talvez sejam tudo
o que possuímos. Nossas lembranças infantis nos mostram nossos primeiros anos
não como eles foram, mas tal como apareceram nos períodos posteriores em que as
lembranças foram despertadas. Nesses períodos de despertar, as lembranças
infantis não emergiram, como as pessoas costumam dizer; elas foram formadas
nessa época. E inúmeros motivos, sem qualquer preocupação com a precisão
histórica, participaram de sua formação, assim como da seleção das próprias
lembranças.
NOTA AUTOBIOGRÁFICA
(1901 |1899|)
NOTA
DO EDITOR INGLÊS
(a) EDIÇÃO ALEMÃ:
1901
Em Biographisches Lexicon hervorragender Aerzte des neuzehnten Jahrhunderts
|Léxico Biográfico dos Médicos Eminentes do Século XIX|, de J. L. Pagel, Berlim
e Viena, Coluna 545.
Parece que essa nota
nunca foi reeditada e que esta tradução, de James Strachey, é a primeira em
inglês.
As
evidências internas mostram que esta nota deve ter sido escrita no outono de
1899. É interessante por mostrar a visão que Freud supunha ter adotado sobre
suas atividades às vésperas da publicação da obra que iria revolucionar sua
posição no mundo científico. As numerosas abreviações do original foram
grafadas por extenso.
NOTA
AUTOBIOGRÁFICA
FREUD, SIGM., Viena. Nascido
a 6 de maio de 1856, em Freiberg, na Morávia. Estudou em Viena. Aluno de
Brücke, o fisiologista. Formatura |grau de médico|, 1881. Aluno de Charcot em
Paris, 1885-6. Habilitação |nomeação como Privatdozent|, 1885. Trabalhou
como médico e Dozent na Universidade de Viena a partir de 1886. Indicado
como Professor Extraordinarius, 1897. Antes disso, Freud produziu textos
sobre histologia e anatomia cerebral e, subseqüentemente, trabalhos clínicos
sobre neuropatologia; traduziu obras de Charcot e Bernheim. Em 1884, “Über
Coca” |“Sobre a Coca”|, artigo que apresentou a cocaína à medicina. Em 1891, Zur
Auffassung der Aphasien |Sobre a Interpretação das Afasias|. Em 1891 e
1893, monografias sobre as paralisias cerebrais infantis, que culminaram em
1897 no volume sobre esse assunto no Handbuch de Nothnagel. Em 1895, Studien
über Hysterie |Estudos sobre a Histeria| (com o Dr. J. Breuer). Desde então
Freud voltou-se para o estudo das psiconeuroses, especialmente da histeria, e
numa série de trabalhos mais curtos enfatizou a importância etiológica da vida
sexual para as neuroses. Desenvolveu também uma nova psicoterapia da histeria,
sobre a qual muito pouca coisa tem sido publicada. Um livro, Die
Traumdeutung |A Interpretação dos Sonhos|, está no prelo.
BIBLIOGRAFIA E
ÍNDICE DE AUTORES
|Os
títulos de livros e periódicos aparecem grifados; os títulos de artigos, entre
aspas. As abreviaturas estão de acordo com a World List of Scientific
Periodicals (Londres, 1952). Outras abreviaturas usadas neste volume serão
encontradas na Lista ao final desta bibliografia. Os números em negrito
referem-se a volumes; os comuns, a páginas. No caso dos títulos de Freud, as
letras adicionais às datas de publicação estão de acordo com os títulos
correspondentes na bibliografia completa dos escritos de Freud a ser incluída
no último volume da Edição Standard Brasileira.
Quanto
aos autores não-técnicos e aos autores técnicos dos quais não se menciona
nenhuma obra específica, ver o Índice Remissivo.|
BEARD, G. M. (1881) American Nervousness, its Causes and Consequences,
Nova York.
(1884) Sexual Neurasthenia (Nervous Exhaustion), its Hygiene, Causes,
Symptoms and Treatment, Nova York.
BERNHEIM, H. (1886) De la suggestion et de ses applications à la
therapeutique Paris.
(1891) Hypnotisme, suggestion et psychothérapie: études nouvelles,
Paris.
BREUER,
J. e FREUD, S. (1893) Ver FREUD, S. (1893a)
(1895) Ver FREUD, S. (1895d)
BRUN, R. (1936) “Sigmund Freuds Leistungen auf dem Gebiete der
organischen Neurologie”, Schweiz. Arch. Neurol. Psychiat., 37, 200.
CHARCOT, J.-M. (1887) Leçons sur les maladies du système nerveux,
Vol. III, Paris.
