Leonardo Ferreira de Azevedo e Silva
Introdução
É função das INSTITUIÇÕES PSICANALÍTICAS proporcionar um espaço para produção, troca e divulgação do saber psicanalítico.
Sendo o objeto da psicanlálise essencialmente subjetivo,na medida em que lidamos com sonhos, sintomas, parapraxias, mitos, produções artísticas, sentimos a necessidade de ressaltar a importância do respeito à metodologia psicanalítica, na produção do saber psicanalítico, que assim pode ser denominado somente na medida em que sua produção obedeça à metodologia descrita por Freud.
Aplicando esta metodologia, Freud chegou aos fundamentos teóricos da psicanálise, sendo estes a existência da SEXUALIDADE INFANTIL, da TRANSFERÊNCIA, do INCONSCIENTE e da REPRESSÃO (1) , em um contexto de fixações, de desenvolvimento e regressões da energia da pulsão sexual (desenvolvimento da libido) investida em zonas erógenas e em representações afetivas (2)(3)
As conseqüências negativas para a teoria psicanalítica oriundas da especulação teórica colocada em primeiro plano (como ponto de partida para a tentativa de produção de um saber psicanalítico) já aparecem claramente nas dissensões de ADLER, JUNG e STEKEL, levando Freud a escrever o texto "A história do movimento psicanalítico" (1914) e posteriormente "Um estudo autobiográfico" (1925) (4), onde encontramos claramente expostos os fundamentos da psicanálise e a metodologia a ser aplicada para a produção do saber psicanalítico.
Cabe ressaltar que tanto Freud quanto Jung e Adler não foram analisados, bem como Stenkel o foi precariamente; tal observação é importante na apreensão dos "pontos cegos" das teorias surgidas; entretanto, é o desprezo pela metodologia psicanalítica que leva Adler, Jung e Stenkel a criarem teorias tão radicalmente diferentes e sem fundamento na experiência da análise. Por estar lidando com conteúdos subjetivos, Freud continuou aplicando seu método na construção da teoria psicanalítica, sendo a experiência da análise o instrumento básico que norteia a produção do saber psicanalítico.
Observamos que na programação das Instituições PSICANALÍTICAS, em média, pelo menos 160 textos de Freud são omitidos da mesma, sem contar as cartas a Fliess, Abraham, Ferenczi, Jung e outros; ao mesmo tempo, devido à pressão imediatista, sempre presente, outros autores como Lacan, Winnicott, Melanie Klein, são superficial e precocemente citados ("estudados"), muitas vezes mesmo ocupando um lugar privilegiado nas atividades científicas das Instituições, sem que os textos do criador da psicanálise sejam pelo menos programados para que os membros das Instituições tenham a oportunidade de estudá-los em conjunto.
O material obtido através da aplicação da técnica psicanalítica (que é fundamentalmente baseada no reconhecimento e no trabalho da transferência, bem como no uso de interpretações que acompanham o processo transferencial (1)(5)(6) é que permite ao teórico da psicanálise formular suas teorias, tal como o fizeram Freud, Abraham, Ferenczi, M.Klein, Winnicott, Bion, autores que, por sinal, não só confirmaram muitos dos achados clínicos de Freud, bem como trouxeram novas contribuições obtidas a partir da aplicação do método psicanalítico de produção teórica.
Deste modo, quando falamos em "fase oral sádica" e "fase anal expulsiva", estamos também reportados aos achados de K. Abraham na análise de pacientes maníaco-depressivos, nos períodos entre as crises de mania e depressão (7); ao falarmos de "posição esquizo-paranóide" e "posição depressiva" somos levados a relembrar o material obtido por M.Klein na análise de crianças e na observação de lactentes(8), quando usamos o termo "técnica ativa", nos vem à memória o relato das situações de análise em que S. Ferenczi sentiu a necessidade de usar este recurso, temporariamente,para se contrapor com mais eficácia à resistência à análise que se tornara proeminente(9); ao falarmos em "fenômenos transacionais" temos associado em nossa memória o fato de bebês e crianças pequenas elegerem "objetos de estimação" que funcionam psiquicamente como uma extensão do "si mesmo" da criança (10); quando citamos os ataques ao vínculo descritos por Bion na terapia de pacientes psicóticos, nos lembramos dos inúmeros exemplos fornecidos pelo autor, em que os mesmos ocorreram nas sessões de análise que antecederam, de muito, a formulação do conceito (11).
