Borderline - Transtorno de Personalidade

Viviane de Lourdes Morelato Minto


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TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE:
Um olhar sob a perspectiva do desenvolvimento na
Psicologia Analítica

MONOGRAFIA DO CURSO DE FORMAÇÃO – SBPA VIII TURMA

Orientador: Álvaro Ancona de Faria
Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica - São Paulo
2012
Viviane de Lourdes Morelato Minto
TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE:
Um olhar sob a perspectiva do desenvolvimento na
Psicologia Analítica

Monografia submetida à
aprovação para a conclusão do
Curso de Formação de
Analistas da Sociedade
Brasileira de Psicologia
Analítica (SBPA).
Orientador: Álvaro Ancona de Faria
São Paulo
2012


Viviane de Lourdes Morelato Minto



TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE:
Um olhar sob a perspectiva do desenvolvimento na
Psicologia Analitica

Monografia submetida à
aprovação para a conclusão do
Curso de Formação de
Analistas da Sociedade
Brasileira de Psicologia
Analítica (SBPA).
BANCA EXAMINADORA:
Alvaro Ancona de Faria (orientador) ___________________
Teresa Cristina Machado: ___________________________
Maria Paula Magalhães de Oliveira:____________________


À Edson Luiz e Ariadne, meus
amados filhos.
Ao querido amigo Valentim.

AGRADECIMENTOS
Ao professor Álvaro Ancona Faria, que despertou em mim a paixão
pelos pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline e abriu espaços
para que eu pudesse trabalhar com eles, enriquecendo meus conhecimentos e
minha prática na área. Gostaria de agradecer-lhe também pelo carinho e
dedicação que me dispensou, orientando-me tanto na elaboração da
monografia como também em meu caminhar pessoal e profissional durante o
período de minha formação de analista.
À SBPA (Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica), por ter me
aceito, encorajando-me e apoiando-me em uma nova trajetória em busca de
novos caminhos e sentidos pessoais e profissionais.
À Tereza Cristina Machado, minha supervisora, incentivadora e grande
auxiliar nas pesquisas bibliográficas, mostrando-me novos caminhos de leitura
e aprofundamentos na área de desenvolvimento na Psicologia Analítica
Aos participantes e coordenadores do Núcleo de Aprimoramento da
Clinica: Integração Psiquiatria, Psicologia Analítica e Neurociências da SBPA,
pelo acompanhamento e auxílio nessas pesquisas, leitura e discussões.
Aos professores e supervisores que me acompanharam no processo
de formação. Cada um de sua forma deixou sua marca em meu trajeto, e a
toda equipe de apoio da SBPA, Mirian, Luciana, Marcos, Jorge, por estarem
sempre disponíveis, tornando minha estadia em São Paulo mais tranquila e
acolhedora.
Aos amigos e companheiros da oitava turma pela amizade, apoio,
reflexões e encontros determinantes de grandes transformações durante essa
convivência tão calorosa e profunda que foi nosso processo de formação.
Ao grupo de profissionais e funcionários do PROVE (Programa de
Pesquisa e Assistência em Violência) na UNIFESP (Universidade Federal do
Estado de São Paulo), por terem me dado a oportunidade de poder atender os
pacientes com transtorno de personalidade Borderline e de participar de suas
reuniões clínicas e de supervisões, espaço que foi de grande aprendizagem
para mim. E especificamente ao grupo de estudo e atendimentos dos pacientes
Borderline pelas amizades, trocas, apoio, debates, supervisões e estudos, sem 
os quais seria quase impossível eu ter me aprofundado e adquirido tantos
conhecimentos sobre esse tema.
Ao amigo Joel Sales Giglio, por me impulsionar, estimulando-me a
desbravar novos caminhos na Psicologia Analítica ao participar do processo
seletivo da SBPA.
À Sonia Carvalho, minha terapeuta, que foi meu grande amparo desde
o início desta minha jornada, que com seu acolhimento e carinho me guiou
pelos caminhos do inconsciente, ajudando-me a empreender grandes
travessias e muitas transformações.
À Cintia Travassos, pela paciência, cumplicidade, amizade e estímulo
durante meu percurso em busca de novos conhecimentos.
À Grande amiga Claudia Denardi, pela ajuda na confecção e estrutura
da monografia, pelo incentivo e acompanhamento, pelas correções, reflexões e
grandes divagações durante muitas tardes de trabalho árduo, mas recheadas
de muitos momentos leves, alegres e divertidos.
À Ana Cecília, amiga de grandes momentos, pela disponibilidade de,
no meio de muito trabalho, fazer uma parada especial para fazer a revisão final
deste trabalho.
Aos meus filhos Edson Luiz e Ariadne, por terem me incentivado a
buscar novos caminhos, a não desistir frente aos obstáculos e a persistir na
busca de meus sonhos, por mais distantes que muitas vezes parecessem.
Ao grande e querido amigo Valentim, por ter me dado abrigo e apoio.
Por ter me estimulado a seguir os sinais que surgiam em meu caminho e
persistir na trajetória durante os momentos em que acreditava não ter estrutura
para superar as dificuldades que surgiam.
E ao Airton Cesar Minto, por muitas vezes ter tido que abdicar de seus
próprios compromissos para dar assistência e cobrir minhas ausências junto a
nossos queridos filhos.
A todos os amigos que entraram, ficaram ou cruzaram meu caminho e
deixaram suas marcas durante todo esse processo de formação e
transformação.


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RESUMO
Esta monografia tem como objetivo analisar o Transtorno de Personalidade
Borderline dentro da perspectiva do desenvolvimento na Psicologia
Analítica. Baseia-se teoricamente nos conceitos de autores
pós-junguianos desenvolvimentistas, além de conceitos da Teoria do Apego.
Propõe-se também a refletir sobre as causas, sintomas e
tratamento para essa patologia dentro do setting terapêutico e a importância
do papel do analista, através da análise das particularidades da relação
analista-analisando nesse contexto.
Palavras chaves: Transtorno de Personalidade Bordeline, Psicologia Analitica,
desenvolvimento, relação analista-analisando

ABSTRACT
The objective of this paper is to analyse the Borderline Personality Disorder
from the perspective of the development in Analytical Psychology. It is
theoretically based on the concepts of post-Jungian developmentalist authors
and also on the concepts of the Attachment Theory.
It also proposes a reflection on the causes, symptoms and treatment for this
pathology within the therapeutic setting and the importance of the analyst's role,
through the analysis of the particularities of the relationship between the analistanalysand
in this context.
Keywords: Borderline Personality Disorder, Analytical Psychology,
Development, analyst-analysand relationship


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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1. O BORDERLINE E O MOMENTO ATUAL 01
2. DESCRIÇÕES PSIQUIÁTRICAS
2.1. Psicopatologia 03
2.2. Transtornos de Personalidade 04
2.3. Transtorno de Personalidade Borderline 07
2.4. Trauma e Desenvolvimento de Transtorno de Personalidade
Borderline 10
3. PSICOLOGIA ANALÍTICA E O BORDERLINE
3.1. Desenvolvimento da personalidade 13
3.2. Função Simbólica/Função Transcendente 25
3.3. Função Simbólica/Função Transcendente nos Pacientes
 Borderline 32
4. A TERAPIA COM PACIENTES BORDERLINE
4.1. Peculiaridades do setting terapêutico com Pacientes
 Borderline 36
4.2. Teoria do Apego no trabalho terapêutico 45
4.3. Experiência prática 50
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 63
6. BIBLIOGRAFIA 67


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INTRODUÇÃO
“Minha vida é a história de um inconsciente que se realizou. Tudo o
que nele repousa aspira a tornar-se acontecimento, e a personalidade, por seu
lado, quer evoluir a partir de suas condições inconscientes e experimentar-se
como totalidade.”
C. G. Jung
Na busca por um novo caminho, um novo sentido de vida,
deparei-me com a Filosofia e com Carl Gustav Jung, autor que, em sua
trajetória, colocou-se como meta: busca de caminhos e passos para desvendar
o espírito humano, compreendê-lo e tratá-lo profundamente.
Com o espírito apaixonado e sedento de respostas e sentidos
mais profundos e menos estigmatizados, reducionistas e, muitas vezes, tão
superficiais e impessoais, embrenhei-me com o corpo e a alma nessa
caminhada.
O caminho foi se desvendando arduamente entre muitos
espinhos, flores, paixões e desencantos, mas houve sempre um fio condutor a
me guiar. Esse fio foi sendo tecido sem que no momento pudesse visualizar
seus objetivos, sua direção, mas ficava sempre uma certeza, a pergunta do
“por quê?” e “para quê?”
Jung descreveu claramente a angústia de trilhar esses caminhos
de encontros e desencontros:
 “Vivia numa tensão extrema e muitas vezes tinha a
impressão de que blocos gigantescos desabavam sobre
mim /.../ Resistir a tudo isso foi uma questão de força
brutal. Outros nisso sucumbiram. Nietzsche, Hoelderlin e
muitos outros. Mas havia em mim uma força demoníaca e
desde o início tencionava a encontrar o sentido daquilo que
vivera nessas fantasias. O sentimento de obedecer a uma
vontade superior era inquebrantável e sua presença
constante em mim ajudou-me a resistir aos assaltos do
inconsciente, orientando-me no cumprimento da tarefa.”
(JUNG, 1985)
Com esse “sentimento de obedecer a uma vontade superior”,
aceitei a conspiração do universo e do inconsciente e deparei-me com um
chamado muito forte a participar do processo seletivo da SBPA (Sociedade
Brasileira de Psicologia Analítica) para formação de analista, sendo aceita para
a primeira turma de “Formação de analistas junguianos não residentes na
região de São Paulo e Rio de Janeiro”. A questão instigante continuava: Por
quê? E para quê?
O questionamento sobre o sentido desse novo caminho que
surgia em minha vida foi se desvendando aos poucos durante esses cinco
anos de formação. Essa experiência permitiu aprofundar-me nos
conhecimentos teóricos da Psicologia Analítica ao mesmo tempo em que fui
me transformando como pessoa e profissional. A questão sobre a normalidade
e a doença mental foi algo muito inquisidor nesse período, levando-me a
buscar muitas respostas sobre as dores e sofrimentos da alma.
O tema desenvolvido durante o terceiro ano do curso de formação
foi “Psicopatologia” e, ao dedicar-me à leitura e aos estudos sobre esse tema,
algumas questões que me instigavam começaram a clarear. Com o estudo
sobre o Transtorno de Personalidade Borderline, um novo universo abriu-se
para mim. A teoria passou a ter um sentido vivo quando passei a atender esses
pacientes e, ao sentir o sofrimento vivenciado na alma tão intensamente,
resolvi mergulhar de cabeça e aprofundar-me nas causas, sintomas e
tratamentos dessa patologia. Enquanto buscava repostas para minhas dúvidas,
surgiu uma oportunidade de poder desenvolver um trabalho como psicóloga
colaboradora junto ao Dr. Álvaro Ancona de Faria, no ambulatório de Borderline
do PROVE (Programa de Pesquisa e Assistência em Violência), na UNIFESP
(Universidade Federal do Estado de São Paulo), por dois anos e meio. Nesse
período, além de grande quantidade de estudos teóricos, supervisões e
reuniões clínicas, pude também vivenciar as particularidades do setting
terapêutico que esses pacientes exigem através de vários atendimentos.
A necessidade da realização desta monografia para a obtenção
do título de analista membro da SBPA apresentou-se para mim como um
espaço para aprofundar-me no tema, situar essa patologia no contexto sócio-
econômico-cultural atual e sistematizar, por meio da visão da Psicologia
Analítica, o processo normal de desenvolvimento da personalidade e suas
alterações, que são a causa de vários distúrbios mentais, entre eles o
Transtorno de Personalidade Borderline.
Nesse trabalho farei uma pequena retrospectiva das mudanças
culturais ocorridas nos últimos tempos e suas consequências na estruturação
da personalidade do homem na pós-modernidade. Em seguida, descreverei os
conceitos psiquiátricos que são utilizados atualmente na psicopatologia para o
diagnóstico de Transtorno de Personalidade Bordeline. Utilizarei os autores
neo-junguianos Erich Neumann, Edward F.Edinger, Michael Fordham e Brian
Feldman para aprofundar a discussão dentro das teorias desenvolvimentistas.
Utilizarei também outros autores como Jonh Bowlby e Donald Winnicott, que
estudaram o desenvolvimento de crianças para demonstrar a importância da
relação mãe-bebê no desenvolvimento psíquico. Partindo do aporte teórico
desses autores, discutirei essa patologia como uma alteração do processo
normal do desenvolvimento humano. Por fim, examinarei algumas das
particularidades necessárias ao setting terapêutico desses pacientes.
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1. O BORDERLINE E O MOMENTO ATUAL
Na Idade Média, a religião era o centro do pensamento da época,
determinando os parâmetros morais e éticos para o homem. Já no século XVIII,
com o Iluminismo, a religião deixou de ser o foco principal e o homem passou a
ser o centro, construindo princípios, conceitos e novos parâmetros a partir da
razão. No século XIX, com a Revolução Industrial, a nova sociedade
estruturou-se a partir de conceitos e valores científicos e tecnológicos. Durante
o século XX, o homem moderno, ao se frustrar com a ineficácia de suas
ideologias radicais e com a ausência de respostas científicas para seus
anseios, passou por mais uma mudança de paradigmas e aderiu a um
relativismo total, dando espaço a uma nova era, a da pós-modernidade.
O homem resultante dessa cultura pós-moderna passou por um
processo lento de transformações de valores e costumes. Antigamente, os
limites de “certo” e “errado” eram claros e rígidos; hoje, devido a uma busca de
“igualdade” e “liberdade”, prevalece a crença de que as “verdades” aprisionam
os homens, impedindo-os de realizar seus desejos, pois são coibidos pelas
regras morais e pelos valores sociais, éticos e religiosos. Essa mudança de
paradigma levou o homem a acreditar que tudo é ilusório. O homem perde seu
referencial hierárquico valorativo e passa a viver uma “verdade” relativa,
entrando em uma crise existencial, não encontrando mais referenciais seguros
onde se apoiar e passando a viver de forma imediatista e individualista.
Esse novo homem se estrutura em uma cultura em que não
consegue manter um suporte para a demanda e para as necessidades do
outro. É um sujeito que fala de si e para si. Há uma procura excessiva de bem
estar e não há espaço para o convívio com angústias e sofrimentos. A
educação recebida pelos pais e pelas escolas, os valores como ética, moral e
caráter, a religião, a solidez do casamento, a família, perdem espaço para
novas formas de comportamento regidas pelas leis de mercado e de consumo.
A aceleração transforma o consumo em uma rapidez nunca vivenciada, tudo é 
2
descartável, desde bens matérias até os afetivos. A publicidade manipula os
desejos e promove a sedução. A tecnologia avança, perde-se a visão pessoal e
os conceitos tornam-se vazios. Vive-se, então, um tempo de pouca
solidariedade e alta competitividade, guiado pela lógica da acumulação de bens
e de aparências. Instala-se uma cultura de incertezas, de fragmentações de
troca de valores e do vazio.
A ruptura da solidez, da formatação familiar, dos laços de
solidariedade, e o crescimento vertiginoso do individualismo e da competição
feroz acentuaram a solidão humana e determinaram uma diminuição
significativa de suporte social. As relações estáveis, em que os efeitos de uma
falta de continência intrafamiliar poderiam ser amenizados, passaram a fazer
parte do passado.
Os pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline
encontram-se imersos na relação com o outro e dependente dele; a estrutura
de sua patologia é construída na relação, no seu modo de se vincular. Eles
olham para essa nova realidade social com lentes de aumento e não
conseguem encontrar seu espaço nessa nova sociedade onde os vínculos
estabelecidos são superficiais e frágeis, não permitindo um grau mínimo de
continência satisfatória.
É fácil estabelecer uma analogia do aumento desse tipo de
paciente como um reflexo dessa sociedade pouco preocupada com seus
indivíduos e mais interessada na globalização e em seus benefícios
econômicos. Painchaud & Montgrain (1991, apud HEGENBER, 2009) afirmam
que, “como a problemática social mudou, enfrentamos modificações de
configuração psicológica inconsciente, cujo resultado clínico se constatará pelo
aumento daquilo a que convencionamos chamar de estados-limites ou
borderline”.
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2. DESCRIÇÕES PSIQUIÁTRICAS