(1888)
Leçons du mardi, 1887-8, Paris.
(1889)
Leçons du mardi, 1888-9, Paris.
(1886-90)
Oeuvres complètes (9 vols.), Paris.
DARKSCHEWITSCH,
L. (1886) Ver FREUD, S. (1886b)
ERLENMEYER,
F. A. (1885) Crítica das concepções de Freud sobre a cocaína, Zbl. Nervenheilk., 8.
(1886) “Über Cocainsucht”, Wien med. Pr., 27, Col. 918.
(1887) Die Morphiumsucht und ihre Behandlung, 3ª ed., Berlim,
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FISHER, J. (1955) Bird Recognition III, Penguin Books.
FLIESS, W. (1892) Neue Beitraege und Therapie der nasalen
Reflexneurose, Viena.
(1893) Die nasale Reflexneurose”, Verhandlungen des Kongresses für
innere Medizin, Wiesbaden, 384.
FREUD, S. (1877a) “Über den Ursprung der hinteren
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Akad. Wiss. Wien (Math.- Naturwiss. Kl.), III Abt., 75, 15.
(1877b) “Beobachtungen über Gestaltung und feineren Bau der als Hoden
beschriebenen Lappenorgane des Aals”, S. B. Akad. Wiss. Wien
(Math.-Naturwiss.Kl.), I Abt., 75, 419.
(1878a) “Über Spinalganglien und Rückenmark des
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(1879a) “Notiz über eine Methode zur anatomischen Praeparation des
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(1882a) “Über den Bau der Nervenfasern und Nervenzellen beim
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85, 9.
(1884a) “Ein Fall von Hirnblutung mit indirekten basalen Herdsymptomen
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(1884b) “Eine neue Methode zum Studium des Faserverlaufes im
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(1884c) “A New histological Method for the Study of Nerve-Tracts in the
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(1884d) “Eine neue Methode zum Studium des Faserverlaufes im
Centralnervensystem”, Arch. Anat. Physiol., Lpz., Anat. Abt., 453.
(1884e) “Über Coca”, Zbl. ges. Ther., 2, 289.
|Trad. (resumida): “Coca”, St Louis Med. surg. J., 47, 502.|
(1884f) |1882|) “Die Struktur der Elemente des Nervensystems”, Jb.
Psychiat. Neurol., 5, Heft 3, 221.
(1885a) “Beitrag zur Kenntnis de Cocawirkung”, Wien. med. Wschr.,
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(1885b) “Über die Allgemeinwirking de Cocaiens”, med.-chir.
Zbl., 20, Nº 32, 374.
(1885c) “Ein Fall von Muskelatrophie mit ausgebreiteten
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(1885d) “Zur Kenntnis der Olivenzwischenschicht”, Neurol. Zbl.,
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(1885e) “Gutachten über das Parke Cocaien”, in Gutt, “Über die verschiedenen
Cocaien-Praeparate und deren Wirkung”, Wien. med. Pr., 26, Nº 32,
1036.
(1886a) “Akute multiple Neuritis der spinalen und Hirnnerven”, Wien.
med. Wschr., 36, Nº 6, 168.
(1886b) Com DARKSCHEWITSCH, L., “Über die Beziehung des Strickkoepers
zum Hinterstrang und Hinterstrangskern nebst Bemerkungen über zwei Felder der
Oblongata”, Neurol. Zbl., 5, Nº 6, 121.
(1886c)
“Über den Ursprung des Nervus acusticus”, Mschr. Ohrenheilk., Neue
Folge, 20, Nº 8, 245, e 9, 277.
(1886d) “Beobachtung einer hochgradien Hemianaesthesie bei einem
hysterischen manne (Beitraege zur Kasuistik der Hysterie I)”, Wien. med. Wschr., 36, Nº 49, 1633.
|Trad.:
“Observação de um Caso Grave de Hemianestesia num Homem Histérico”. Ed.
Standard, 1.|
(1886f)
Tradução com Prefácio e Notas de Rodapé de Leçons sur les maladies du
système nerveux, Vol. III, de J.-M. Charcot, Paris, 1887, sob o título Neue
Vorlesungen über die Krankheiten des Nervensystems insbesonder über Hysterie,
Viena.
|Trad.:
Prefácio e Notas de Rodapé à tradução das Conferências sobre as Doenças do
Sistema Nervoso, de J.-M. Charcot, Ed. Standard, 1.|
(1887d) “Bemerkungen über Cocainsucht und Cocainfurcht, mit Beziehung
auf einen Vortrag W. A. Hammonds’s”, Wien. med. Wschr., 37, Nº 28, 929.