Uma questão de método
Entretanto, quando pensamos em "foraclusão do significante nome do pai"(12) somos levados a uma "leitura de Freud" que afirma ter o mesmo distinguido o termo "Verwerfung" do termo "Verleugnung", em seus escritos; e que "Verwerfung" deve ser traduzido por rejeição, repúdio, foraclusão do significante primordial, articulador de toda a cadeia de significantes e condição sine qua non de "acesso ao simbólico"(12). Desta forma onde, em Freud, se lê "as auto-acusações projetadas para o exterior retornam sob a forma de alucinações auditivas"(13) agora deve-se ler "aquilo que foi foracluído do simbólico retorna do real" (12).
Tais afirmativas seriam apenas um jogo de palavras, se não fossem tomadas como motivo para profundas modificações na abodagem dos pacientes psicóticos, os quais agora teriam uma "estrutura psicótica" que os condena a serem não portadores do significante primordial, a apresentarem um "buraco na cadeia de significantes", que os condena a poderem receber apenas "remendos nesta tecitura" estando vedado aos mesmos o "acesso ao simbólico".
Estas especulações são feitas a partir das formulações de S.Freud(13)(3) e precedem (funcionando como "a priori)a abordagem dos pacientes, introduzindo no psiquismo do analista uma expectativa de experiência com estes pacientes que se alicerça em uma interpretação do teorizador a respeito do que S.Freud teorizou para tentar explicar os sintomas psicóticos, em alguns de seus escritos (14) (15). Não há o respaldo da experiência clínica na formulação dos conceitos acima referidos, o que indica, em termos da teoria psicanalítica, a aplicação de método especulativo àquilo que deveria ser formulado teoricamente a partir da experiência clínica; há, aqui, portanto, uma burla da metodologia psicanalítica; a simples "leitura de Freud" carece de subsídios para modificar a teoria psicanalítica; estamos então diante de outra teoria, formulada a partir de outros critérios metodológicos e tal como a "Psicologia Individual" de Adler e a "Psicologia Analitica" de Jung, " não deve ser denominada psicanálise (1).
A leitura de outros textos de Freud (16)(17) (18)(19) (20)(21) (22)(23), nos leva, de saída a questionar profundamente a formulação:
"Verwerfung=
foraclusão,
Verleugnung= recusa de castração"
na medida em que, à
luz dos ensinamentos metapsicológicos de 1915(3) (24)não há
distinção entre a "retirada de catexia da representação da coisa",
que ocorre nas situações denominadas "Verleugnung" e
"Verwerfung". Ambas implicam em perda de realidade (25) (21),
sendo a distinção melhor compreendida pelo grau de cisão do ego
decorrente da atuação da defesa (26) (25) (21), e pelos
destinos do objeto na relação com o ego.Verleugnung= recusa de castração"
O que está acontecendo?
Uma interpretação da teoria psicanalítica leva a formulações teóricas que se contrapõem a inúmeras formulações teóricas da psicanálise (desenvolvimento da libido, regressões, fixações; representante afetivo da pulsão; sentimento inconsciente de culpa; retirada da catexia da representação de coisa; sexualidade infantil;...). Uma "estrutua psicótica", além disso, não explica a enorme variedade de situações envolvendo a presença de sintomas psicóticos (psicoses histéricas, psicoses psicogênicas, reações paranóides agudas, "delirium", psicoses por drogas, "borderlines", psicose esquizo-afetiva, "remissões espontâneas" em 25% dos casos de esquizofrênia, paranóia e etc. cuja existência parece apontar muito mais para uma alternância de funcionamento do simbólico(12); não funcionando no "simbólico", o que implicaria no investimento/desinvestimento (16) (3) do "significante nome do pai", processo este regido pelo fator econômico da pressão pulsional potencialmente geradora de desprazer versus capacidade de defesa do ego (23) e não, como quer fazer crer Lacan, em suas especulações (12), pela foraclusão deste significante, implicando em um "buraco" na cadeia de significantes. Portanto, a ausência do "significante primordial" , "não é compatível com o que o material clínico nos mostra"; já o "desenvolvimento da representação da coisa" (3) (27) parece melhor explicar as situações clínicas acima citadas, bem como o fato de que os pacientes psicóticos (de Bion (11), Rosenfeld (28), Winnicott (29), Ferenczi (30), Rosen (31), Sullivan (32), Fromm-Reichmann (33), Sechehaye (35) (36) e outros), em que a produção de sintomas cessou após o trabalho terapêutico, tenham voltado a um funcionamento "no simbólico". Parece evidente que a questão central é o investimento/desinvestimento das representações de coisas (3) (27) e não a presença/ausência do "significante primordial". Deste modo, "o significante nome do pai" catexizado proporcionaria o "acesso ao simbólico" e descatexizado, a produção dos sintomas psicóticos. A metapsicologia da "foraclusão" seria o desinvestimento do registro presente e não a ausência do registro. Caso ocorra o re-investimento (como nas vivências terapêuticas acima citadas) temos a cessação da produção psicótica em vigília.