2.1. Psicopatologia
“A percepção do desconhecido é a mais fascinante das
experiências. O homem que não tem os olhos abertos para o misterioso
passará na vida sem ver nada.”
Albert Einstein
Sempre pairou sobre os interesses de Jung, em suas pesquisas e
em seus estudos, uma questão: “o que acontece de fato no interior da pessoa
mentalmente enferma?” A doença psíquica sempre foi para ele o drama de um
indivíduo em particular. A história pessoal é o “segredo do paciente, a rocha
contra a qual ele despedaça” (JUNG, 1985).
Jung acreditava que se conhecesse essa história, teria a chave
para o tratamento. Eros era o princípio que guiava Jung no exercício da
medicina. Para ele, era muito mais importante estabelecer uma relação de
confiança com o paciente do que demonstrar uma teoria (FRANZ, 1997).
Já no início de seus estudos através do teste de associação de
palavras, Jung constatou a importância do inconsciente na psicopatologia.
Observou que, nas pessoas normais, o inconsciente efetua uma compensação
de todas as tendências conscientes através de um impulso contrário e produz
um equilíbrio. Nas pessoas mentalmente desequilibradas há uma
descompensação real entre o consciente e o inconsciente. Devido à
unilateralidade característica do esforço consciente de manter o equilíbrio, os
conteúdos do inconsciente irrompem de forma anormal, causando um
transtorno no equilíbrio mental e perturbando a adaptação do indivíduo a seu
ambiente (JUNG, 1986).
4
Para os estudiosos do inconsciente, o que interessa na
psicopatologia é o conteúdo das vivências, os movimentos internos dos afetos,
desejos e temores do indivíduo, sua experiência particular e pessoal, não
necessariamente classificável em sintomas previamente descritos.
Para Jung, “as enfermidades são distúrbios de processos
normais, e nunca uma entia per se, dotada de uma psicologia autônoma”
(JUNG, 2004). Segundo Karl Jaspers (1979), são muito claros os limites da
psicopatologia: embora o objeto de estudo da psicopatologia seja o homem em
sua totalidade, os limites da ciência psicopatológica consistem precisamente
em que nunca se pode reduzir inteiramente o ser humano a conceitos
psicopatológicos. Em todo indivíduo, oculta-se algo que não se pode conhecer,
pois a ciência requer pensamento conceitual sistemático, pensamento que
cristaliza, que torna evidente, mas também que aprisiona o conhecimento, isto
é, não se pode compreender ou explicar tudo o que existe em um homem por
meio de conceitos psicopatológicos. Sempre resta algo que transcende a
psicopatologia, mesmo na ciência, e que permanece no domínio do mistério.

2.2. Transtorno de Personalidade
O conceito de Transtorno de Personalidade foi variando no
decorrer dos tempos, mas o que se manteve foi que essa patologia é
consequência de uma alteração do processo normal de desenvolvimento dos
indivíduos e que gera grande sofrimento a esses pacientes.
Antes de apresentar vários conceitos sobre o Transtorno de
Personalidade, é fundamental apresentar o conceito de personalidade no qual
me apoiei. Personalidade refere-se à organização dinâmica de padrões
constantes de comportamento, cognição, emoção, motivação e formas de se
relacionar com as outras características de um indivíduo. A personalidade de
um indivíduo é parte integrante da sua experiência consigo mesmo e com o
mundo – a tal ponto que ele pode ter dificuldade de se imaginar sendo diferente
(CALIGOR, KERNBERG & CLARKIN, 2008).
5
Karl Jaspers (1979) afirma serem anormais as personalidades
que fazem sofrer tanto o indivíduo quanto aqueles que o rodeiam. Para ele, os
transtornos de personalidade (designados como personalidades anormais)
representam variações não normais da natureza humana e que, na
eventualidade de superpor-se a elas algum processo, tornar-se-iam
personalidades propriamente mórbidas (doentias). Jaspers aborda o tema sob
a ótica das variações do existir humano de origem constitucional (que fazem
parte da pessoa).
Assim sendo, podemos considerar a maneira própria das
personalidades anormais de ser no mundo como uma apresentação do
indivíduo diante da vida situada nas extremidades da faixa de tolerância de
sanidade pelo sistema cultural. Essas personalidades anormais seriam
alterações perenes do caráter, caracterizando não apenas a maneira de
ESTAR no mundo, mas, sobretudo, a maneira do indivíduo SER no mundo.
(JASPERS, 1979)
Para o psiquiatra alemão Kurt Schneider, o elemento central dos
transtornos de personalidade (por ele denominadas “personalidades
psicopáticas”) constitui-se no fato de que o indivíduo apresenta as seguintes
características básicas: “Sofre e faz sofrer a sociedade, assim como... não
aprende com a experiência.” (SCHNEIDER, 1976).
Otto F. Kermberg explica que:
Na personalidade normal, os traços de personalidade não são
extremos, e são ativados de forma flexível e adaptativa nas
diferentes situações. Neste contexto, podemos dizer que, na
ausência de uma psicopatologia, um indivíduo possui um “estilo”
particular de personalidade, por exemplo, obsessivo compulsivo
ou histriônico. Quando os traços de personalidade se tornam
mais extremos e são ativados de forma mais inflexível no
decorrer das situações, vamos avançando de um funcionamento
normal da personalidade em direção a graus crescentes de
patologia de personalidade, até que em extremos mais grave do
espectro, os traços de personalidade tornam-se gritantemente
mal adaptativo e com um funcionamento disruptivo.
Independente da patologia de personalidade ser relativamente
leve ou mais grave, ela está por definição associada a algum
grau de angustia e/ou prejuízo no funcionamento social ou
ocupacional. A patologia de personalidade é relativamente 
6
estável ao longo do tempo, tendo sua aparição no início da idade
adulta (KERNBERG... [et al] , 1991).
A Organização Mundial de Saúde descreve os transtornos de
personalidade e de comportamentos na Classificação Internacional das
Doenças (CID – 10) da seguinte forma:
Transtorno da personalidade e do comportamento do adulto
compreende diversos estados e tipos de comportamento
clinicamente significativos que tendem a persistir e são a
expressão característica da maneira de viver do indivíduo e de
seu modo de estabelecer relações consigo próprio e com os
outros. Alguns desses estados e tipos de comportamento
aparecem precocemente durante o desenvolvimento individual
sob a influência de fatores constitucionais e sociais, enquanto
outros são adquiridos mais tardiamente durante a vida. /.../
Representam modalidades de comportamento profundamente
enraizadas e duradoras, que se manifestam sob a forma de
reações inflexíveis a situações pessoais e sociais de natureza
muito variada. Eles representam desvios extremos ou
significativos das percepções, dos pensamentos, das sensações
e particularmente das relações com os outros em comparação
com as de um indivíduo médio de uma dada cultura. /.../
Frequentemente estão associados a sofrimento subjetivo e a
comprometimento de intensidade variável do desempenho
social. /.../ Estes distúrbios compreendem habitualmente vários
elementos da personalidade, acompanham-se em geral de
angustia pessoal e desorganização social; aparecem
habitualmente durante a infância e persistem de modo duradouro
na idade adulta (OMS, 2006).
A Associação Americana de Psiquiatria define os transtornos de
personalidade como
Um transtorno de personalidade é um padrão persistente de
vivência intima ou comportamento que se desvia
acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo, é
invasivo e inflexível, tem seu início na adolescência ou começo
da idade adulta. É estável ao longo do tempo e provoca
sofrimento ou prejuízo (AAP, 1994).
Para fazer um diagnóstico de transtorno de personalidade, é
necessária uma investigação complexa e detalhada da vida e das relações do
indivíduo, pois para preencher os critérios do diagnóstico, o comportamento
disfuncional tem que ser inflexível e duradouro. Conflitos latentes e relações 
7
insalubres podem durar anos até que torne o comportamento disfuncional. Por
esses motivos, os diagnósticos passam por um viés de subestimação
(SAUAIA... [et al], 2009).
O indivíduo com transtorno de personalidade pode estar sofrendo
há muito tempo sem que a família e a sociedade percebam. Muitas vezes ele
só será percebido quando passar a ser sócio-distônico.
A prevalência de indivíduos que configuram critérios para o
diagnóstico de transtorno de personalidade na população em geral chega a ser
de 10 a 15%, sendo que 4% sofrem prejuízos em todos os âmbitos de sua vida.
Na população psiquiátrica, esse índice chega a 11% e, nos pacientes
ambulatoriais, chega a 30% (SAUAIA ...[et al], 2009).

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2.3. Transtorno de Personalidade Borderline
Transtorno de Personalidade Borderline tem sido um dos
transtornos mais amplamente estudados. Pacientes com diagnóstico de
Transtorno de Personalidade Borderline constituem 20% dos pacientes
psiquiátricos internados e 10% dos pacientes vistos ambulatoriamente em
serviços de Saúde Mental e são consumidores frequentes de serviços de
emergências para crises e de consultas psiquiátricas solicitadas por outros
serviços médicos (BRADLEY ...[et al], 2010).
O Transtorno de Personalidade Borderline tem por característica
um padrão de instabilidade nos relacionamentos, em sua auto-imagem e nos
afetos. Apresenta um alto grau de impulsividade em pelo menos duas das
seguintes áreas, as quais são potencialmente prejudiciais a si mesmo: jogos,
gastos irresponsáveis, comida em excesso, abuso de substâncias, sexo
inseguro e direção imprudente. Os portadores do transtorno revelam
descontrole emocional com tendência para que as emoções fujam do controle,
apresentando também tendência de tornarem-se irracionais em momentos de
grande estresse e uma dependência dos outros para regularem as emoções
(AAP, 1994).
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Os pacientes diagnosticados com esse transtorno são muito
sensíveis às condições ambientais. Fazem grandes esforços na tentativa de
evitarem um abandono real ou imaginado. A simples percepção da
possibilidade de uma perda ou de um abandono provoca profundas alterações
em seus comportamentos. Para eles, o “abandono” significa desintegração,
não existência, pois precisam do outro para se perceber.
Os temores de abandono provocam episódios de raiva
inadequada, mesmo frente a separações reais por tempo determinado ou
frente a mudanças de planos inevitáveis (por exemplo, atraso de alguns
minutos ou mesmo o cancelamento de um encontro com alguém afetivamente
importante ou o simples anúncio do término de uma sessão). Para eles, esses
acontecimentos constituem um “abandono” que implicaria no sentimento de
que são “maus”.
Nos momentos em que a ameaça de abandono se configura, a
ansiedade torna-se altíssima e aparece uma impulsividade marcante. Na
tentativa de aplacar essa ansiedade avassaladora, para evitar o “abandono” e
consequentemente a dor da solidão, da não existência e do vazio, eles podem
se utilizar de comportamentos impulsivos de automutilação recorrentes ou de
tentativas de suicídio.
Aproximadamente 75% desses pacientes fazem pelo menos uma
tentativa de suicídio e estima-se que 10% conseguem concretizar esse ato
(BLACK ...[et al], 2004). No acompanhamento por 27 anos de pacientes
diagnosticados com o Transtorno de Personalidade Borderline, Paris & ZweigFrank
(2001, apud BRADLEY ...[et al], 2010) encontraram uma taxa de 10,3%
de suicídio, sendo que a maioria ocorreu antes dos 40 anos.
A automutilação pode se dar durante experiências dissociativas e
frequentemente traz alívio ao indivíduo. Na história de 70 a 75% desses
pacientes, existe pelo menos um ato de autoagressão, tornando-se inclusive
essa característica – automutilação - um dos critérios diagnósticos para a
caracterização do quadro segundo o CID -10 e o DSM – IV.
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A indiferenciação corpo/psique é característica central na
estrutura desses indivíduos. Eles expressam essa indiferenciação entre todas
as polaridades na relação sujeito-objeto, que segundo as teorias de
desenvolvimento de Neumann (1995a) e Edinger (1995) pode ser
consequência de uma estruturação de forma inadequada do eixo Ego-Si
Mesmo, conforme irei expor mais adiante.
Segundo Gunderson (2000, apud FARIA, 2011), estima-se que a
prevalência do Transtorno de Personalidade Borderline na população seja em
torno de 1– 2%, sendo que 75% dos pacientes são do sexo feminino. A idade
de início dos sintomas da metade dos casos está na faixa de 18-25 anos de
idade, e 90% dos casos têm início antes dos 30 anos.
Talvez seja subestimado o número de pacientes com Transtorno
de Personalidade Borderline do sexo masculino. Em função de sua
agressividade e impulsividade, podem estar nas delegacias e presídios, ou nos
tratamentos de usuários de drogas. Na tentativa de aliviar a solidão e o tédio, é
comum fazerem uso da ingestão impulsiva e abuso de álcool e drogas
(FARIA,AA, SAUAIA L., 2011).
A instabilidade afetiva nas relações interpessoais, característica
desses indivíduos, leva a extremos de idealização e desvalorização, sensíveis
aos menores estímulos externos (reais ou imaginados), que se centram na
questão do medo do abandono e são acompanhados de esforços incríveis para
evitá-lo. A instabilidade afetiva para esses indivíduos funciona como uma
montanha russa, o que a torna também uma das características centrais do
transtorno.
Nathan Schwartz-Salant, em seu livro A personalidade limítrofe
(visão e cura), defende que:
Pacientes com um distúrbio de personalidade limítrofe
manifestam de fato sintomas e comportamentos particulares,
estando esse último relacionado em especial com as maneiras
pelas quais o paciente influi vigorosamente na psique do
terapeuta. A maioria dos pacientes limítrofes vive de maneira a
evitar o intenso sofrimento psíquico do abandono e, para isso, se
serve de mecanismos psicóticos de defesa, tais como a
idealização, a cisão, a negação e de comportamentos obsessivo-
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compulsivos de fazer, ou o oposto, a inércia. Estes mecanismos
psíquicos existem no lugar de um self funcionalmente sadio, que
é o organizador básico da vida psíquica (SCHWARTZSALANT,1989).