(1888a) “Über Hemianopsie im frühesten Kindesalter”, Wien,
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(1888b) “Aphasie”, “Gehirn”, “Hysterie” e “Hysteroepilpsie” em Handwoerterbuch
der gesamten Medizin, 1, de Villaret, Stuttgart. (Não assinado, autoria incerta.)
(1888-9)
Tradução com Introdução e Notas de De la suggestion et de ses applications à
la thérapeutique, de Bernheim, Paris, 1886, sob o título Die Suggestion
und ihre Heilwirkung, Viena.
|Trad.:
Prefácio à tradução de De la Suggestion, de Bernheim, Ed. Standard, 1.|
(1891a) Com RIE, O., “Klinische Studie über die halbseitige
Cerebrallaehmung der Kinder”, Heft III de Beitraege zur Kinderheilkund,
org. Kassowitz, Viena.
(1891b) Zur Auffassung der Aphasien, Viena.
|Trad.: On Aphasia, Londres e Nova York, 1953.|
(1892a) Tradução de Hypnotisme suggestion et psychothérapie: études
nouvelles, de Bernheim, Paris, 1891, sob o título Neue Studien über
Hypnotismus, Suggestion und Psychotherapie, Viena.
(1892-3) “Ein Fall von hypnotischer Heilung nebst Bemerkungen über die
Entstehung hysterischer Symptome durch den ‘Gegenwillen’”, G. S., 1,
258; G. W., 1, 3.
|Trad.: “A Case of Successful Treatment by Hypnotism”, C. P., 5, 33; “Um
Caso de Cura pelo Hipnotismo”, Ed., Standard, 1.|
(1892-4)
Tradução com Prefácio e Notas de Rodapé de Leçons du mardi (1887-8), de
J.-M. Charcot, Paris, 1888, sob o título Poliklinische Vortraege, 1,
Viena. |Trad.: Prefácio e Notas de Rodapé à tradução de Leçons du mardi,
de Charcot, Ed. Standard, 1.|
(1893a) Com BREUER, J., “Über den psychischen
Mechanismus hysterischer Phaenomene: Vorlaeufige Mitteilung”, G. S., 1,
7; G. W., 1, 81.
|Trad.:
“Sobre o Mecanismo Psíquico dos Fenômenos Histéricos: Comunicação Preliminar”,
Ed. Standard, 2.|
(1893d) “Zur Kenntnis der cerebralen Diplegien des Kindesalters (im
Anschluss an die Little’sche Krankheit)”, Heft III, Neue Folge, de Beitraege
zur Kinderheilkunde, org. Kassowitz,
Viena.
(1893c)
“Quelques considérations pour une étude comparative des paralysies motrices
organiques et hystériques” |em francês|, G. S., 1, Nº 8, 1-7.
|Trad.:
“Some Points for a Comparative Study of Organic and Hysterical Motor
Paralyses”, C. P. 1, 42; “Considerações para um Estudo Comparativo das
Paralisias Motoras Orgânicas e Histéricas”, Ed. Standard, 1.|
(1893d) “Über familiaere Formen von cerebralen Diplegien”,
Neurol. Zbl., 12, Nº 15, 512, e 16, 542.
(1893e)
“Les diplégies cérébrales infantiles” |em francês|, Rev. neurol., 1, Nº
8, 177.
(1893f) “Charcot”, G. S., 1, 243; G. W., 1, 21.
|Trad.: “Charcot”, C. P. 1, 9; Ed. Standard, 3.|
(1893g) “Über ein Symptom, das haeufig die Enuresis
nocturna der Kinder begleitet”, Neurol. Zbl., 12, Nº 21, 735.
(1893h)
Vortrag “Über den psychischen Mechanismus hysterischer Phaenomene”
|relatório taquigrafado revisto pelo conferencista|, Wien. med. Pr., 34,
Nº 4, 121, e 5, 165.
|Trad.:
Conferência “On the Psychical Mechanism of Hysterical Phenomena”, Int. J.
Psycho-Anal., 37, 8; “Sobre o Mecanismo Psíquico dos Fenômenos Histéricos:
Uma Conferência”, Ed. Standard, 3.|
(1894a)
“Die Abwehr-Neuropsychosen”, G. S., 1, 290; G. W., 1, 59.
|Trad.:
“The Neuro-Psychoses of Defence”, C. P., 1, 59; “As Neuropsicoses de Defesa”,
Ed. Standard, 3.|
(1895b) |1894| “Über die Berechtigung, von der
Neurasthenie einen bestimmten Symptomenkomplex als ‘Angstneurose’ abzutrennen”.