Falamos "produção psicótica em vigília" para lembrar a natureza psicótica da produção onírica (essencialmente é uma produção alucinatória); "o sonho é a psicose fisiológica do homem normal". Tais produções psicóticas que ocorrem a cada 24 horas(pelo menos) são decorrentes, segundo Freud (38) (27), de desinvestimentos da defesa do ego derivados do estado do sono. Portanto, a cada noite, perderíamos a capacidade de "funcionamento no simbólico" , ficando a questão reportada ao sono-vigília e não à presença/ausência do "significante nome do pai". A capacidade de recatexização das defesas do ego ao acordarmos nos daria a certeza de que sonhamos (o que pode não ser tão certo assim diante de determinados sonhos "intensos"). Novamente, as explicações de Freud (3) (27) (24) e o farto material clínico da psicanálise apontam para uma questão econômica, de grau de pressão pulsional versus capacidade de defesa do ego, para um conflito ego versus mundo exterior (23) que exige a retirada da catexia da representação da coisa (3) (27) como única defesa possível e, não, a ausência, "o buraco na cadeia de significantes". A verdadeira causa da produção de sintomas psicóticos seria a pressão pulsional relativamente muito intensa; tal situação decorreria de um despreparo afetivo para lidar com o mundo exterior (10) (35) e não de uma incapacidade gerada pela falta de um "significante básico". O problema estaria essencialmente na relação com o mundo exterior (10) e não na deficiência do indivíduo com "significante nome do pai foracluído". Sendo assim, o trabalho de, por exemplo, Sechehaye (35) (36), obteve resultados terapêuticos por ter sido efetuado ao nível adequado da demanda terapêutica, estabelecendo um setting onde a paciente pôde, através da relação com a terapeuta, desenvolver seus mecanismos de defesa a ponto de poder deixar de efetuar "a retirada do investimento nas representações de coisa", mantendo-as cataxizadas no inconsciente e ligando seu ego ao mundo exterior.
O que ocorreu, então? Um trabalho terapêutico que proporcionou à paciente uma dinâmica tal que a permitiu lidar com "o outro" sem fragmentar o seu ego; essencialmente um trabalho a nível da qualidade do vínculo afetivo, daquele modo de vincular-se afetivamente que dá estrutura para a criança desenvolver-se enquanto sujeito; o material clínico obtido mostra a importância fundamental da qualidade da relação afetiva mãe/criança como base para o funcionamento dentro do princípio da realidade.Mostra também que a perda deste funcionamento é reversível, desde que, através do modo de relacionamento adequado às circunstâncias, o paciente psicótico possa ter a oportunidade de vivenciar experiências, antes de tudo afetivas, que permitam a unificação do seu ego, fragmentado em decorrência da impossibilidade de vincular-se aos objetos do mundo exterior.
Depreende-se também que, se existia uma "estrutura psicótica", esta "estrutura" é passível de modificações profundas decorrentes da dinâmica do processo terapêutico vivenciado a nível de relacionamento interpessoal. Podemos mesmo dizer que se esta dinâmica interpessoal é capaz de dar condições ao analisando de encontrar-se dentro desta relação, outras dinâmicas interpessoais seriam também capazes de ter gerado as condições para a produção dos sintomas psicóticos. A foraclusão, a estrutura psicótica são então meros epifenômenos de algo, este sim, decisivo, importante:a qualidade afetiva do relacionamento do bebê com a mãe, suporte da capacidade de aceitação do mundo exterior, da realidade da castração.