Seja no nível biológico, seja no nível psicoterapêutico, o
Transtorno de Personalidade Borderline é considerada uma patologia grave
pelo comprometimento das várias esferas vivenciais do indivíduo: social,
amorosa, ocupacional e familiar.
Neste trabalho, o termo borderline passará a ser utilizado para
caracterizar os indivíduos que apresentam:
uma identidade composta por um ego frágil, constantemente
ameaçado por núcleos psicóticos paranoides ou quadros
dissociativos graves com uma alternância
masoquista/depressiva, devido a uma confusão de estados
psicológicos oscilatórios (CHARLTON, 1988).

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2.4. Trauma e desenvolvimento do Transtorno de
Personalidade Borderline
Inicialmente, os estudos sobre pacientes borderline focaram-se no
papel etiológico do abuso infantil. Stern (1938, apud BRADLEY ...[et al], 2010)
descreve que “crueldade, negligência e brutalidades pelos pais, com muito
tempo de duração, são fatores encontrados nesses pacientes. Estes fatores
são constantes ao longo de muitos anos a partir da infância precoce. Eles não
são experiências únicas”.
A anamnese desses indivíduos apresenta uma frequência alta de
relatos sobre abuso sexual infantil. Algumas pesquisas mostram que a taxa
desses abusos pode chegar a 70% (PARIS, 2010). Van Der Kolk (1994)
sublinha que mais da metade de todos os pacientes borderline tiveram histórias
de abuso físico ou sexual severo, iniciando-se antes dos seis anos de idade. 
11
Alguns fatores determinam a gravidade e as possíveis consequências do abuso
sexual: a frequência e duração dos episódios, a figura do abusador (pais,
cuidadores, pessoas ligadas à família ou um desconhecido), a idade em que os
abusos ocorreram (quanto mais cedo, maior a gravidade) e qual foi o
acolhimento da família quando esse abuso foi revelado.
O abuso sexual normalmente não ocorre sozinho, mas vem
vinculado ao abuso físico, verbal e à negligência. A separação ou a perda
precoce dos pais e o testemunho de violência também são fatores encontrados
neste contexto. Segundo Zanarini, MC ...[et al], (1997), esse conjunto de
vivências traumáticas caracteriza uma “falência biparental”.
Torna-se difícil diferenciar os eventos traumáticos e o impacto do
ambiente familiar onde eles usualmente ocorrem. Normalmente é um ambiente
em que prevalece caos familiar, vinculações transtornadas, múltiplos
cuidadores ou ausência deles, negligência parental, alcoolismo e/ou evidência
de instabilidade afetiva. O abuso sexual pode predispor ao Transtorno de
Personalidade Borderline, mas parte do seu impacto é reflexo de um ambiente
familiar instável, não acolhedor e não educativo.
Aparentemente, a experiência vivenciada por esses pacientes em
sua infância é de uma relação desastrosa tanto com o pai quanto com a mãe,
sem a possibilidade de uma constelação minimamente adequada de
maternagem/paternagem, levando à configuração de uma vivência de
negligência e de abandono completo. Essa falta de maternagem/paternagem
adequada se expressa pela não humanização dos arquétipos materno e
paterno. Segundo Bowlby (1951), à caracterização desse contexto leva ao
desenvolvimento de um apego ambivalente que se apresenta por um modelo
internalizado baseado em cuidados inconsistentes, em que os pais se revelam
prestativos em algumas ocasiões e ausentes ou agressivos em outros, não
deixando claro para a criança um padrão regular de cuidado ou agressão.
A vivência de forma inadequada da humanização do arquétipo da
Grande Mãe em consequência das experiências de abusos e negligências, que
compõem a história desses indivíduos em sua infância, não vai permitir uma
continuidade no desenvolvimento da consciência e do ego de forma propícia,
12
criando fixação urobórica e descontinuidade no processo de elaboração
simbólica, conforme demonstraremos no decorrer deste trabalho.
Salzman (1997, apud BRADLEY ...[et al], 2010) sugere que a
vinculação insegura às figuras parentais, junto a ambientes familiares
emocionalmente instáveis ou negligentes, pode explicar o Transtorno de
Personalidade Borderline, enquanto o abuso físico ou sexual pode determinar a
gravidade dos sintomas. 
13



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3. PSICOLOGIA ANALÍTICA E BORDERLINE