G. S. 1, 306; G. W., 1, 315.
|Trad.: “On the Grounds for Detaching a Particular Syndrome from
Neurasthenia under the Description ‘Anxiety Neurosis”, C. P. 1, 76,
“Fundamentos para Destacar da Neurastenia uma Síndrome Específica Denominada
‘Neurose de Angústia’.” Ed. Standard, 3.|
(1895c) |1894|) “Obsessions et phobies” |em francês|, G. S., 1,
334; G. W., 1, 345.
|Trad.:
“Obsessions and Phobias”, C. P., 1, 128; “Obsessões e Fobias”. Ed. Standard, 3.|
(1895d) Com BREUER, J., Studien über Hysterie, Viena. G. S., 1, 3; G. W., 1, 77, (omitindo as contribuições de Breuer).
|Trad.:
Estudos sobre a Histeria, Ed. Standard, 2. Incluindo as
contribuições de Breuer.|
(1895e) “Über die Bernhardt’sche Sensibilitaetsstoerung am
Oberschenkel”, Neurol. Zbl., 14, Nº 11, 491.
(1895f) “Zur Kritik der ‘Angstneurose’”, G. S., 1, 343; G. W.,
1, 357.
|Trad.: “A Reply to Criticisms of my Paper on Anxiety Neurosis”, C.
P., 1, 107; “Resposta às Críticas a meu Artigo sobre a ‘Neurose de
Angústia’”, Ed. Standard, 3.|
(1896a)
“L’hérédité et l’étiologie des névroses” |em francês|, G. S.,
1, 388; G. W., 1, 407.
|Trad.: “Heredity and the Aetiology of the Neuroses”, C. P, 1,
138; “A Hereditariedade e a Etiologia das Neuroses”, Ed. Standard, 3.|
(1896b) “Weitere Bemerkungen über die Abwehr-Neuropsychosen”, G. S.,
1, 363; G. W., 1, 379.
|Trad.: “Further Remarks on the Neuro-Psychoses of Defence”, C. P., 1,
155; “Observações Adicionais sobre as Neuropsicoses de Defesa”, Ed. Standard,
3.|
(1896c) “Zur Aetiologie der Hysterie”, G. S., 1, 404; G. W.,
1, 425.
|Trad.: “The Aetiology of Hysteria”, C. P., 1, 183; “A Etiologia
da Histeria”, Ed. Standard, 3.|
(1897a) Die infantile Cerebrallaehmung, II Theil, II Abt. de Specielle
Pathologie und Therapie, 9, de Nothnagel, Viena.
(1897b) Inhaltsangaben der wissenschaftlichen Arbeiten des
Privatdozenten Dr. Sigm. Freud
(1877-1897), Viena. G. W., 1, 463.
|Trad.: Sinopses dos Escritos Científicos do Dr. Sigm. Freud
(1877-1897), Ed. Standard, 3.|
(1898a) “Die Sexualitat in der Aetiologie der Neurosen”, G. S.,
1, 439; G. W., 1, 491.
|Trad.: “Sexuality in the Aetiology of the Neuroses”, C. P., 1,
220; “A Sexualidade na Etiologia das Neuroses”, Ed. Standard, 3.|
(1898b)
“Zum psychischen Mechanismus der Vergesslichkeit”, G. W., 1, 519.
|Trad.:
“O Mecanismo Psíquico do Esquecimento”, Ed. Standard, 3.|
(1899a) “Über Deckerinnerungen”, G. S., 1, 465; G. W.,
1, 531.
|Trad.:
“Screen Memories”, C. P., 5, 47; “Lembranças Encobridoras”, Ed. Standard,
3.|
(1900a)
Die Traumdeutung, Viena. G. S., 2-3; G. W., 2-3.
|Trad.:
The Interpretation of Dreams, Londres e Nova York, 1955; A
Interpretação dos Sonhos, Ed. Standard,
4-5.|
(1901b) Zur Psychopathologie des Alltagslebens, Berlim, 1904,
G. S., 4, 3;G. W., 4. |Trad.:
Sobre a Psicopatologia da Vida Cotidiana, Ed. Standard, 6.|
(1901c
|1899|) Nota Autobiográfica em Biographisches Lexicon hervorragender Aerzte
des neuzehnten Jahrhunderts, de J. L. Pagel, Berlim.
|Trad.: Ed. Standard, 3.|
(1904a) “Die Freud’sche psychoanalytische Methode”, G. S., 6, 3; G. W..,
5, 3.
|Trad.:
“Freud’s Psycho-Analytic Procedure”, C. P., 1, 264; “O Método
Psicanalítico de Freud”, Ed. Standard,
7.|
(1905a) “Über Psychotherapie”, G. S., 6, 11; G.