Mas por que toda esta digressão? Uma questão de método... Parece claro que o método psicanalítico, (que consiste em teorizar a partir do material obtido através da prática psicanalítica, mudando-se a teoria quando não mais dá conta da explicação dos fatos que se repetem na prática psicanalítica) precisa ser utilizado rigorosamente para que possamos trabalhar realmente com conceitos psicanalíticos.
Um outro exemplo marcante de tentativa de produção do saber (dito psicanalítico, na medida em que não foi aplicado o método psicanalítico de obtenção de novos achados teóricos em psicanálise) é encontrado também na afirmativa de Lacan de que "os afetos são conscientes e portanto secundários para o psicanalista" (12).
Seguindo a metodologia psicanalítica, Freud constatou,em todas as análises, a atuação de um "sentimento inconsciente de culpa" (39); ao iniciar a formulação da sua metapsicologia, atentou para o fato de que, a rigor, os afetos deveriam ser conscientes, mas... havia o "sentimento inconsciente de culpa" (3). Tal questão é deixada em suspenso, fazendo parte do inacabamento do saber psicanalítico, sendo o "sentimento de culpa inconsciente" um dos principais achados oriundos da aplicação da técnica psicanalítica; se o negamos, estamos negando todo o trabalho feito até então e menosprezando a atuação de algo extremamente importante, capaz de "fazer fracassar quem triunfa", "produzir atos de delinqüencia", "criar a reação terapêutica negativa" (40) (41), ao desvalorizarmos o "representante afetivo da pulsão" também abrimos mão do trabalho a nível do mais importante e decisivo fato psíquico que, junto com o representante ideativo,nos dá alguma luz a respeito dos diretamente inacessíveis movimentos pulsionais (3).
Além disso o representante afetivo da pulsão está visceralmente ligado aos fatores econômico/dinâmico dos processos psíquicos, que são decisivos; são a razão da existência dos mecanismos de defesa, da angústia, dos sintomas, do desenvolviemnto e da regressão da libido; o vínculo com o objeto, a transferência, a contra-transferência, a possibilidade de análise, dependem do trabalho a nível do reconhecimento e da adequada atuação do psicanalista em relação às manifestações afetivas do analisando; é o "despertar dos sentimentos" o signo indelével da progressão na análise (17); é a descarga afetiva a condição essencial para o desaparecimento do sintoma (42).
O trabalho psicanalítico encontrou, inconscientes para a maioria de nós, "complexos de idéias carregados de afeto"; o motivo para esta inconsciência a respeito destes complexos é que, se fossem conscientizados, provocariam desprazer; "evitar o desprazer é o motivo da repressão"; a libido retida é a força do sintoma; quando é possível a descarga afetiva, os sintomas desaparecem (42) (43) (44).
Por que "Obras completas de Sigmund Freud"?
Para se modificar, por exemplo, um conceito como "complexos inconscientes carregados de afeto" seria preciso que, da prática psicanalítica, surgissem fatos que nos autorizassem, por exemplo, a afirmar que não existem afetos inconscientes e que, por exemplo, este fator afetivo é menos importante na determinação dos sintomas do que outros fatores envolvidos. Se as mesmas assertivas fossem formuladas especulativamente careceriam de base metodológica, histórica e conceitual, em relação à atividade psicanalítica. Muito menos, então, esta atividade poderia ser previamente modificada pela inserção destes "novos conceitos". Na realidade, então, a rigor, não são conceitos psicanalíticos, na medida em que não foram desenvolvidos segundo a metodologia psicanalítica.
Estaríamos diante de uma maneira individual de ler Freud, maneira esta que inclusive esquece o essencial de sua leitura que é colocar os desenvolvimentos teóricos presentes nos textos como um saber inacabado, passível de modificações, secundário em relação à prática psicanalítica e subordinado aos achados da mesma.
Conhecemos um autor pelo conjunto de suas obras e não por interpretações entrecortadas e distorcidas de trechos de seus escritos. Em se tratando de psicanálise, torna-se realmente inconcebível que as Instituições Psicanalíticas releguem ao ostracismo, à leitura individual, pelo menos 160 (cento e sessenta) textos de Freud, que utilizam referenciais teóricos oriundos de outros campos do conhecimento como a Lingüística e a Filosofia, com a finalidade de colocar a Psicanálise em uma "camisa de força" racionalista e especulativa, desvirtuadora da essência das descobertas psicanalíticas, de que a teoria se subordina à prática.