3.1. Desenvolvimento da Personalidade
Jung, em seus estudos, observou que a psique tem uma
dimensão pessoal, mas também uma parte pré-pessoal ou transpessoal que se
manifesta nas mitologias e religiões do mundo. O inconsciente não é só
formado por conteúdos esquecidos ou recalcados, como afirmava Freud, mas
existe também uma camada inconsciente mais profunda que não tem sua
origem na experiência pessoal, mas é inata. A essa camada mais profunda do
inconsciente, em que os temas são universais, Jung denominou inconsciente
coletivo. Enquanto os elementos do inconsciente pessoal são principalmente
formados por complexos de tonalidade emocional, aos constituintes do
inconsciente coletivo Jung denominou “arquétipos”, indicando a existência de
determinadas formas na psique, que estão presentes em todo tempo e lugar.
(JUNG, 2000a). Existe um princípio estruturador que unifica esses vários
conteúdos arquetípicos chamado de arquétipo central, ou arquétipo da
unidade, arquétipo da totalidade ou Si-mesmo.
Passarei, no decorrer do trabalho, a utilizar o termo Si-mesmo
também como sinônimo de Self que pode ser entendido como o potencial para
integração da personalidade inteira e como sinônimo de percepção consciente
e inconsciente da identidade pessoal, o que proporciona o sentido de
existência e permanência do sujeito no mundo. O Si mesmo é o centro
ordenador da psique total (consciente e inconsciente), enquanto o ego é o
centro da personalidade consciente.
Edinger, em seu livro Ego e arquétipo, esclarece:
Nascemos em um estado de inflação na mais tenra
infância, não existe ego ou consciência. Tudo está contido
no inconsciente. O ego latente encontra-se completamente
identificado ao Si-mesmo. O Si-mesmo nasce, mas o ego é
construído, e no princípio, tudo é o Si-mesmo (EDINGER,
1996).
14
Como no início o ego está submetido e imerso no Si-mesmo e só
no decorrer do desenvolvimento psíquico é que ele vai se estruturando e se
diferenciando, o vínculo existente entre eles torna-se de importância vital.
Como pontuado por Jung,
(...) o ego mantém com o Si-mesmo a mesma relação que há
entre o elemento movido e o elemento que move... o Simesmo(...)
é uma experiência a priori da qual surge o ego. Ele
é, por assim dizer, uma prefiguração inconsciente do ego
(JUNG, 1994).
Neumann conceituou o termo “eixo ego-Si-mesmo” para mostrar a
ligação existente entre esses dois centros reguladores da psique e a
importância desse vínculo para a integridade do ego. Tanto assim que a
consequência de modificações nas relações entre o ego e o Si-mesmo e as
dificuldades da estruturação do eixo entre eles nos vários estágios do
desenvolvimento psíquico estão no cerne de várias situações psicopatológicas.
Sobre o eixo ego-Si-mesmo, Edinger aponta outra característica
fundamental:
 O eixo ego-Si mesmo representa a conexão vital entre o ego e
o Si-mesmo, a qual deve ficar relativamente intacta se se
pretende que o ego suporte as tensões e cresça. Esse eixo é
uma passagem ou canal de comunicação entre a
personalidade consciente e a psique arquetípica. A danificação
do eixo Ego-Si Mesmo impede ou destrói a conexão entre
consciente e inconsciente e provoca a alienação do ego com
relação à sua origem e fundamento (EDINGER,1996).
Na primeira fase do desenvolvimento, o ego só se faz presente
em potencialidade, totalmente imerso no Si-mesmo e identificado com ele.
Edinger usa o termo “inflação” para caracterizar essa fase, pois se trata de um
estágio em que algo pequeno (ego) se identifica maciçamente com algo muito
maior (Si-mesmo) e, portanto, está além das medidas. Em uma segunda fase,
um ego emergente começa a surgir e a separar-se do Si-mesmo, mas a maior
parte do ego ainda continua identificada com o Si-mesmo. Em uma fase
posterior, o ego ainda mantém identidade residual com o Si-mesmo, mas nesse
estágio o eixo ego-Si-mesmo começa a tornar-se parcialmente consciente. 
15
Esses processos ocorrem simultaneamente; ao mesmo tempo em que ocorre
uma separação progressiva entre o ego e o Si-mesmo, o eixo entre eles tornase
mais claro na consciência.
EDINGER, 1996, p. 24
Os diagramas acima elaborados por Edinger representam os
estágios de separação ego-Si mesmo. O autor explica que:
As áreas sombreadas do ego designam a identidade residual
ego-Si mesmo. A linha que serve à conexão entre o centro do
ego e o centro do Si-mesmo representa o eixo-ego-Si mesmo –
o vínculo vital que faz a ligação entre o ego e o Si-mesmo e
que assegura a integridade do ego. Deve-se compreender que
estes diagramas servem ao objetivo de ilustrar um aspecto
particular do assunto em pauta e, por conseguinte, são
imprecisos com referencia a outros aspectos desse mesmo
assunto. (...) Para falarmos de forma racional, devemos
inevitavelmente estabelecer uma distinção entre ego e Simesmo.
Na realidade, a concepção do Si-mesmo é um
paradoxo. O Si mesmo constitui, simultaneamente, o centro e a
circunferência do circulo da totalidade. A consideração do ego
e do Si-mesmo como duas entidades distintas constitui um
mero recurso racional que a discussão torna necessário
(EDINGER, 1996).
O estágio denominado de “inflação” por Edinger só nos é
acessível de forma duvidosa, através de nossa experiência de adulto, que é
normalmente uma experiência de ego contingente à presença de consciência.
16
Para Neumann (1995a), nessa fase inicial do desenvolvimento
psíquico, a criança está imersa no inconsciente da mãe, está parcialmente
retida em uma relação psíquica embrionária primal; apesar do nascimento do
corpo, a criança ainda não se tornou ela mesma. Nesta fase inicial pós-uterina,
a consciência não se diferenciou e a experiência polarizada sujeito-objeto ainda
não existe. A criança não tem a discriminação de “dentro” e “fora”; para ela o
que existe é uma unidade composta mãe-bebê. Ela vive em um estado de
“participationmystique” total. Nesse momento, ainda não foram estruturados os
pares de opostos, sujeito e objeto, indivíduo e mundo.
A relação primal (mãe-bebê) é o fundamento de todos os
relacionamentos, dependências e relações posteriores. A criança vai precisar
emergir dessa unidade para transformar-se em um sujeito que possa
reconhecer o “tu” como objeto, e vivenciar as experiências polarizadas no
mundo.
Alguns mitos relatam essa fase como um estado original do
homem, um estado de total harmonia e perfeição. É o paraíso onde os homens
estão em comunhão com os deuses. É o momento em que a consciência ainda
não se diferenciou, o ego está imerso no inconsciente, ainda partilha a
plenitude da totalidade divina. As experiências vividas nesse estágio (pré-ego)
deixam suas marcas em todo desenvolvimento posterior.
Brian Fealdman e Alto, P. em seu texto A skin for imaginal, faz a
ligação desse estágio de indiferenciação à não capacidade de simbolização no
indivíduo. Para ele:
 Só com o desenvolvimento do espaço interno e as
definições dos limites psíquicos é que a criança consegue
desenvolver sua capacidade de simbolização e vivências
do imaginal. Esses elementos são os fundamentos de
nossa experiência de identidade e afetam a nossa
capacidade de vinculação afetiva bem como do nosso
processo de individuação (FELDMANN, 2004).
Feldman nos apresenta o conceito de pele psíquica, como uma
forma inicial de fronteira psicológica. O desenvolvimento dessa pele psíquica é
necessário para que haja uma diferenciação do espaço interno e dos limites 
17
psicológicos, para que nesse espaço interno e delimitado possa haver o
desenvolvimento da capacidade de simbolização e dos processos imaginais,
componentes fundamentais do processo analítico.
Para Feldman (op.cit), a capacidade de simbolização, isto é, a
possibilidade de utilizar imagem, pensamento e emoção de forma integrativa
tem como base o desenvolvimento sensorial do bebê em seu primeiro ano de
vida. As percepções captadas pelos órgãos dos sentidos (tato, olfato, audição e
paladar) e a vivência da pele como um limite do que é experimentado
internamente em oposição ao que é vivenciado externamente são
fundamentais para o desenvolvimento da experiência de Si-mesmo e de
identidade.
Freud já afirmava em seu livro O Ego e o Id que “o ego é, em
última análise, derivado de sensações corporais, principalmente daquelas que
brotam da superfície do corpo. O ego é, assim, uma projeção mental da
superfície do corpo.” (FREUD, 2006). Sendo assim, podemos concluir que,
para Freud, a experiência da pele seria a primeira base para o
desenvolvimento do ego, portanto, a primeira experiência psicológica de
fronteira.
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A pele é o envelope onde o corpo está contido, é ele que fornece
os pontos de contato com o mundo externo. Dessa forma, a pele torna-se o
primeiro contorno psicológico das experiências internas e externas, o primeiro
mediador das relações de objeto e o contorno da primeira experiência de Simesmo.
Como interface de dois mundos, a pele tem uma função
eminentemente simbólica de ponte de ligação entre eles, bem como de
separação entre dois meios diferentes. E é na função de envoltório que a pele
exerce também a missão de continente, de proteção e de abrigo do eu.
A criança, ao vivenciar suas primeiras experiências de holding de
forma adequada, introjeta a vivência corporal de ser contido. O bebê, ao se
sentir seguro dentro de sua própria pele, é capaz de tolerar períodos de
separação da mãe, sem ansiedade indevida. Quando existem problemas na
estruturação dessa pele psiquica ou a experiência de ser contido não foi 
18
devidamente introjetada, um processo defensivo pode surgir e a criança pode
desenvolver uma independência precoce da figura materna.
Feldman (2004) cita que, para Fordham (1976), o bebê já nasce
com uma capacidade de individualidade e integração que seriam mediadas
pela interação corporal/emocional com a mãe e facilitadas através do uso do
tato, olfato, paladar, som e visão A experiência do bebê, de si mesmo, se dá
através de sua experiência de um ambiente interpessoal que é sensível e
ressoante às suas necessidades. É dentro deste contexto relacional que a
imagem corporal e desenvolvimento da identidade começam a acontecer.
Fordham (1994) postula que o self do bebê se desenvolve através
do processo de deintegração/reintegração com participação ativa da criança
com seus cuidadores. Quando a experiência (corporal e arquetípica) é
internalizada, um mundo interior torna-se estruturado através das introjeções
das relações com figuras de apego significativas na vida da criança. O self do
bebê tem seu próprio sistema de defesa, o qual é ativado quando há falha
ambiental. Esses sistemas de defesa surgem espontaneamente a partir do self
e são projetados para preservar um senso de identidade individual e intacto.
Essas defesas que o self desenvolve são uma barreira impermeável, como
uma segunda pele - entre o self do bebê e o ambiente -, e o processo de
deintegração/reintegração são impedidos de evoluir. Em alguns casos
extremos, essa segunda pele pode se tornar tão rígida, que impedirá
totalmente o desenvolvimento psíquico.
J. Bowlby, psiquiatra infantil e psicanalista que sempre esteve
interessado na consequência da privação materna sobre a saúde mental,
desenvolveu a Teoria do Apego que também é uma teoria considerada
arquetípica, que supõe a existência de estruturas psíquicas inatas. Ele propõe
que a propensão para amar (ou se vincular afetivamente) é arquetípica e
primária. A criança já nasce com a predisposição biológica para desenvolver
laços afetivos com aquele que interage na primeira infância. Enfatiza a primazia
da ligação materna estável, como pedra fundamental da saúde mental dos
indivíduos:
19
Nos estudos de John Bowlby e Mary Ainsworth (1967), aparece a
importância do contato físico entre o bebê e seu cuidador para o
desenvolvimento psíquico saudável. A criança que vivencia a experiência de
conter e ser contido nos braços de seus cuidadores, que recebe uma
alimentação saudável, que experiencia um ambiente sensível e ressoante às
suas necessidades, consegue desenvolver um espaço interno em que essas
experiências ficam acumuladas e protegidas por uma pele psíquica e esse
espaço permite o desenvolvimento da capacidade de simbolização e o
desenvolvimento de um apego seguro. O acúmulo dessas experiências levará
à formação de uma imagem corporal coerente, a uma diferenciação eu-outro, à
formação de uma identidade e, aos poucos, o ego diferenciado, separado da
mãe, vai surgindo.
Bowlby (2002a) postula que “é essencial para a saúde mental que
o bebê e a criança mantenham uma relação contínua, íntima e afetuosa com as
mães (ou suas substitutas permanentes) – relação que traga a ambos
satisfação e prazer.” Diversos autores, como alguns citados anteriormente,
propõem que as primeiras experiências vividas pelo bebê são determinantes
para o desenvolvimento psíquico saudável. A perda da mãe nessa fase inicial
pós-uterina representa muito mais do que a perda de uma fonte de
alimentação. Para o recém-nascido – mesmo quando continua a ser
alimentado adequadamente –, a perda da mãe equivale à perda da vida,
porque o que se constitui fundamental e indispensável à vida da criança é o
maternal em termos genéricos. É a existência do ser que contém, alimenta,
protege, aquece a criança e ligse afetivamente a ela. É quem dá segurança e
torna possível a vida no mundo.
A partir dos conceitos de Edinger (1996,1999) e Neumann
(1995,2006) podemos compreender que, nesse estágio, a incapacidade de
experimentar aceitação incondicional ou vínculo é percebida pela criança como
a não aceitação pelo Si-mesmo; como consequência passa a existir uma
alienação entre o ego e o Si-mesmo, o eixo de ligação entre eles fica
danificado, e essa falta de aceitação é experimentada pela criança como uma
rejeição por parte de Deus. Só o sentimento de ser aceito pelo Si-mesmo dá
força e estabilidade ao ego e permite sua diferenciação e crescimento.
20
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A criança inicialmente vivencia a experiência concreta de ser o
centro do universo. A mãe deve inicialmente responder a essa exigência;
consequentemente a criança é encorajada a acreditar que seus desejos são
uma ordem para o mundo – e é necessário que assim seja. Se a dedicação
total e constante de um cuidador que esteja não só fisicamente presente, mas
também presente emocionalmente, que seja uma figura de segurança, que
forneça uma base segura, que esteja acessível e responda de maneira
adequada às necessidades do bebê não for experimentada, essa criança não
poderá se desenvolver adequadamente.
A base fundamental da relação primal é composta pelas reações
em grande parte instintivas da mãe, que garantem a estabilidade e o evidente
caráter de vinculação de Eros unindo mãe e filho. Todavia, um tempo depois, o
próprio mundo passa a rejeitar as exigências feitas pela criança. Nesse
momento, a “inflação” original começa a se dissolver, o ego inicia seu processo
de diferenciação do Si-mesmo. Ela é expulsa do paraíso, tem início um estágio
de “alienação”, é criada uma espécie de ferida incurável no processo de
aprendizagem. A criança descobre que não é a deidade que acreditava ser.
Inúmeras experiências de alienação se mantêm progressivamente até a idade
adulta. É através desse processo que o ego cresce e se separa do Si-mesmo.
É necessária uma reunião recorrente entre o ego e o Si-mesmo
para que seja mantida a integridade da personalidade total. Quando isso não
ocorre, existe um risco muito grande de que, conforme o ego vá se
diferenciando do Si-mesmo, o vínculo vital que os liga seja danificado.
Ocorrendo isso de forma ampla, estaremos alienados em nosso próprio mundo
interno, com terreno propício ao surgimento de doenças de caráter psíquico.
O ego necessita ir se diferenciando do Si-mesmo
progressivamente para seu próprio desenvolvimento. O problema consiste em
manter a integridade do eixo ego-Si-mesmo ao mesmo tempo em que se
dissolve a identificação do ego com o Si-mesmo. É necessário preservar a
integridade do eixo para que o ego se fortaleça e possa suportar as tensões e
manter intacta a comunicação entre o consciente e o inconsciente.
21
Na relação primal, o Si-mesmo do bebê está totalmente
identificado com o Si-mesmo da mãe, formando uma identidade indiferenciada,
de acordo com a teoria do Neumann, já descrita anteriormente. Com a
estruturação do ego, ele vai se instalando gradualmente no corpo próprio e
individual da criança. Esse processo caminha paralelamente ao
desenvolvimento do ego, e por isso é de extrema importância toda experiência
e percepção corporal nessa fase. Ao mesmo tempo em que o ego se
desenvolve, ele vai também se instalando no corpo da criança. O Si-mesmo vai
se deslocando da mãe para a criança e a autonomia da criança vai se
configurando. Quando ocorre esse total deslocamento e a formação de um Simesmo
unitário, a criança verdadeiramente nasce e passa a poder relacionarse
com o outro. A relação primal com a mãe constitui-se não só do fundamento
da relação da criança com seu corpo, como também de suas relações com
outras pessoas e com o mundo.
Para que ocorra essa formação de um Si-mesmo unitário e
unificado, é necessária uma experiência emocionalmente satisfatória na
relação primal durante o primeiro ano de vida. A segurança adquirida nessa
fase capacita o ego a preservar sua integração durante as crises que surgem
no decorrer das fases naturais do desenvolvimento psíquico. Se essa relação
for vivenciada de forma insegura ou instável, haverá instabilidade na relação do
eixo ego-Si-mesmo e, consequentemente, um uso exagerado de mecanismos
de defesa por parte do ego. Havendo um deslocamento do eixo em direção ao
Si-mesmo, pode ocorrer uma total desintegração da personalidade. Quando é
constelada uma relação primal negativa, nem mesmo as melhores condições
ambientais externas conseguem impedir que ocorra algum tipo de distúrbio
psíquico.
Para Neumann,
(...) uma reversão da situação paradisíaca caracteriza-se pela
reversão parcial ou total da situação natural da relação primal.
Esta se faz acompanhar pela fome, pela dor, pelo vazio, pelo
frio, pelo desamparo, pela total solidão, pela perda de total
abrigo e de toda segurança, trata-se de uma queda livre no
vácuo do abandono e no terror do vazio sem fundo
(NEUMANN,1995a).
22
De acordo com Neumann quando a relação primal é vivida de
forma negativa, o desamparo e a desproteção constelam a “Mãe terrível”, que é
vivenciada pela criança como a mãe diabólica da dor e do sofrimento. A
ocorrência muito prematura desse fenômeno pode levar a uma apatia e à
configuração de um estado desprovido de ego, tornando possível uma
inundação direta pelo inconsciente e uma dissolução da consciência. Se essa
constelação ocorrer em uma fase em que o ego já estiver parcialmente
estruturado, pode levar à formação de um ego ferido e negativado e a uma
consciência sistematizada centrada no ego, tornando-o reativamente rígido e
defensivo.
Sempre que a criança se vê frente ao poder numinoso dessa
“Mãe Terrível”, fica alarmada e esse alarme desencadeia reações
compensatórias de defesa que virão com erupção de raiva e agressão ou total
apatia. Nessa fase, pode ocorrer total desvinculação no eixo-ego-Si-mesmo,
que não é desejável. A quebra dessa conexão leva a um sentimento de vazio,
desespero, falta de sentido e em casos extremos à psicose ou ao suicídio.
Edinger assevera:
Nos casos em que a criança experimenta um grau sério de
rejeição por parte dos pais, o eixo ego-Si-mesmo é
danificado e a criança fica predisposta, na idade madura, a
estados de alienação que podem alcançar dimensões
insuportáveis. Essa linha de acontecimentos decorre de a
criança experimentar a rejeição parental como uma rejeição
por parte de Deus. Essa experiência é incorporada à psique
como alienação permanente entre o ego e o Si-mesmo
(EDINGER,1996).
Quando o arquétipo da “Mãe terrível” constela-se, manifesta-se a
morte, ruína, aridez, penúria e esterilidade, e existe uma separação radical e
uma hostilidade contra todas as características do maternal bom, positivo. Há
uma reversão do princípio de Eros no desenvolvimento da criança.
Para Bolwby (2002a), como já dissemos anteriormente, a não
existência de uma relação íntima, contínua e afetuosa do bebê com sua mãe,
que traga a ambos satisfação e prazer, também pode causar distúrbios no
desenvolvimento do sistema de apego, gerando problemas para a criança com 
23
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relação à percepção de si própria, do outro e da sua capacidade de amar e de
relacionar-se com o mundo. Quando o bebê cresce em um ambiente não
propício a manter essa relação de satisfação e prazer, sua personalidade
desenvolve-se por caminhos desviados e, com o tempo, esse caminho vai
ficando menos flexível e a psique menos plástica à mudança.
Para Bowlby (2002b), as doenças psíquicas em grande parte são
determinadas por distúrbios no desenvolvimento psíquico da criança e não por
regressão ou fixação a fases anteriores. No âmbito de sua teoria, para que
ocorra um desenvolvimento adequado de um apego seguro, a criança precisa
de ligações estáveis e afetuosas, precisa ter alguém que cuide dela, agrade-a,
ria e brinque com ela. Enfim, precisa de relações onde prevaleça um
sentimento de prazer de estar com ela. Quando isso não ocorre e a criança
vivencia um ambiente onde algumas vezes os pais se revelam prestativos e em
outras não, cria-se a expectativa de que o outro estará disponível de maneira
imprevisível. A criança desenvolve uma forma de apego e de se relacionar com
o mundo ambivalente em que se mistura uma forte busca por contato ao
mesmo tempo em que se apresenta uma rejeição raivosa, uma recusa de ser
confortado.
E se a vivência da criança foi de rejeição e abandono, propiciada
por cuidadores que apresentaram comportamentos de horror ao contato físico,
frieza, indiferença emocional ou demonstraram raiva e agressividade frente às
suas necessidades, a criança passará a sentir-se como não merecedora de
cuidados, porque sua figura de apego foi percebida como não estando
disponível. O indivíduo que passou por essa vivência na infância, por sua vez,
passará a não ter nenhuma confiança de que, quando precisar de cuidado, terá
resposta de ajuda, esperando sempre ser rejeitado.
Considerando o referencial teórico da Psicologia Analítica e da
Teoria do Apego, uma criança que vivenciou o lado positivo do materno, o
arquétipo da “Grande Mãe” boa, que teve uma estruturação do eixo ego-Simesmo
adequada, desenvolve um sistema de apego seguro, tem uma
confiança internalizada inconsciente que sempre terá com quem contar em
momentos de necessidade, fazendo-a relacionar-se com o mundo de forma 
24
autoconfiante, com coragem para enfrentar os desafios e perigos que surgirão
no transcorrer de seu crescimento. Dessa forma, dificilmente ela vai se engajar
em situações de abuso e vitimização.
Já, a criança que vivenciou o lado negativo do arquétipo, que
vivenciou a “Mãe terrível” e cujo eixo ego–Si-mesmo está danificado,
desenvolverá um sistema de apego ansioso/evitador, podendo tornar-se um
indivíduo com tendências a ser abusivo, vitimizado e rejeitador.
A criança que não vivenciou um dos polos do arquétipo, mas que
sempre teve experiências ambivalentes, ora de um lado, ora de outro sem
consistência, sem continuidade, também terá danificado o eixo e,
possivelmente, de forma mais grave, pois nesses casos não houve uma
vivência de continuidade na transferência do Si-mesmo da mãe para a criança
e a criança não conseguiu diferenciar-se e estruturar um Si-mesmo unitário.
Dessa maneira, torna-se mais vulnerável, com um ego mais frágil e mais
propensa a ser vítima de abusos.
O desenvolvimento dos pacientes borderline se dá de forma
truncada. A anamnese desses pacientes demonstra que eles não tiveram uma
vivência adequada de holding, não tiveram a experiência de serem contidos e
cuidados, não tiveram um ambiente saudável e ressoante a suas
necessidades. Guzder (1996) chama a atenção para o fato que “(...) é preciso
notar que o abuso sexual raramente ocorre isoladamente, mas sim em um
contexto de outros fatores de risco como abuso físico, verbal e negligência”.
Kalsched (1996) considera que as crianças que têm experiências
de trauma emocional agudas ou sequenciais no início de seu desenvolvimento,
tendem a desenvolver sistemas de defesa para afastá-las das figuras de apego
significativas, e facilitar o desenvolvimento de uma autossuficiência e
independência prematura. Essas crianças traumatizadas utilizam o seu sistema
de defesa para evitar necessidades de dependência, parecem arredias em
suas relações de apego e tendem a desenvolver uma fachada exterior de
resistência que as torna de difícil acesso em análise. As falhas no processo de
desenvolvimento dos pacientes borderline os mantêm presos em um quadro de
total indiferenciação entre sujeito-objeto, como já dissemos anteriormente,
25
vivenciando um estado de “participationmystic” e um incesto urubórico, como
nos fala Erich Neumann (1995b).
Van der Kolk relaciona as questões do trauma infantil e o
desenvolvimento da personalidade borderline e chama a atenção para um dado
importante:
 Quanto mais jovem a pessoa era quando sofreu abuso e
negligência, mais propensa a apresentar automutilação e
outros atos autodestrutivos: o abuso fica como que gravados
nos níveis biológicos e psicológicos.”(VAN DER KOLK, 1994).
Como é característica desses pacientes em relação a essa total
indiferenciacão, quanto mais cedo a criança sofreu o abuso, menor fica sua
discriminação do dentro e fora, corpo e psique, e os mecanismos de defesas
ficam mais rígidos, dificultando suas relações interpessoais com suas figuras
de apego, tornando-as arredias e de difícil acesso. Elas desenvolvem uma
barreira intransponível para se proteger da invasão sentida na hora do trauma
original e essa vivência corporal não pode ser integrada. Essa experiência
corpo e mente interrompida com o trauma faz com que a capacidade de
imaginar e dar forma à experiência emocional fique totalmente frustrada. A
partir da não diferenciação de um espaço interno, a capacidade de
simbolização fica comprometida. Conforme pontua Gilda Montoro (1994),
“carência afetiva e desamparo ativam muito cedo a sexualidade, que se
manifesta de maneira impulsiva e substituta do apego insatisfeito”.