W., 5, 13.
|Trad.: “On Psychotherapy”, C. P., 1, 249; “Sobre a Psicoterapia”, Ed.
Standard, 7.|
(1905c) Der Witz und seine Beziehung zum Unbewussten, Viena. G. S., 9. 5; G. W., 6.
|Trad.:
O Chiste e sua Relação com o Inconsciente, Ed. Standard, 8.|
(1905d) Drei Abhandlungen zur Sexualtheorie Viena. G. S.,
5, 3; G. W., 5, 29.
|Trad.: Three Essays on the Theory of Sexuality, Londres, 1949; Três
Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, Ed. Standard, 7.|
(1905e) |1901|) “Bruchstück einer Hysterie-Analyse”, G. S., 8, 3;
G. W., 5, 163.
|Trad.:
“Fragment of an Analysis of a Case of Hysteria”, C. P., 3, 13;
“Fragmento da Análise de um Caso de Histeria”, Ed. Standard, 7.|
(1906a) “Meine Ansichten über die Rolle der Sexualitaet in der
Aetiologie der Neurosen”, G. S., 5, 123; G. W., 5, 149.
|Trad.: “My Views on the Part played by Sexuality in the Aetiology of
the Neuroses”, C. P., 1, 272; “Minha Visão do Papel desempenhado pela
Sexualidade na Etiologia da Neurose”, Ed. Standard, 7.|
(1906b) Prefácio a Sammlung kleiner Schriften zur Neurosenlehre aus
dens Jahren 1893-1906, de Freud, G. S., 1, 241; G. W., 1,
557.
|Trad.:
Prefácio aos Escritos Breves de Freud de 1893 a 1906, Ed. Standard, 3.|
(1906c) “Tatbestandsdiagnostik und Psychoanalyse”, G. S., 10, 197; G.
W., 7, 3.
|Trad.:
“Psycho-Analysis and the Establishment of the Facts in Legal Proceedings”, C.
P. 2, 13; “A Psicanálise e a Determinação dos Fatos nos Processos
Jurídicos”, Ed. Standard, 9.|
(1908d) “Die ‘kulturelle’ Sexualmoral und die moderne Nervositaet”, G.
S., 5, 143; G. W., 7, 143.
|Trad.:
“’Civilized’ Sexual Morality and Modern Nervous Illness”, C. P., 2, 76; “Moral
Sexual ‘Civilizada’ e Doença Nervosa Moderna”, Ed. Standard, 9.|
(1909a)
“Allgemeines über den hysterischen Anfall”, G. S., 5, 255; G. W.,
7, 235.|Trad.: “Some General Remarks on Hysterical Attacks”, C. P., 2, 100; “Observações
Gerais sobre os Ataques Histéricos”, Ed. Standard, 9.|
(1909d) “Analyse der Phobie eines fünfjaehrigen Knaben”, G. S.,
8, 129; G. W., 7, 243.
|Trad.: “Analysis of a Phobia in a Five-Year-Old Boy”. C. P., 3, 149; “Análise de uma Fobia num Menino de Cinco Anos”, Ed. Standard, 10.|
(1909d) “Bemerkungen über einen Fall von Zwangsneurose”, G. S.,
8, 269; G. W., 7, 381.
|Trad.:
“Notes upon a Case of Obessional Neurosis”, C. P., 3, 293; “Notas sobre
um Caso de Neurose Obsessiva”, Ed. Standard, 10.|
(1910a
|1909|) Über Psychoanalyse, Viena. G. S., 4, 349; G. W.,
8, 3.
|Trad.:
“Five Lectures on Psycho-Analysis”, Amer. J. Psychol., 21 (1910), 181;
“Cinco Lições de Psicanálise”. Ed. Standard, 11.|
(1910d) “Die zukünftigen Chancen der psychoanalytischen Therapie”, G.
S., 6, 25; G. W., 8, 104.
|Trad.: “The Future Prospects of Psycho-Analytic Therapy”, C. P.,
2, 285; “Perspectivas Futuras da Terapia Psicanalítica”, Ed. Standar,
11.|
(1910k) “Über ‘wilde’ Psychoanalyse”, G. S., 6, 37; G.