Iniciamos, em 1992, no Círculo Brasileiro de Psicanálise- Seção Rio de Janeiro, um grupo de estudos institucional, cujo objetivo é a criação de espaços para a leitura, discussão e elaboração daqueles textos de Freud ausentes no programa da parte teórica da Formação Psicanalítica; e também as Cartas a Fliess, Abraham, Ferenczi, Jung e outros.
Nesta experiência, chamou-nos a atenção o desinteresse da maioria dos membros do CBP-RJ em relação a esta atividade, a nosso ver um "sinal dos tempos", decorrente do processo de distorção e desqualificação que visa atingir os importantíssimos, claros e indubitavelmente consistentes textos de Freud que têm sido usados como material para a criação de especulações cuja principal finalidade parece ser a de colocar Freud e sua SEXUALIDADE INFANTIL como algo ultrapassado e primário, em relação à "corrente de erudição e cultura" que especula com os conceitos psicanalíticos. Até novos fundamentos da psicanálise "são criados" a partir da especulação, como se na mudança dos fundamentos não se mudasse também a psicanálise,...deixando portanto de ser psicanálise.
Às vezes ouvimos referências a Freud que lembram aquelas que o "Homo Sapiens" faz ao "Australopitecus", como se os conceitos arduamente elaborados a partir de farto material de análise pudessem ser quase que totalmente substituídos por outros, oriundos da especulação intelectual, que se apóiam naqueles, usando-os para a veiculação de abordagens, técnicas e procedimentos terapêuticos que modificam radicalmente os fundamentos da psicanálise, a começar pela metodologia utilizada para a elaboração destes conceitos especulativos que dão suporte a estes procedimentos, na prática.
Nosso grupo de estudos conta com sete membros e, a cada atividade, vamos nos tornando mais convencidos da importância deste trabalho de conscientização das origens e fundamentos da psicanálise, através das palavras do seu criador, Sigmund Freud.
A história mostra que os gênios da humanidade, aqueles que descobrem, produzem, criam e percebem aquilo que se torna parte inarredável do patrimônio cultural da mesma, os gênios, não aparecem "a cada instante". Sua presença é esparsa, infreqüente, mas suas contribuições se caracterizam pela coerência e consistência, oriundas dos fundamentos sólidos que norteiam seu trabalho.
Tudo isso e muito mais, sem dúvida, encontramos no trabalho de Sigmund Freud; o valor de seus escritos é muito maior do que fazem parecer os teóricos que "lêem Freud". Nestes escritos também se encontra a descrição da natureza desta linha especulativa (1); serve à resistência à psicanálise. É preciso colocar a sexualidade infantil em segundo plano, quem sabe tentar soterrá-la novamente.
O conjunto dos textos de Freud remete o leitor para os relacionamentos interpessoais; "o superego vem se desenvolvendo a partir da internalização das restrições oriundas do mundos exterior (39).
O motivo da defesa é a angustia (24); qualquer tratamento de sintomas neuróticos só obtém resultado através da diminuição da angústia, obtida através da experiência analítica geradora de maneira mais eficaz de se lidar com os sentimentos e emoções despertados na infância, na vivência dos complexos de Édipo e de castração. A força psíquica de tais complexos é função da interação entre fantasmas filogeneticamente herdados e imagens carregadas de afeto provenientes do relacionamento da criança com os pais. A ignorância e a inércia psíquica que mantém "pontos cegos" nos pais e educadores tem papel preponderante na geração do valor psíquico destes fantasmas/recordações infantis inconscientes (2) (45). A ativação destes fantasmas, obtida desta maneira, força a atuação da defesa do ego que se caracterizam por desinvestimentos das representações de palavra e contra-investimentos, gerando sintomas neuróticos e/ou por desinvestimentos nas representações de coisa do sistema inconsciente, gerando sintomas psicóticos ou perversos (3) (25). A distinção entre as psicoses e as perversões pode ser feita através do grau de cisão do ego (26) (23); desta forma as perversões são "psicoses abortadas" (9) e o perverso de caráter atua para lesar o objeto.
A leitura dos textos "esquecidos" de Freud nos traz uma visão bem clara do pensamento do criador da psicanálise a respeito de determinados assuntos.