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3.2. Função Simbólica/Função Transcendente
“Foi e sempre será a fantasia o que forma a ponte entre as
reivindicações irreconciliáveis de sujeito e objeto”
C. G. Jung
26
Jung utilizou-se de conceitos da Física para pensar sobre a
energia psíquica. O autor alega que a energia é finalista e vê as coisas como
meios ordenados a um fim, sendo que “todos os fenômenos psíquicos podem
ser considerados como manifestações de energia” (JUNG, 1971).
Jung conceituou a libido, não apenas como sexual, mas como
“um desejo ou impulso que não é freado por qualquer tipo de autoridade, moral,
ou que quer que seja” (JUNG, 1999), distanciando seu conceito de libido do
utilizado por Freud.
O autor concebe a psique (consciente e inconsciente) como um
sistema energético relativamente fechado e auto-regulador, que possui
potencial energético que permanece o mesmo em termos de quantidade
durante toda a vida de cada indivíduo, e que tende sempre a buscar um
equilíbrio. Vê a psique em movimento constante, com dinamismo. Correntes de
energia cruzando-se continuamente, tensões diferentes, polos opostos. Energia
em progressão e regressão o tempo todo.
No sistema psíquico, a energia é constante e o que varia é sua
distribuição. A energia psíquica relaciona-se com a transferência de movimento
ou forças adquiridas entre objetos psíquicos ao deslocarem-se em busca desse
estado de equilíbrio. Se um grande interesse por um objeto deixa de encontrar
nele uma oportunidade para aplicar-se, a energia que o alimentava tomará
outros caminhos: poderão surgir manifestações somáticas ou poderá reativar
conteúdos do inconsciente. A energia psíquica se transformará, mas não
desaparecerá. A transformação de energia só é possível graças a esse
diferencial energético presente no interior do sistema psíquico.
“O mecanismo psicológico que transforma a energia é o símbolo”
(JUNG, 1971). Jung chama a atenção para o caráter curativo e restaurador do
símbolo. É através da transformação da energia, da formação de símbolos
novos, vivos, sucedendo símbolos que perderam seu valor e se esvaziaram da
energia que antes os animavam, que se processa em sua essência o
desenvolvimento da psique humana. Só onde o símbolo oferece uma diferença
de potencial maior do que a natureza é possível canalizar a libido para outras
formas.
27
Mas o que é símbolo?
A palavra símbolo (symbolon), formada a partir do verbo grego
symballo, sempre teve que admitir as mais variadas definições
e interpretações; no entanto todas elas concordam no ponto
em que, dessa forma, se queria designar algo que, por trás do
sentido objetivo e visível, oculta um sentido invisível e mais
profundo (JACOBI, 1995).
A etimologia do conceito mostra o símbolo como algo composto.
Na Grécia antiga, quando dois amigos se separavam, quebravam uma moeda,
e cada um ficava com uma parte. Quando o amigo ou alguém de sua família
voltava, tinha de apresentar a outra metade. Caso elas combinassem e se
completassem, esse alguém tinha revelado sua identidade de amigo e tinha
direito à hospitalidade. Assim a palavra símbolo torna-se um sinal de
reconhecimento. O símbolo é o que está em lugar de, é sempre uma forma que
deve possuir um significado sem ser capaz de exprimi-lo completamente.
“Se algo é ou não um símbolo, isso depende, antes de tudo, do
ponto de vista do consciente que o contempla” (JUNG, 1991). Depende de o
homem ter a capacidade de perceber em um determinado fato, não só sua
aparência concreta, como também a expressão de algo desconhecido. Sendo
assim, o mesmo fato pode ser símbolo para uma pessoa e, para outra, ser
apenas um signo.
O símbolo é a expressão de uma experiência espontânea que
aponta para além de si mesma em direção de um significado que não
consegue se exprimir no racional.
Enquanto um símbolo é vivo, ele é a expressão de uma coisa
que não tem outra expressão melhor (...) ele só é vivo, enquanto
está prenhe de sentido. Mas após o nascimento do sentido, isto
é, depois que este tenha encontrado a expressão que formula
ainda melhor a coisa procurada, esperada ou intuída, o símbolo
está morto e, dessa forma, passa a ser um mero signo
convencional (JUNG, 1991).
O símbolo atrai para si grande quantidade de energia e dá forma
aos processos pelos quais a energia psíquica é canalizada; ele é o grande
organizador da libido. Ele jamais é inventado conscientemente, emerge da 
28
base arquetípica da personalidade, do inconsciente coletivo, surge
espontaneamente do inconsciente. O símbolo para Jung é a expressão
possível para algo que é totalmente desconhecido da consciência. As
interpretações dos símbolos são tentativas de traduzir o significado de algo
inconsciente e desconhecido em um conjunto de termos mais acessíveis à
consciência. Os símbolos possibilitam-nos o caminho de acesso ao mistério.
A interpretação e elaboração dos símbolos têm por objetivo trazer
à consciência conteúdos inconscientes para que possam ser integrados. A
tradução dos conteúdos simbólicos é feita através de associações, analogias e
comparações com o objetivo de estabelecer conexões entre o conhecido e o
desconhecido. O mistério do inconsciente só pode ser desvendado através de
elementos da consciência.
A psique, por ser um sistema auto-regulador, utiliza-se dos
símbolos muitas vezes como portadores de elementos dos quais a consciência
necessita para que o equilíbrio e a integridade psíquica se mantenham
exercendo uma função compensatória.
 A elaboração simbólica consiste num processo de assimilação
e integração dos elementos inconscientes do símbolo na
consciência e requer uma atitude reflexiva do ego para
descobrir o sentido e a finalidade da mensagem simbólica
(PENNA, 2003).
A interpretação do símbolo só fará sentido se conduzir à
elaboração de conteúdos inconscientes, à sua integração e à ampliação da
consciência. Uma das funções psicológicas do símbolo é a de ser ponte entre o
ego, a consciência e o Si-mesmo, o inconsciente. É uma instância mediadora
entre a incompatibilidade do consciente e do inconsciente, do oculto e do
revelado.
 Esta qualidade mediadora e “lançadora de pontes” do símbolo
pode ser literalmente considerada um dos equipamentos mais
engenhosos e importantes da “administração psíquica”. É que
ela forma, diante do caráter fracionário da Psique e da
constante ameaça que isso representa para sua estrutura
unitária, o único contrapeso verdadeiro e preservador da
saúde, que a natureza pode enfrentar com esperança de
sucesso. A razão é que, ao mesmo tempo em que o símbolo 
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anula os antagonismos, ao uni-los dentro de si, para logo
deixar que novamente se separem, a fim de que não se
estabeleça nem rigidez, nem imobilidade, ele mantem a vida
psíquica em constante fluxo e a leva adiante no sentido do seu
objetivo determinado pelo destino (JACOBI, 1995).
O símbolo, como sendo um mediador entre o consciente e
inconsciente, estando em contato ao mesmo tempo com os arquétipos, com o
Si-mesmo e também com o ego, com a consciência e tendo como função a
integração dos opostos, constitui uma “coniunctio oppositorium”.
Rosemary Gordon estabelece uma relação do símbolo com a
imagem de ponte:
(...) discutirei a sua mais importante função psicológica, que
para o símbolo é a função de ponte par excellence. Símbolos
ligam objetos separados e distintos, e experiências ao geral e
ao abstrato, o estranho ao familiar, soma e psique, fato e
significado, desconhecido ao conhecido – se de fato conhecível
– e o fragmento do todo. Símbolos são pontes entre o ego e o
grande Self, entre o pessoal, o cultural e o transpessoal, e
entre o sagrado e o profano (GORDON, 1993).
No que se refere a conteúdos e tendências, o consciente e o
inconsciente raramente estão de acordo. Isso não ocorre sem propósito ou de
forma acidental, mas sim porque o inconsciente se comporta de forma
compensatória à consciência e vice-versa.
Só se pode deixar a condução do processo ao inconsciente,
quando houver nele uma vontade de dirigir. Isto só acontece
quando a consciência está de certo modo em uma situação
crítica. Quando se consegue formular o conteúdo inconsciente
e entender o sentido da formulação, surge a questão de saber
como o ego se comporta diante desta situação. Tem, assim,
início a confrontação entre o ego e o inconsciente. Esta é a
segunda e a mais importante etapa do procedimento, isto é, a
aproximação dos opostos da qual resulta o aparecimento de
um terceiro elemento que é a função transcendente. Neste
estágio, a condução do processo já não está mais com o
inconsciente, mas com o ego (JUNG, 2000b).
Nossa vida civilizada exige da consciência atividade concentrada
e direcionada. Essa direção implica uma unilateralidade que é característica 
30
necessária e inevitável do processo dirigido. O funcionamento direcionado
acarreta distanciamento do inconsciente e, possivelmente, forte contraposição
deste. Visto que a psique é um sistema auto-regulado, a contra reação sempre
se desenvolverá no inconsciente.
A contraposição do inconsciente não é perigosa enquanto não
atingir valor energético alto, mas quando é suprimida e perde sua função
reguladora, passa a ter efeito acelerador e intensificador do processo
consciente. É como se a força do inconsciente se somasse à energia da
direção consciente, provocando uma unilateralidade mais consistente.
Inicialmente, isso pode até ajudar na execução das atividades conscientes,
mas como não estão controladas, pode impor-se à custa do todo.
Em consequência dessa unilateralidade demasiadamente grande
e da tensão energética estar muito aumentada, há grande possibilidade de a
tendência oposta irromper na consciência precisamente no momento em que é
preciso manter a direção consciente. O material inconsciente pode facilmente
explodir e ser liberado. Para não sucumbir às influências perturbadoras do
inconsciente, devemos reconhecer sua importância no processo de
compensação da unilateralidade da consciência e levá-la em conta. As
tendências do inconsciente e da consciência são os fatores que juntos formam
a função transcendente. Ela tem esse nome porque faz uma transição
organicamente possível entre uma atitude e outra sem que existam perdas do
inconsciente (JUNG, 2000b).
Se a consciência não fosse tão direcionada, o inconsciente
poderia fluir de maneira mais espontânea. As pessoas que menos conhecem
seu inconsciente são as que maior influência dele sofrem, mas não sabem
disso. A tentativa de trazer os conteúdos inconscientes que estão carregados
de energia para a consciência é uma forma de evitar a interferência secreta
desses conteúdos e suas consequências desagradáveis, e promover
ampliação da consciência. O conhecimento das influências reguladoras do
inconsciente pode nos ajudar a evitar experiências dolorosas desnecessárias.
A função simbólica da psique atuando como mediadora tende a
manter esse equilíbrio e promover o desenvolvimento humano em um processo 
31
que Jung chamou de individuação, que é um processo contínuo, sucessivo e
constante de separação e união. A individuação nos coloca a relação sujeitoobjeto
como ponto central desse processo.
Até onde a lógica humana alcança, a unificação dos opostos
equivale a um estado de inconsciência, pois o estado de
consciência pressupõe, ao mesmo tempo, uma diferenciação e
uma relação entre sujeito e objeto. Onde não existe um “outro”
ou ainda não chegou a existir, cessa a possibilidade de tornarse
consciente (JUNG, 1994).
Rosemary Gordon descreve essa necessidade de união e
separação como sendo arquetípica:
(...) eu acredito que os dois temas arquetípicos mais
fundamentais e básicos sejam nossa necessidade de união por
um lado, e nossa necessidade de diferenciação e separação
por outro lado. Quando a função simbólica emerge, é um sinal
que a psique esta engajada em relacionar estas necessidades
aparentemente contraditórias: as necessidades do Self e as
necessidades do ego, a necessidade do pessoal e único, e a
necessidade do geral e universal (GORDON, 1993).
Jung denominou essa função de união dos opostos de função
transcendente. O termo transcendente não é utilizado por ele como uma
qualidade metafisica, mas sim como uma função de passagem de um lado para
o outro. Contudo, tal função só pode ocorrer se os pares de opostos já
estiverem constituídos, e para isso é necessário que o ego já tenha se
diferenciado do Si-mesmo e a relação sujeito-objeto tenha sido estabelecida.
Rosemary Gordon (1993) alega que somente após o self original
ter se separado, após o movimento de deintegração, como definido por
Fordham (1994), quando a fase urobórica de Neumann (1995a) foi sacrificada
e os opostos tenham sido constelados, será possível uma função de ponte,
“uma função transcendente de fato”.
A função transcendente só pode ser entendida como um
paradoxo, porque a união dos opostos só pode ser concebida como um
aniquilamento dos mesmos, o que caracteriza adequadamente seu caráter
indescritível:
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 O alternar-se de argumentos de afetos forma a função
transcendente dos opostos. A confrontação entre as posições
contrárias gera uma tensão carregada de energia que produz
algo de vivo, um terceiro elemento que não é um aborto lógico,
consoante a princípio: tertium non datur(não há um terceiro
integrante), mas um deslocamento a partir da suspensão entre
os opostos e que leva a um novo nível de ser, uma nova
situação. A função transcendente aparece como uma das
propriedades características dos opostos aproximados (JUNG,
2000b).
A busca de um significado e de uma finalidade para os conteúdos
inconscientes é a base para a compreensão dessa “função transcendente”,
porque, através desse método, passamos a olhar o símbolo não apenas como
um sinal, mas sim em seu mais verdadeiro sentido, como o termo que melhor
traduz um fato complexo e ainda não claramente apreendido pela consciência.
Nessa busca de confrontação com o inconsciente, devemos ter o
cuidado de atribuir a mesma importância ao ego e ao inconsciente para não
corrermos o perigo de um subjugar o outro, isto é, o inconsciente dominar o
ego ou vice e versa. A confrontação é conduzida a partir do ego, mas não
justifica apenas o seu ponto de vista. É necessário que o inconsciente também
fale e que lhe seja dada a mesma autoridade. Quando um lado não reconhece
o valor do outro, nega o direito do outro também existir.
 Como o processo de confrontação com o elemento contrário
tem caráter de totalidade, nada fica excluído dele. Tudo se
acha envolvido na discussão, embora se tenha consciência de
alguns fragmentos. A consciência é ampliada continuamente
ou – para sermos mais exatos – poderia ser ampliada pela
confrontação dos conteúdos até então inconscientes, se se
desse ao cuidado de integrá-los. Mas isso evidentemente nem
sempre acontece (JUNG, 2000b).