W., 8, 118.
|Trad.: “’Wild’ Psycho-Analysis”, C. P.., 2, 297; “Psicanálise
‘selvagem’”, Ed. Standard, 11.|
(1911b) “Formulierungen über die zwei Prinzipien des psychischen
Geschehens”, G. S., 5, 409; G. W., 8, 230.
|Trad.:
“Formulations on the Two Principles of Mental Functioning”, C. P., 4,
13; “Formulações sobre os Dois Princípios do Funcionamento Psíquico”, Ed. Standard,
12.|
(1912f)
“Zur Onanie-Diskussion”, G. S., 3, 324; G. W., 8, 332.
|Trad.:
“Contribuições para um Debate sobre a Masturbação”, Ed. Standard, 12.|
(1913i) “Die Disposition zur Zwangsneurose”. G. S., 5, 277; G. W., 8, 442.
|Trad.:
“The Disposition to Obsessional Neurosis”, C. P., 2, 122; “A
Predisposição à Neurose Obsessiva”, Ed. Standard, 12.|
(1914c) “Zur Einführung des Narzissmus”, G. S., 6, 155; G. W.,
10, 138.
|Trad.: “On Narcissism: and Introduction”, C. P., 4, 30; “Sobre o
Narcisismo: Introdução”. Ed. Standard, 14|.
(1914d) “Zur Geschichte der psychoanalytischen Bewegung”, G. S.,
4, 411; G. W., 10, 44.
|Trad.: “On the History of the Psycho-Analytic Movement”, C. P.,
1, 287; “Sobre a História do Movimento Psicanalítico”, Ed. Standard,
14.|
(1915c) “Triebe und Triebschicksale”, G. S., 5, 443; G. W.,
10, 210.
|Trad.: “Instincts and their Vicissitudes”, C. P., 4, 60; “As
Pulsões e suas Vicissitudes”, Ed. Standard, 14.|
(1915d) “Die Verdraengung”, G. S., 5, 466; G. W., 10, 248.
|Trad.:
“Repression”, C. P., 4, 84; “O Recalcamento”, Ed. Standard, 14.|
(1915e)
“Das Unbewusste”, G. S., 5, 480; G. W., 10, 264.
|Trad.: “The Unconscious”, C. P., 4, 98; “O Inconsciente”, Ed. Standard,
14.|
(1916-17) Vorlesungen zur Einführung in die Psychoanalyse, Viena.
G. S., 7; G. W., 11.
|Trad.: Introductory Lectures on Psycho-Analysis, ed. revista,
Londres, 1929 (A General Introduction to Psychoanalysis, Nova York, 1935); Conferências
Introdutórias sobre Psicanálise, Ed. Standard, 15-16.|
(1918b |1914|) “Aus der Geschichte einer infantilen Neurose”, G. S.,
8, 439; G. W., 12, 29.
|Trad.: “From the History of an Infantile Neurosis”, C. P., 3,
473; “História de uma Neurose Infantil”, Ed. Standard, 17.|
(1920g) Jenseits des Lustprinzips, Viena. G. S., 6, 191; G.
W., 13, 3.
|Trad.: Beyond the Pleasure Principle, Londres, 1961; Além do
Princípio do Prazer, Ed. Standard, 18.|
(1921c) Massenpsychologie und Ich-Analyse, Viena. G. S.,
6, 261; G. W., 13, 73.
|Trad.: Group Psychology and the Analysis of the Ego, Londres,
1959; Nova York, 1960; Psicologia das Massas e Análise do Ego, Ed. Standard,
18.|
(1923a) “’Psychoanalyse’ und ‘Libido Theorie’”, G. S., 11, 201; G.
W., 13, 211.
|Trad.:
“Two Encyclopaedia Articles”, C. P., 5, 107; “Dois Verbetes de
Enciclopédia”, Ed. Standard, 18.|
(1923b) Das Ich und das Es, Viena. G. S., 6, 353; G. W.,
13, 237.
|Trad.: The Ego and the Id, Londres, 1927; O Ego e o Id,
Ed. Standard, 19.|
(1923c) “Bemerkungen zur Theorie und Praxis der Traumdeutung”, G. S.,
3, 305; G. W., 13, 301.
|Trad.: “Remarks on the Theory and Practice of Dream-Interpretation“, C.