"A psicanálise... procedimento terapêutico para o tratamento de certas doenças nervosas que foram denominadas "funcionais" e consideradas, com crescente certeza, como consequências de distúrbios na vida emocional".
"O desfecho alternativo- das disposições inúteis da criança, conduzindo, não a substitutos sob a forma de sintomas, mas a perversões diretas de caráter- é quase inacessível à terapêutica e, geralmente, fora da influência do educador. A educação constitui uma profilaxia, que se destina a prevenir ambos os resultados- tanto a neurose quanto a perversão; a psicoterapia procura desfazer o menos estável dos dois resultados e instituir uma espécie de pós-educação".
"A maioria dos médicos não se acha preparada para exercer a psicanálise e fracassou completamente em aprender o valor deste procedimento terapêutico".
"O educador... tem de observar perante si mesmo a obrigação de não moldar a jovem mente de acordo com suas próprias idéias pessoais, mas, antes, segundo as disposições e possibilidades do educando" (46).
Conclusão
Acreditamos que as citações do texto de Freud "INTRODUÇÃO A THE PSYCHO-ANALYTIC METHOD", de PFISTER (1913)(46) possam dizer, por si mesmas, aquilo que tentamos mostrar neste trabalho.
NOTAS
1-FREUD,S. A História do Movimento Psicanalítico (1914)
2-FREUD,S. Três Ensaios para uma Teoria Sexual (1905)
3-FREUD,S. O Inconsciente (1915)
4-FREUD,S. Estudo Autobiográfico (1925)
5-FREUD,S. A Dinâmica da Transferência (1912)
6-FREUD,S. Psicanálise Silvestre (1911)
7-ABRAHAM, K.- Teoria da libido
8-KLEIN, M.- Psicanálise da Criança
9-FERENCZI, S.- Escritos Psicanalíticos (1909-1933)
10-WINNICOTT,D.W.- O Brincar e a Realidade
11-BION, W.- Volviendo a Pensar
12-LACAN,J.- Livro 3- As Psicose
13-FREUD, S.- Um Caso de Paranóia (domentia Paranóides) Autobiograficamente Descrito
14-FREUD,S.- História de uma Neurose Infantil (1918) (1914)
15-FREUD,S.- Novas Observações sobre as Neuropsicoses de Defesa
16-FREUD,S.- As Neuropsicoses de Defesa (1984)
17-FREUD,S.- Os Delírios e os Sonhos na Gradiva de W.Jensen (1907)
18-FREUD, S.- Introdução ao Narcisismo (1914)
19-FREUD, S.- O ego e o Id (1923)
20-FREUD,S.- Dois Verbetes de Enciclopéida (1922)
21-FREUD,S.- A Perda da Realidade na Neurose e na Psicose (1923)
22-FREUD,S.- Esquema del Psicoanalisis (1923)
23-FREUD, S.- Neurose e Psicose (1923)
24-FREUD, S.- A Repressão (1915)
25-FREUD, S.- Sobre o Fetichismo (1927)
26-FREUD, S.- A Cisão do Ego no Processo de Defesa (1937)
27-FREUD, S.- Suplemento Metapsicológico à Teoria dos Sonhos (1915)
28-ROSENFELD, H.A.- Estados Psicóticos
29-WINICOTT, D.W.- Da Pediatria à Psicanálise
30-FERENCZI, S.- Diário Clínico
31-ROSEN, J.- Le Analyse Directe
32-SULLIVAN,H.S.- Schizophrenia as a Human Process
33-FROMM- REICHMANN, F.- Princípios de Psicoterapia Intensiva
35-SECHEHAYE,M.A.- Simbolic Realization a new method of Psycoterapy applied to a case of Schizophrenia
36-SECHEHAYE,M.A.- Memórias de uma Esquizofrênica
38-FREUD, S.- A Interpretação dos Sonhos (1900)
39-FREUD, S.- O mal-Estar na Civilização (1930)
40-FREUD, S.- Alguns Tipos de Caráter Encontrados na Prática Psicanalítica (1917)
41-FREUD,S.Para Além do Princípio do Prazer (1920)
42-FREUD, S.- Estudos sobre a Histeria (1895)
43-FREUD, S.- Comunicação Preliminar (1893)
44-FREUD,S.- A Etiologia da Histeria (1896)
45-FREUD, S.- A dissolução do Complexo de Édipo
46-FREUD,S.- Introdução a the Psychoanalytic Method de Pfister (1913) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1-FREUD, S.- A História do Movimento Psicanalítico (1914). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
2-FREUD, S- Três Ensaios para uma Teoria Sexual (1905) Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
3-FREUD, S.- O Inconsciente (1915) Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro, 1987
4-FREUD, S.- Um Estudo Autobiográfico (1925). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
5-FREUD, S.- A Dinâmica da Transferência (1912). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
6-FREUD, S.- Psicanálise Silvestre (1911). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