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3.3. Função Simbólica/FunçãoTranscendente nos Borderline
A atitude simbólica, apesar de universal, pode ficar comprometida
no processo do desenvolvimento. Podemos pensar que uma criança que
primitivamente não conseguiu fazer uma distinção consciente entre ela e o seu
mundo interno, entre ela e o mundo externo, e entre o mundo externo e interno,
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dificilmente conseguirá fazer o emparelhamento dos opostos. Ela terá
dificuldade em usar um símbolo em sua imaginação para substituir objetos
ausentes. Podemos até levantar a hipótese de que em alguns casos o
processo simbólico fique totalmente ausente.
Neumann (1995a) utiliza-se do termo centroversão como “uma
tendência universal, presente em toda psique humana que conduz a formação
do ego e do eixo ego- Si-mesmo”. A centroversão impulsiona o ego a se
diferenciar do inconsciente e a se defender. Para o autor, a tendência à
centroversão é considerada função primária da psique e se manifesta levando
os conteúdos inconscientes em forma de imagens à consciência do ego. A
representação em forma de imagens na consciência proporciona ao indivíduo
uma experiência mais abrangente do mundo interior e exterior.
A principal tarefa do desenvolvimento da consciência é fortalecer
o ego. Com isso, a quantidade de energia psíquica na consciência aumenta e o
ego consegue avançar para além da auto defesa, podendo ampliar e fortalecer
seu território.
A crescente tensão entre o sistema consciente do ego e o
sistema inconsciente do corpo é a fonte de energia
psíquica que distingue os seres humanos dos animais
(NEUMANN, 1995a).
 O ego necessita emergir satisfatoriamente de sua unidade e
identidade original com o Si-mesmo. Só a separação em dois opostos do que
estava fundido e unificado é que permitirá a continuidade do desenvolvimento
da consciência. Isso só será possível se a criança integrar uma imagem interna
da mãe ou cuidadores suficientemente estável que lhe dê segurança e
confiança. A capacidade de imaginar está diretamente ligada à capacidade de
confiar.
Um ego coerente precisa ser estabelecido para permitir a
passagem e integração de conteúdos do mundo interno para o mundo externo
sem sentir-se ameaçado de desintegração. Uma das características
fundamentais dos pacientes borderline é a constituição de um ego frágil com 
34
uma pele psíquica permeável e que, portando, pode sofrer invasões do
inconsciente constantemente.
A indiferenciação da relação sujeito-objeto nesses indivíduos e a
fixação deles no “incesto urobórico” com o ego e o Si-mesmo fundidos vão
dificultar a construção do processo simbólico, que é fundamental para o
desenvolvimento psíquico do homem. O dano no eixo ego-Si-mesmo pode
impossibilitar o surgimento do símbolo, que é o meio de comunicação entre o
consciente e o inconsciente.
Edinger nos fala que
 O símbolo é uma imagem ou representação que indica
algo desconhecido, um mistério. O símbolo veicula um
significado vivo, subjetivo é dotado de um dinamismo
subjetivo que exerce sobre o indivíduo uma poderosa
atração e um poderoso fascínio. Trata-se de uma entidade
viva e orgânica que age como um mecanismo de liberação
e de transformação de energia psíquica. O símbolo
transmite ao ego, consciente ou inconscientemente, a
energia vital que apoia, orienta e motiva o indivíduo
(EDINGUER, 1996).
 O símbolo atua em direção à auto-regulação e em nome de uma
amplitude natural da personalidade. Ele transcende os opostos e tem a
capacidade de transformar a energia psíquica e desviar sua direção para novos
canais na busca de uma auto-regulação. Contudo, o ego precisa ser capaz de
sustentar o novo padrão de energia e o símbolo, e isso só ocorre quando
houve o desenvolvimento de um espaço psíquico interno e seguro, com seus
limites bem definidos.
Como já explicado, essa capacidade da psique de formar
símbolos, isto é, de unir pares de opostos através do símbolo, foi denominado
por Jung de função transcendente. A função transcendente é que proporciona
a passagem de conteúdos inconscientes à consciência, através da
confrontação dos opostos. É essa função que permite que os conteúdos do
inconsciente possam vir à consciência na forma de símbolos e fantasias. É a
função que faz a ponte de ligação entre o consciente e o inconsciente. No
entanto, a função transcendente só ocorre quando os pares de opostos já
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foram constituídos, após o ego ter feito sua diferenciação do Si-mesmo e estar
devidamente fortalecido para sustentar esse novo padrão de energia.
Os pacientes borderline têm como uma das características
centrais a ausência da função transcendente, por não terem um ego
suficientemente estruturado durante o processo de desenvolvimento e por
terem desenvolvido uma pele psíquica permeável. O ego desses pacientes é
frágil e fica vulnerável a invasões dos conteúdos do inconsciente, que são
vivenciados de forma maciça, concreta e definitiva. Esses pacientes tendem a
se relacionar com o mundo através de experiências subjetivas completamente
polarizadas e cindidas, o que altera seu teste de realidade e proporciona o
espaço para que as fantasias persecutórias surjam.
As experiências vividas por esses pacientes configuram neles um
pavor extremo de separação, um medo de abandono presente o tempo todo
nas relações interpessoais. Dessa forma, não se criam nem se pareiam
opostos. Este processo se dá tanto extra quanto intrapsiquicamente.
A busca constante dos pacientes pela “coniunctio” não os deixa
enfrentar seu maio temor – da separação –, o que seria a condição inicial para
sua diferenciação e realização do seu processo de individuação.
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4. A TERAPIA COM PACIENTES BORDERLINE