P., 5, 136; “Observações sobre a Teoria e a Prática da Interpretação do
Sonho”, Ed. Standard, 19.|
(1923d) “Eine Teufelsneurose im siebzehnten Jahrhundert”, G. S.,
10, 409; G. W., 13, 317.
|Trad.:
“A Seventeenth Century Demonological Neurosis”, C. P., 4, 436; “Uma Neurose
Demoníaca do Século XVII”, Ed. Standard, 19.|
(1924a)
Carta |em francês| a le Disque Vert, G. S., 11, 266; G. W., 13,
446. |Trad.: Ed. Standard,
19.|
(1924b) “Neurose und Psychose”, G. S., 5, 418; G. W., 13,
387.
|Trad.: “Neurosis and Psychosis”, C. P., 2, 250; “Neurose e Psicose” Ed.
Standard, 19.|
(1924c)
“Das oekonomische Problem des Masochismus”, G. S., 5, 374; G. W.,
13, 371.
|Trad.:
“The Economic Problem of Masochism”, C. P., 2, 255; “O Problema Econômico do
Masoquismo”, Ed. Standard, 19.|
(1924e) “Die Realitaetsverlust bei Neurose und Psychose”, G. S.,
6, 409; G. W., 13, 363.
|Trad.: “The Loss of Reality in Neurosis and Psychosis”, C. P.,
2, 277; “A Perda da Realidade na Neurose e na Psicose”, Ed. Standard,
19.|
(1925d) |1924|) Selbstdarstellung, Viena, 1934. G. S., 11,
119; G. W., 14, 33.
|Trad.: An Autobiographical Study, Londres, 1935 (Autobiography,
Nova York, 1935); “Um Estudo Autobiográfico”, Ed. Standard, 20.|
(1926d) Hemmung, Symptom und Angst, Viena. G. S.., 11, 23;
G. W., 14, 113.
|Trad.: Inhibitions, Symptoms and Anxiety, Londres, 1960 (The
Problem of Anxiety, Nova York, 1936); Inibição, Sintoma e Angústia,
Ed. Standard, 20.|
(1926e) Die Frage der Laienanalyse, Viena. G. S., 11, 307;
G. W., 14, 209.
|Trad.: The Question of Lay Analysis, Londres, 1947; A Questão
da Análise Leiga, Ed. Standard, 20.|
(1926f)
Artigo na Encyclopaedia Britannica |publicado como “Psycho-Analysis:
Freudian School”|, Encyclopaedia Britannica, 13ª ed., Novo Vol. 3, 253,
“Psicanálise”, Ed. Standard, 20.|
|Texto
alemão: “Psycho-Analysis”, G. S., 12, 372; G. W., 14, 299.
Original alemão publicado pela primeira vez em 1934.|
(1927e)
“Fetischismus”, G. S., 11, 395; G. W., 14, 311.
|Trad.: “Fetishism”, C. P., 5, 198; “Fetichismo”, Ed. Standard,
21.|
(1930a) Das Unbehagen in der Kultur, Viena. G. S., 12, 29; G. W., 14, 421.
|Trad.:
Civilization and its Discontents, Londres e Nova York, 1930; O Mal Estar na Cultura, Ed. Standard, 21.|
(1931b) “Über die weibliche Sexualitaet”, G. S.,
12, 120; G. W., 14, 517.
|Trad.:
“Female Sexuality”, C. P. 5, 252; “Sexualidade Feminina”, Ed. Standard,
21.|
(1931e)
Carta ao Burgomestre de Príbor, G. S., 12, 414; G. W., 14, 561.
|Trad.: Ed. Standard, 21.|
(1937c) “Die endliche und die unendliche Analyse”, G. W., 16, 59.
|Trad.: “Analysis Terminable and Interminable”, C. P., 5, 316;
“Análise Terminável e Interminável”, Ed. Standard, 23.|
(1937d) “Konstruktionen in de Analyse”, G. W., 16, 43.
|Trad.: “Constructions in Analysis”, C. P., 5, 358, “Construções
em Análise”, E. Standard, 23.|
(1940d |1892|) Com BREUER, J., “Zur Theorie des hysterischen Anfalls”, G.
W., 17, 9.
|Trad.: “Ons the Theory of Hysterical Attacks”, C. P., 5, 27;
“Sobre a Teoria dos Ataques Histéricos”, Ed. Standard, 1.|
(1940e) |1938|) “Dei Ichspaltung im Abwehrovorgan”, G. W., 17,
59.
|Trad.: “Splitting of the Ego in the Process of Defence”, C. P.,
5, 372; “A Divisão do Ego no Processo de Defesa”, Ed. Standard, 23.|
(1941a) |1892|) Carta a Josef Breuer, G. W., 17, 5.
|Trad.: C. P., 5, 25; Ed. Standard, 1.|
(1941b |1892|) “Notiz ‘III’”, G. W., 17, 17.
|Trad.: “III”, C. P., 5, 31; Ed. Standard, 1.|
(1950a |1887-1902|) Aus den Anfaengen der Psychoanalyse, Londres.