7-ABRAHAM, K.- Teoria da libido
8-KEIN, M.- Psicanálise da Criança. Mestre Jou, São Paulo, 1981
9-FERENCZI, S.- Escritos Psicanalíticos (1909-1933). Livraria Taurus, Rio de Janeiro
10-WINNICOTT,D.W.- O Brincar e a Realidade. Imago, Rio de Janeiro
11-BION, W.- Volviendo a Pensar. Hormé, Segunda Edição, Buenos Aires, 1977
12-LACAN,J.- Livro 3- As Psicoses. Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1985
13-FREUD, S.- Um Caso de Paranóia (domentia Paranóides) Autobiograficamente Descrito. Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
14-FREUD,S.- História de uma Neurose Infantil (1918) (1914). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
15-FREUD,S.- Novas Observações sobre as Neuropsicoses de Defesa.Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
16-FREUD,S.- As Neuropsicoses de Defesa (1984). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
17-FREUD,S.- Os Delírios e os Sonhos na Gradiva de W.Jensen (1907). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
18-FREUD, S.- Introdução ao Narcisismo (1914). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
19-FREUD, S.- O ego e o Id (1923). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
20-FREUD,S.- Dois Verbetes de Enciclopéida (1922). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
21-FREUD,S.- A Perda da Realidade na Neurose e na Psicose (1923). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
22-FREUD,S.- Esquema del Psicoanalisis (1923).Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
23-FREUD, S.- Neurose e Psicose (1923). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
24-FREUD, S.- A Repressão (1915). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
25-FREUD, S.- Sobre o Fetichismo (1927). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
26-FREUD, S.- A Cisão do Ego no Processo de Defesa (1937). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
27-FREUD, S.- Suplemento Metapsicológico à Teoria dos Sonhos (1915). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
28-ROSENFELD, H.A.- Estados Psicóticos. Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1987
29-WINICOTT, D.W.- Da Pediatria à Psicanálise. Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1978
30-FERENCZI, S.- Diário Clínico. Martins Fontes, São Paulo, 1990
31-ROSEN, J.- Le Analyse Directe. Presses Universitaires de France, Paris, 1960
32-SULLIVAN,H.S.- Schizophrenia as a Human Process. W.W. Norton & Company Inc. First Edition, 1962
33-FROMM- REICHMANN, F.- Princípios de Psicoterapia Intensiva. Ediciones Hormé, Buenos Aires, 1980
34-FROMM- REICHMANN, F.- Princípios de Psicoterapia Intensiva. Ediciones Hormé, Buenos Aires, 1980
35-SECHEHAYE,M.A.- Simbolic Realization a new method of Psycoterapy applied to a case of Schizophrenia. Int Univ Press, New York, 1951
36-SECHEHAYE,M.A.- Memórias de uma Esquizofrênica. Editora Nova Fronteira SA , Rio de Janeiro
37-FREUD, S.- Esboço de Psicanálise (1938). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
38-FREUD, S.- A Interpretação dos Sonhos (1900). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
39-FREUD, S.- O mal-Estar na Civilização (1930). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
40-FREUD, S.- Alguns Tipos de Caráter Encontrados na Prática Psicanalítica (1917). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
41-FREUD,S.Para Além do Princípio do Prazer (1920). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
42-FREUD, S.- Estudos sobre a Histeria (1895). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
43-FREUD, S.- Comunicação Preliminar (1893). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
44-FREUD,S.- A Etiologia da Histeria (1896). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
45-FREUD, S.- A dissolução do Complexo de Édipo. Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
46-FREUD,S.- Introdução a the Psychoanalytic Method de Pfister (1913). Obras Completas, Imago, Segunda Edição, Rio de Janeiro,1987
Publicado na REVISTA DO CBP/RJ, N.1, 93/94
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