4.1. Peculiaridades do setting terapêutico dos pacientes
borderline
Uma mãe pode curar ou corrigir rupturas na estrutura psíquica e
“restabelecer a capacidade do bebê de usar um símbolo de união”
Winnicott
Ao diagnosticar um paciente “borderline”, o analista deve
preocupar-se em não ficar só na teorização e generalização do diagnóstico e
perder de vista o paciente que está em sua frente com suas particularidades,
seu sofrimento e desespero. Este diagnóstico por si só já carrega uma carga de
estigmas de pacientes difíceis, intrusivos, invasivos e estranhos, despertando
normalmente uma atitude de distanciamento e mesmo de repulsa pelos
profissionais, chegando às vezes à negação de atendimento, por essa
patologia ser considerada de difícil manejo e evolução insatisfatória.
Ao se deparar com esses pacientes que chegam carregados de
estigmas, de experiências de rejeição por outros profissionais e tendo
conhecimento de que a patologia que possuem é de grande gravidade, com
enormes prejuízos nas esferas de relacionamentos interpessoais, sociais e
ocupacionais, apresentando uma alta taxa de suicídios, o analista deve ter o
cuidado de se distanciar das classificações psiquiátricas e seus rótulos sem, no
entanto, perdê-las de vista. Deve colocar-se em um lugar intermediário, que lhe
permita ficar à escuta, e onde o conteúdo dessa escuta possa ser acolhida e
simbolizada.
Esses pacientes que chegam de maneira tão peculiar requerem
do analista atitude diferenciada e acolhedora. Eles estão imersos e
dependentes da relação com o outro, por isso precisam de um analista
presente enquanto ele mesmo. Demandam um encontro em que o analista 
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exista como pessoa e não apenas enquanto qualidade transferencial. Os
borderline necessitam de uma clínica voltada para a transferência e
contratransferência e não centrada no intrapsíquico.
Eles requerem muito da relação analítica em virtude da patologia
estar diretamente ligada ao estabelecimento de vínculos. Normalmente iniciam
a psicoterapia de forma ambígua desde o início do tratamento, num jogo “eu
quero muito, mas não posso admiti-lo”, e essa ambiguidade está diretamente
ligada ao medo de rejeição ou ao abandono do paciente pelo analista. Esse
medo de rejeição e de abandono, que caracteriza todas as relações
interpessoais de importância para esses pacientes, permanece presente como
pano de fundo durante todo o processo de análise.
. Os pacientes borderline em geral distorcem a realidade numa
cisão radical “bom-mau”. Podem, por exemplo, dizer que odeiam alguém e, na
sessão seguinte, enaltecer a mesma pessoa como o “mais extraordinário
amigo do mundo”. Essas oscilações podem se tornar muito desconcertantes; é
possível que o analista seja tentado a fazer referência a elas, mas, se o fizer, o
paciente sem dúvida se sentirá incompreendido e atacado e a experiência tão
temida de abandono, de fato, ocorrerá (SCHWARTZ-SALANT, 1989).
Na terapia, é preciso buscar meios mais prudentes de lidar com
essa cisão “bom-mau”, pois, através dela, o borderline consegue manter à
distância os afetos extremamente agressivos. Em geral, a cisão e a idealização
desempenham forte papel nas distorções de realidade que esses pacientes
apresentam. Muitas vezes eles dão um passo importante no sentido da
individuação quando conseguem tolerar o ódio, não apenas o seu próprio, mas
também a experiência de ser o alvo da malignidade alheia. O que está cindido
é o eixo ego-Si-mesmo e, através de processos de projeção, ele distorce a
realidade. A atitude do analista em relação ao Si-mesmo é decisiva para a
restauração do eixo ego-Si-mesmo do paciente.
Nathan Schawartz-Salant (1989) considera que
 (...) outra característica apresentada por esses pacientes é
a utilização de defesas psicóticas como, idealização, cisão,
negação, para evitar o intenso sofrimento psíquico de 
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abandono. Esses mecanismos de defesas psicóticos
passam a existir no lugar de um self funcionalmente sadio,
que é o organizador básico da psique. É óbvio que o self
imanente não está morto, nem totalmente ausente, ele está
encapsulado em um processo psicótico, fraco para se
personificar no funcionamento espaço-temporal. O
terapeuta deve buscar enfrentar as fantasias psicóticas do
paciente, fantasias que distorcem a realidade, assim como
seus padrões de comportamento. É necessário um ato de
fé do terapeuta, para que o indivíduo admita sua loucura,
ao invés de fugir dela, pois o limítrofe só pode imaginar os
perigos da mudança, não as suas recompensas, e sua
vivência da capitulação é uma queda no vácuo ou na
loucura, de onde não haverá retorno.
Quando os mecanismos psicológicos de defesa desses pacientes
são subestimados e tratados como algo que deve ser eliminado ou alterado -
em vez de enfrentado e explorado ativamente diante do excesso de defesas
que negam a dor -, perde-se de vista o Si-mesmo e pode-se desenvolver um
ego mais rígido e defendido.
Esses pacientes estão enredados em níveis psíquicos de extrema
intensidade, que têm íntima relação com muitos dos grandes temas
arquetípicos: luta entre Deus e demônio e entre a vida e a morte; o
renascimento da alma; e, sobretudo o grande drama da união, que encontra
expressão no arquétipo da coniunctio.
 O indivíduo limítrofe está preso, no limbo intermediário, a duas
formas de experimentar o mundo: de um lado o espaço mágico
e mito-poético e, de outro lado, a realidade. Todavia, é de
fundamental importância a percepção terapêutica de que um
padrão arquetípico maior está envolvido. Sua cura exige a
recuperação do estado primordial mito poético, em sua
essência imaginal - uma aventura que requer o desmonte de
estruturas defensivas de negação e distorção, criadas como um
meio de sobrevivência. O problema fundamental não são os
estados irracionais que derivam do paciente ou do terapeuta. O
problema é o campo interativo que pode entrar em estado de
fusão ou de frio distanciamento, que impede uma compreensão
empática (SCHWARTZ-SALANT, 1989).
A meta inconsciente dos pacientes borderline é a
coincidentia oppositorum: o estado no qual os opostos estão unidos, onde a
cisão dolorosa e ilusória pode finalmente ser superada. Para alcançar essa 
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meta, entretanto, é exigida uma viagem através do território da loucura. Este
mundo de loucura é aquele em que a vida interior sofre fragmentação e
confusão, onde o caos prevalece; é a antítese completa da unidade e da
harmonia dos opostos.
É preciso que o analista seja capaz de aguentar a
permanência no estado do não saber e, ao mesmo tempo, não negar a
tentativa de saber. Essa forma de expectativa pode proporcionar uma
experiência profunda das partes psicóticas de uma pessoa, mesmo que não
seja uma experiência agradável ficar em contato com os sentimentos de
estranheza e terror, ausência e indiferença que elas possam provocar.
Situação completamente distinta surge se o analista
consegue se manter nesse lugar de estranheza e terror e compreender o que
ocorre ao paciente quando ele revela a sua loucura. O paciente se sente
apavorado ao exibir essa loucura. Admitir essa loucura é como uma queda no
vácuo de onde não haverá retorno. O mundo da loucura é uma terra de
ninguém, é o caos, um lugar onde os sentidos, as imagens e todo o potencial
de relação são destruídos. Quando o analista pode compreender a loucura
como um aspecto do paciente e consegue sentir o paciente e sua loucura de
um modo pessoal e humano, pode ocorrer uma mudança.
Continuando o pensamento de Nathan Schwartz-Salant (1989),
. O paciente limítrofe suprimiu a capacidade de ver a verdade
emocional muito mais do que a maioria das pessoas, pois, nos
anos iniciais de sua formação, esse tipo de visão era percebido
por ele como extremamente perigosa. O mais comum é que o
paciente tenha conspirado de modo inconsciente com um dos
pais, para não ver o ódio e as características psicóticas dessa
pessoa. Esse “acordo” tácito no sentido de agir como se tudo
fosse normal criou uma sombra escura de ódio e raiva fundida
à necessidade de ser cego tanto às suas próprias
características destrutivas como às dos outros. Portanto, o
fracasso do terapeuta em utilizar esse tipo de visão imaginal
que enxerga o que outros prefeririam manter despercebido
(inclusive muitas vezes os próprios erros do terapeuta) torna-se
uma reconstituição da história do paciente atraiçoando a sua
própria visão.
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Outra característica que chama a atenção é a sensação de
invasão permanente da psique do analista por esses pacientes. Em vários
momentos, o paciente é capaz, inclusive, de ter um tipo de discurso
adivinhatório. Esse processo funciona como se o paciente tivesse a capacidade
de promover uma “varredura” na sombra do analista.
A vivência de vazio e de falta de sentido de vida, resultando em
tedio e depressão, características constantes nos borderline, é consequência
do estrago causado no eixo ego-Si-mesmo, que não pode ser constituído
adequadamente em razão de um ambiente não suficientemente bom na
infância. A constituição do um espaço interno psíquico e sua diferenciação com
a realidade externa foi estruturada de uma forma inadequada nesses
pacientes. A pele que separa esses dois mundos é muito fina, permeável,
passível de invasões. Mas existe uma diferenciação suficiente para permitir
uma manutenção das fronteiras do ego, o que distingue esses pacientes dos
psicótico.
O borderline, por não ter tido as vivências necessárias para a
constituição e delimitação desse espaço interno e tornar-se um sujeito
separado da realidade externa, não consegue formar uma imagem corporal
coerente e nem desenvolver uma identidade própria; sua subjetividade, por
isso, torna-se dependente da subjetividade do outro. Desenvolve, portanto,
uma relação de dependência com o analista muito grande. O analista funciona
nessa relação como um sujeito-subjetivo.
O tratamento desses pacientes consiste em estabelecer uma
condição de regressão em que o analista possa acompanhar a trajetória
defortificação do ego e diferenciação de um Si-mesmo verdadeiro e
organizador da psique como totalidade. Esse acompanhamento deverá ser
constituído de uma atitude de “holding” por parte do analista, em que
simbolicamente exerça uma maternagem suficientemente adequada, dando
suporte psicológico sem invadi-los, dando-lhes os limites necessários para que
se sintam seguros e aceitos e acompanhe-os em seu próprio caminho da
constituição de sua própria subjetividade.
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Uma das feridas centrais dos borderline é não poderem contar
com uma figura de apoio quando necessitam, portanto ficarão constantemente
testando a relação analista-paciente, até conseguirem sentir-se seguros
suficientemente para poderem fazer um mergulho em suas próprias loucuras e
poderem voltar se reconstituindo como pessoas. O analista fica no papel de
humanizador do arquétipo materno/paterno.
O manejo terapêutico desses pacientes requer grande
sensibilidade por parte do analista, pois qualquer sinal de que o analista esteja
se sentindo sufocado ou invadido pela intensa exigência de cuidados por parte
deles será interpretado através de avaliação distorcida da realidade, como
possíveis rejeições ou abandono, e a confiança na relação terapêutica poderá
ser danificada. Durante o tratamento, o analista terá que receber a projeção de
alguém capaz de entender e proteger o borderline. Esse lugar idealizado
necessita ser preenchido pelo analista por um bom tempo para dar segurança
ao paciente para refazer sua história e poder se sentir capaz de enfrentar as
pessoas do mundo real, fora da proteção do consultório.
Compreender as necessidades dos pacientes borderline sem
fazer exigências não é o mesmo que não fazer cobranças, mas tentar oferecer
um espaço próprio de aceitação e subjetividade para que ele possa aos poucos
ir se constituindo. Só após um bom tempo de análise é que, aos poucos, o
analista poderá ir colocando frustações nessa relação para que o paciente
possa entrar em contato com seus sentimentos de ódio e, ao mesmo tempo,
verificar que não destruiu o analista por isso. Dessa forma, será possível
introjetar a noção de objeto bom e o mau em um só e não mais viver esta
cisão.
Não é simples fazer com que o indivíduo borderline enxergue a
outra pessoa. Como está muito voltado para si próprio, tem muita dificuldade
em compreender e aceitar as necessidades alheias. Por mais que necessite do
outro, usa esse outro visando seus próprios interesses e não consegue
percebê-lo como sujeito em suas necessidades.
Devido à fragilidade do ego, esses pacientes têm grande
dificuldade de administrar sua raiva e seus temores, ficando reféns de sua 
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própria impulsividade e não se apropriando de sua própria agressividade.
Nesses momentos de crise, é necessário que o analista possa primeiro
acalmá-lo, escutando-o quantas vezes forem necessárias, para que possa
sentir-se acolhido. Só depois de estabelecida uma relação de acolhimento e
confiança, o analista poderá demonstrar os pontos em que ele tem razão e com
isso assegurá-lo de que não sofrerá um abandono. Finalmente, aos poucos,
poderá ir mostrando os limites, os quais devem ser explicados com paciência e
repetidos quantas vezes forem necessárias. Os pacientes ou indivíduos
borderline necessitam de limites para sentirem-se seguros. É importante
colocar os limites de forma precisa e clara para que esses indivíduos não
entendam isso como rejeição e abandono.
O borderline, quando está mais agressivo, na verdade, está com
muito medo; medo de ser abandonado. A impulsividade deles está ligada à
sensação de vazio e de falta de sentido de vida. Quando se sente sozinho e
sem apoio, entra em desespero e utiliza impulsividade para dar vazão a essas
sensações que muitas vezes o coloca em situações de risco. O sofrimento
nesses momentos pode ser tão intenso e insuportável, que o suicídio torna-se
uma opção possível.
Hegenberg (2009) afirma que,
 Na verdade, o borderline é pessoa frágil, que agride por total
desespero. Sua violência ocorre quando se sente sozinho e
incompreendido. Quando se sente abandonado, agride como
forma de expressão.
A análise do vazio, do tédio e da falta de sentido da vida deve ser
uma constante no processo psicoterapêutico desses pacientes, pois esta é
uma das maneiras deles se sentirem acompanhados, apoiados e
compreendidos na profundidade de sua dor.
Cada paciente escuta as palavras do analista da maneira como
pode ouvir, o que não corresponde necessariamente ao que o analista disse ou
quis dizer. A interpretação nos primeiros estágios do tratamento deve ser
evitada, pois no momento inicial não tem efeito nesses pacientes, que centram
sua atenção somente na proximidade com o analista e no estabelecimento do 
43
vínculo. Aceitar e acolher o momento regressivo inicial é importante para a
solidificação da relação terapêutica em que o borderline possa passar a sentirse
seguro.
Essa dificuldade de escuta por parte do bordeline não se dá por
má vontade, mas sim porque qualquer observação pode ser sentida por eles
como uma invasão, um ataque. Só com tempo e confiança na relação
transferencial é que vão conseguindo suportar melhor o vazio, tédio e a falta de
sentido da vida, tornando-se capazes de sustentar seu sofrimento, sua dor em
nível psíquico.
O analista tem que tomar muito cuidado para não agir com o
paciente e tentar aliviar sua angústia. É muito fácil para o analista ficar tentado
a assumir um lugar onipotente como o único capaz de salvar seu paciente e
passar a tomar iniciativas e tentar fazer coisas por ele. O tratamento dos
pacientes borderline requer o máximo da contratransferência do analista, o qual
é, o tempo todo, arremessado em direção a um mundo caótico com padrões
arquetípicos vividos sombria e desorganizadamente.
É extremamente necessária ao analista a percepção de que um
arquétipo maior está envolvido para não ficar preso nesse limbo, no caos e na
fragmentação que é a psique desses pacientes. Eles esperam pelo vazio, pelo
abandono. Por mais que esperem pelo “objeto bom”, o temor de que ele não
exista é maior. Será necessário que o analista mergulhe junto com o paciente
nesse sentimento de ausência para que possa emergir aos poucos um
fragmento de autenticidade do paciente.
Jung insiste que somente sendo afetado pelos afetos é que se
pode chegar a conhecê-los e transformá-los. Os processos inconscientes de
idealização maciça dos pacientes borderline podem levar o analista a sentir-se
extremamente inseguro e, em uma manobra inconsciente de compensação,
levá-lo a tornar-se inflado para livrar-se do paciente e desfazer dessa sensação
induzida de impotência.
Schwartz-Salant (1989) explica que
44
 (...) chegamos à idéia de que toda a vida do arquétipo da
coniunctio é a de um processo dinâmico, em que a junção e a
separação dos opostos alternam com o propósito final de criar
uma forma combinada que transcenda os objetos originais. O
arquétipo da coniunctio carrega em si mesmo significação e
propósito que abrangem tanto a mente quanto o corpo.
O numinoso experimentado pelo borderline como parte de sua
vida cotidiana manifesta só sua face fortemente negativa, enquanto que o outro
lado de sua face, sua natureza positiva, não consegue se manifestar. Ele fica
preso no limbo intermediário entre a realidade exterior e um mundo interior
conhecido através de identificações distorcidas com os arquétipos. Muitos
analistas recuam frente ao desespero de penetrarem nesse domínio porque se
sentem ameaçados de perder sua própria identidade e de cair no vazio caótico
que destrói as ideias.
Sem o conhecimento de suas limitações, sem a percepção
consciente de sua condição humana, o contato com o numinoso pode levar a
um estado de inflação. Somente quando o analista tem a coragem de ver sua
própria escuridão e sua sombra é que se torna capaz de lidar com a sombra de
seu paciente. E apenas quando o paciente adquire a confiança necessária para
entrar em contato com a sombra do seu analista é que vai poder admitir a
própria natureza destrutiva sem se sentir ameaçado de desintegração.
Através da identificação projetiva, pode-se ter acesso aos campos
interativos das relações e pode-se transformá-los. Jung via o estado de fusão e
o dinamismo da identificação projetiva como condições perigosas onde a
identidade poderia ser perdida em meio à interação das psiques. É necessário
que o analista se distancie de sentimentos de extrema intensidade para que
não passe a atuar as fantasias do paciente e deixe de reconhecer as projeções
que estão sendo feitas.
Se o analista conseguir que sua imagem seja introjetada na
psique do paciente e que a imagem do paciente seja introjetada nele, o
paciente pode ter a experiência imaginal de estar contido no analista tanto
dentro como fora da sessão, e poderá sentir uma espécie de afinidade que o
encorajará a expor pontos vulneráveis. Winnicott (1975), para quem a
coniunctio requer um clima de acolhimento, explica que
45
 O ato de vivenciar a coniunctio como uma realidade imaginal do
aqui e agora pode concorrer para a cura das partes loucas da
psique em que predomina a irracionalidade, onde o
pensamento é fragmentado e se perdeu a sensação de
continuidade pessoal. /.../ Uma mãe pode curar ou corrigir
rupturas na estrutura psíquica e restabelecer a capacidade do
bebê de usar o símbolo de união.