Inclui “Entwurf einer Psychologie” (1895).
|Trad.: The Origins of Psycho-Analysis, Londres e Nova York,
1954. (Em parte, incluindo o
“Projeto para uma Psicologia Científica“, in Ed. Standard, 1.|
(1955a
|1907-8|) Relatório Original do Caso de Neurose Obsessiva (o “Homem dos Ratos”,
Ed. Standard, 10. Texto alemão não publicado.
(1956a |1886|) “Report on my Studies in Paris and Berlin, on a
Travelling Bursary Granted from the University Jubille Fund, 1885-6”, Int.
J. Psycho-Anal., 37, 2; “Relatório sobre meus Estudos em Paris e Berlim”,
Ed. Standard, 1. |Texto alemão (não publicado): “Bericht über
meine mit Universitaets-Jubilaeums Reisestipendium unternommene Studienreise
nach Paris und Berlin”.|
(1960a) Briefe 1873-1939 (org. E. L. Freud), Berlim.
|Trad.: Letters 1873-1939 (org. E. L. Freud) (trad. de T. e J.
Stern), Nova York, 1960; Londres, 1961.|
GÉLINEAU,
J. B. É. (1894) Des peurs maladives ou phobies, Paris.
HAMMOND, W. A. (1886) “Remarks on Cocaine and the so-called Cocaine
Habit”, J. nerv. ment. dis., 11, 754.
HECKER, E. (1893) “Über larvirte und abortive
Angstzustaende bei Neurasthenie”, Zbl. Nervenheilk, 16, 565.
HENRI,
V. e C. (1897) “Enquête sur les premiers souvenirs de l’enfance”, L’annés
psychologique, 3, 184.
ICONOGRAPHIE
DE LA SALPÊTRIÈRE, 3 (1879-80), Paris.
JANET,
PIERRE (1892-4) État mental des hystériques (2 vols.), Paris.
(1893)
“Quelquer définitions récentes de l’hystérie”, Arch. neurol., 25, 417, e
26, 1.
JONES, E. (1953) Sigmund Freud: Life and Work, Vol. 1,
Londres e Nova York.
(1955) Sigmund Freud: Life and Work, Vol. 2, Londres e Nova York.
KAAN, H. (1893) Der neurasthenische Angstaffekt bei
Zwangsvorstellungen und der primordiale Grübelzwang, Viena.
KASSOWITZ, M. (org.) (1890 etc.) Beitraege zur Kinderheilkunde,
Viena.
KRAFFT-EBING, R. VON (1867) Beitraege zur Erkennung und richtigen
forensischen Beurteilung krankhafter Gemütszustaende für Aerzte, Richter und
Verteidiger, Erlangen.
LOEWENFELD, L. (1893) Pathologie und Therapie der Neurasthenie und
Hysterie, Wiesbaden.
(1895) “Über die Verknüpfung neurasthenischer und hysterischer
Symptome in Anfallsform nebst Bemerkungen über die Freudsche Angstneurose”, Münchener
med. Wschr., 42, 282.
(1904) Die psychischen Zwangserscheinungen, Wiesbaden.
(1906) Sexualleben und Nervenleiden, 4ª ed., Wiesbaden.
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in den Cocablaettern, Goettingen.
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der Hysterie”, Berl. klin. Wschr., 27, 553.
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Neurasthenie des maennlichen Geschlechtes (Darmneurasthenie)”, Vortraege aus
des gesamten praktischen Heilkund, 1, Viena.
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ROSENBERG, L. (1893) Casuistische Beitrage zur Kenntnis der
cerebralen Kinderlaehmungen und der Epilepsie, Heft IV, Neue Folge de Beitraege
zur Kinderheilkunde, org. Kassowitz,
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LISTA DE ABREVIATURAS
G.S. = Freud, Gesammelte Schriften
(12 vols.), Viena, 1924-34.
G.W. = Freud, Gesammelte Werke (18 vols.),
Londres, a partir de 1940.
C.P. = Freud, Collected Papers (5 vols.),
Londres, 1924-50.
Ed. Standard = Freud, Edição Standard (24
vols.), Rio de Janeiro, a partir de 1970.
S.K.S.N. = Freud, Sammlung kleiner Schriften
zur Neurosenlehre (5 vols.),
Viena, 1906-22.
S.P.H.
= Freud, Selected Papers on Hysteria and
Other Psychoneuroses,
Nova York, 1909-20.