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4.2. Teoria do Apego no trabalho terapêutico
Um conhecimento completo dos efeitos dos transtornos ocorridos
nos primeiros vínculos afetivos dos bebês é fundamental para uma
compreensão mais abrangente dos pacientes borderline. Devemos levar
seriamente em conta os eventos que ocorrem nos primeiros meses de vida.
Bowlby (2004) frisa que
 (...) a avidez das crianças pelo amor e a presença da mãe
é tão grande quanto a fome de alimento, e que,
consequentemente, sua ausência gera inevitavelmente um
poderoso sentimento de perda e de raiva.
O comportamento de apego é uma característica arquetípica do
ser humano e um dos comportamentos mais determinantes no
desenvolvimento psíquico dos indivíduos. É claro o quanto uma criança sentese
segura e tranquila quando está na presença de uma figura incontestável de
apego e a perda real dessa figura gera ansiedade e leva a uma tristeza
profunda, podendo despertar a raiva e a cólera. Essa figura de apego está
muito mais ligada a sensações de conforto e contato do que à própria
alimentação, como já citamos anteriormente. E quanto mais inseguro for o
padrão de apego do bebê com sua principal figura de apego, mais inibido ele
será para desenvolver relações afetivas com outras pessoas. O
comportamento de apego não desaparece na infância, mas persiste durante a
vida toda.
Vários autores, entre eles Bowlby (2002a) e Fordhan (1994), em
suas pesquisas chegaram a comprovar a importância da figura materna bem
como do ambiente na saúde mental dos indivíduos, sendo a causa de vários 
46
distúrbios, entre eles: a tendência para exigências excessivas no
relacionamento com os outros, a ansiedade e raiva quando essas exigências
não são satisfeitas, além de um bloqueio na capacidade de estabelecer e
manter relações profundas.
O paciente borderline vivenciou experiências com mães que
muitas vezes não estavam presentes emocionalmente, apesar de estarem
fisicamente. No setting terapêutico é essa presença emocional de um analista
inteiro como pessoa que eles requerem. Se o analista conseguir desenvolver
nesses pacientes um padrão de comportamento seguro, poderá capacitá-los a
se afastarem de situações potencialmente perigosas ou abusivas e buscarem
se manter em situações potencialmente seguras.
A personalidade adulta é compreendida como um produto das
interações entre o indivíduo e certas figuras-chaves, ocorridas durante todo o
seu desenvolvimento; entre essas interações destacam-se as que são
processadas com as figuras de apoio. O modelo de apego desenvolvido está
diretamente ligado ao modelo do “eu”. Sendo assim, uma criança desprezada
tende não a apenas sentir-se não amada pelos pais como ainda a crer que é
essencialmente indesejada por todas as outras pessoas. Contrariamente, uma
criança muito amada pode crescer confiando não só no amor dos pais como
achando-se digna de afeição de todos.
Ver o paciente borderline como imaturo muitas vezes pode levar o
analista a desenvolver atitudes de proteção a ele, ao invés de mostrar que suas
atitudes são produto legítimo de uma experiência amarga no processo do seu
desenvolvimento, que seu comportamento de apego recebeu respostas
inadequadas ou inapropriadas a suas necessidades e que, portanto passou a
acreditar no decorrer de sua vida na premissa de que todas as figuras de
apego provavelmente não estarão disponíveis.
Durante o trabalho terapêutico, não é raro observarmos
contradições grosseiras entre as observações feitas pelos indivíduos borderline
em relação aos seus pais e o que está implícito em alguns episódios que eles
narram, sobre a maneira como realmente seus pais se comportaram ou o que
foi dito em determinadas ocasiões. É muito doloroso para eles reconhecer que 
47
a mãe ou o pai, devido a seus próprios interesses, explora, é injusto ou tirano
com o próprio filho ou admitir, até mesmo, que nenhum deles realmente gostou
do filho.
Não raramente a raiva é desviada da figura de apego que a
provocou, voltando-se para o próprio paciente na forma de autocríticas
injustificáveis. Devido à ameaça de não ser amado ou de ser abandonado, o
paciente é levado a acreditar que não deve perceber o tratamento hostil que
lhe dão seus pais ou, se o fizer , deve considerar este comportamento apenas
como uma reação justificada do pai ou da mãe ao seu mau comportamento.
É tão assustador admitir isso, que sempre haverá uma tendência
de o paciente buscar ver o comportamento dos pais por um prisma mais
favorável. Às vezes, o contrário também pode ocorrer e o paciente descrever
vivências com pais terríveis, mas os fatos observados e até mesmo os relatos
contradizem essa descrição. Por essas razões, é importante estimular o
paciente a lembrar-se de fatos concretos o mais detalhadamente possível.
Dessa forma, durante a análise, será possível reavaliar com todos os
sentimentos envolvidos quais foram os desejos, sentimentos e
comportamentos de cada um em cada ocasião envolvida, porque, a partir
dessa reavaliação, é possível corrigir ou modificar imagens armazenadas que
estão em desacordo com as evidências históricas e correntes (BOLWBY,
2004).
Embora frustrado, a raiva é vista como um esforço evidente
realizado pelo paciente que sofreu o abandono, com o objetivo de restabelecer
um elo que foi rompido. Enquanto a raiva continua, o que parece é que a
hostilidade ou o abandono não são aceitos como permanentes e persiste uma
esperança de que será amado pelos pais em algum momento. A solidão
emocional vivida só poderá ser remediada com um envolvimento numa relação
de dedicação mutua. O processo terapêutico é uma dessas relações, a partir
do qual ele pode passar a acreditar e vivenciar uma relação de apego seguro.
Os pacientes borderline que estabelecem apegos angustiosos e
ambivalentes provavelmente sofreram interrupções da assistência paterna ou
materna e/ou muitas vezes foram rejeitados pelos pais. É mais provável que 
48
essa rejeição tenha sido intermitente e parcial do que total. Consequentemente,
esses pacientes ainda têm esperança de obter amor e cuidado e, ao mesmo
tempo, sentem-se profundamente angustiados com a possibilidade de serem
esquecidos ou abandonados. Com isso, aumentam suas exigências de atenção
e afeto, recusando-se a ficarem sozinhos, e protestando com raiva quando isso
acontece. Esses pacientes passam a acreditar, de maneira inquestionável, que,
se alguma coisa acontecer à mãe ou ela desaparecer, a culpa será totalmente
sua (BOLWBY, 2004).
Bolwby (op.cit.) alerta que
 É muito fácil provocar um sentimento de culpa insistindo
com a criança, desde tenra idade, que seu mau
comportamento está fazendo com que sua mãe (ou pai)
fique doente, e que ela (ou ele) poderá até morrer se isso
continuar. Isso leva ao exame das experiências infantis das
pessoas crescerem evidenciando uma compulsão a cuidar
de outros.
O paciente borderline que foi abandonado, ignorado ou
desprezado acaba por apresentar alteração em seu comportamento de apego
e sufoca seus sentimentos, passando a considerar, como os pais, o seu anseio
de amor como fraqueza, sua raiva como um pecado e seu sofrimento como
infantil.
O padrão de apego observado entre indivíduos borderline, como
já dissemos anteriormente, é caracterizado por insegurança e ansiedade, com
episódios de perdas importantes ou abusos cometidos por uma figura de
cuidadores. No âmbito das relações parentais, temos uma situação de
desenvolvimento de vínculos absolutamente inadequados. Temos aqui pais
que não estruturaram corretamente nenhum dos papéis parentais.
Tendo os conceitos de Edinger como pano de fundo para as
reflexões aqui empreendidas, entendo que os pacientes borderline apresentam
o eixo ego-Si-mesmo danificado. Devido a esse comprometimento,
impressionam-se na psicoterapia com a aceitação de si por parte do analista.
Inicialmente, essa aceitação tende a ser vivenciada com desconfiança, porém,
quando essa aceitação passa a ser reconhecida como um fato, a transferência 
49
muda de padrão e passa a ser vivida de forma intensa. Esse novo padrão de
transferência parece ser a projeção do Si-mesmo em sua função de órgão de
aceitação. As características centrais do terapeuta-Si-mesmo tornam-se
proeminentes e as sessões terapêuticas tornam-se os momentos centrais da
semana. Onde antes só havia caos e desespero surge aos poucos um centro
de significado e ordem e começa a reparação do eixo-ego-Si-mesmo. A
experiência de aceitação não só repara o eixo ego-Si-mesmo, como reativa a
identidade residual entre eles (EDINGER, 1996).
O papel do analista com esses pacientes passa a ser de extrema
importância para ajudá-los a compreender e superar suas experiências de
abandono e traumas através do desenvolvimento de um espaço interno seguro
que Feldman (2004) chama de função primária da pele psíquica. Com o
desenvolvimento dessa função, gradualmente esses pacientes vão começar a
desenvolver a capacidade de diferenciar a experiência interior da realidade
exterior e poder vivenciar de maneira mais segura essas duas realidades.
Podemos pensar que a função simbólica do analista é que poderá fazer essa
ponte.
50

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4.3. Experiência Prática
“(...) o que foi posto a perder com um pai só pode ser refeito
por um pai, e o que foi posto a perder pela mãe só pode ser reparado por
uma mãe”
C. G. Jung
Como já mencionado anteriormente, os pacientes com transtorno
de personalidade borderline são considerados pacientes difíceis de serem
tratados e com dificuldades de aderência e vinculação aos tratamentos. Alguns
estudos de acompanhamento em longo prazo, como o feito por Paris & ZweigFrank
(2001, apud BRADLEY, 2010), sugerem uma melhora global dos
sintomas desses pacientes após a terceira ou quarta décadas de vida,
tendendo o transtorno a “desaparecer” com a idade. Contudo, alguns pacientes
podem voltar a ser sintomáticos, na meia-idade, devido a separações, divórcio
ou morte do conjugue. Os tratamentos psicoterapêuticos apresentam melhores
resultados do que os só medicamentosos.
O processo analítico, por sua interação com outro ser humano,
facilita a experiência emocional necessária para o crescimento e
desenvolvimento dos pacientes borderline. Tratar esses pacientes realmente
não é fácil, por suas oscilações de humor repentinas, pela invasão psíquica
que proporcionam em nossa psique, pelas exigências de atenção constante,
apenas para citar alguns fatores. Entretanto, ao mesmo tempo, é muito rico
quando conseguimos realmente nos colocar como pessoa no setting e
conquistar sua confiança.
As abordagens psicodinâmicas partem do pressuposto de que o
transtorno de personalidade borderline se deve a uma alteração do
desenvolvimento, no que acredito e venho justificando através desse trabalho.
A única maneira de entender o transtorno é através do conhecimento de como
se deu esse desenvolvimento que levou o paciente a perceber a si e aos
outros, a regular suas emoções e seus impulsos de forma distorcida.
51
A transferência/contratransferência é uma condição sinequa non,
é o ingrediente vital onde as transformações podem ocorrer. Nos pacientes
borderline, uma parte de sua psique pode atingir certo grau de maturidade nas
relações interpessoais, todavia, grande parte está presa simbioticamente em
vivenvias arcaicas ligadas aos arquetipos ou em padrões solidificados de visão
falida do casal parental, sem humanização destes.
Através da transferência/contratransferência, compreendemos
melhor a história pessoal do paciente e o desenvolvimento de sua psique.
Como analistas, carregamos a projeção do Si-mesmo permanencendo assim
idealizados. A desfragmentação do paciente é introjetada na
contratransferência sintônica. Durante a análise, ajudamos o paciente a
compreender e integrar o material de uma forma nova, possibilitando, assim,
uma restauração do contato com o Si-mesmo como fonte de força e aceitação.
Não podemos mudar as experiências vividas pelos pacientes,
nem podemos reconstruir o período inicial de sua vida no processo terapêutico,
mas podemos possibilitar um tipo diferente de experiência.
Comecei a trabalhar com esses pacientes em 2009 no
ambulatório de transtorno de personalidade borderline do PROVE, na
UNIFESP, junto com o Dr. Álvaro Ancona de Faria. Após um período de
acompanhamento dos atendimentos junto com ele, iniciei os atendimentos
psicoterapêuticos individuais.
Como já explicitado, para fazer os atendimentos desses
pacientes, contei com uma supervisão constante de cada caso e me baseei no
aporte teórico da Psicologia Analítica, nos conceitos apresentados por Nathan
Schwartz-Salant em seu livro A personalidade limítrofe – visão e cura, na
monografia intitulada Transtorno de Personalidade Borderline – uma
perspectiva simbólica apresentada na SBPA pelo Dr. Álvaro A. de Faria (1995),
e em outros textos escritos e publicados por esse autor. Utilizei também
conceitos e técnicas de alguns autores psicanalíticos, principalmente de Otto
Kenberger (1991a) e Peter Fonagy (2004). 
52
Na prática do atendimento desses pacientes, por ser bem
peculiar, fiz uso de algumas técnicas especiais descritas por profissionais com
larga experiência no atendimento de pacientes borderline. A seguir, farei um
breve relato de características especificas de psicoterapia apresentadas por
esses estudiosos psicanalistas e, na sequência, discorrerei sobre minha
experiência.
Otto Kernberg (1991), um dos pioneiros no tratamento dos
pacientes borderline, enfatiza a importância da psicoterapia para esses
pacientes com o objetivo de
(...) aumentar a capacidade do paciente borderline de
experienciar o self e os outros como coerentes, integrados,
indivíduos que possam ser percebidos realisticamente, e
reduzir a necessidade de usar defesas que enfraqueçam a
estrutura do ego, reduzindo o repertório de respostas
disponíveis. Consequentemente, pode se esperar que o
paciente desenvolva uma maior capacidade de controlar
impulsos, tolerar ansiedade, modular afetos, sublimar
necessidades pulsionais, desenvolver relações interpessoais
estáveis e satisfatórias e experienciar intimidade e amor.
Para alcançar esses objetivos, é necessário inicialmente clarificar
os aspectos dissociados da psique para poder integrá-los. É necessário
enfatizar o “aqui e agora” durante a maior parte do tempo das sessões, fazendo
a ligação de determinadas manifestações conscientes a determinados
conteúdos inconsciente. O analista faz a ponte entre os comportamentos
presentes na sessão ao comportamento na realidade externa dos pacientes e a
realidade recordada da infância.
A clarificação, segundo Otto Kernberg, é o primeiro passo
cognitivo no processo de interpretação. Na clarificação, o paciente é convidado
a explorar conteúdos que sejam vagos, surpreendentes ou contraditórios, com
o objetivo de explicar esses conteúdos específicos e descobrir até que ponto o
paciente esta entendendo. Com o aumento na consciência e no entendimento
das distorções e das expectativas que o paciente traz para os relacionamentos,
poderá ter visões mais coerentes e integradas de si mesmo e dos outros, o 
53
que, por sua vez o capacitará a regular mais suas emoções, no decorrer do
tempo.
Peter Fonagy (2000), tendo como base os conceitos da teoria do
apego desenvolvida por J. Bolwby (2002b) desenvolveu uma abordagem
considerando o modelo de formação de uma capacidade reflexiva do ser
humano e suas interações com o transtorno de personalidade borderline.
Um dos objetivos dessa abordagem é ajudar os pacientes a
identificar e entender suas emoções por meio de esclarecimento e da
denominação delas, do entendimento dos seus principiantes imediatos, do
entendimento das emoções no contexto dos relacionamentos atuais e do
passado, do aprendizado da expressão apropriada das emoções e do
aprendizado do entendimento das respostas que os outros apresentam com
maior probabilidade em reação à expressão emocional do paciente (BATEMAN
& FONAGY, 2003). O analista mantém durante as sessões uma “postura de
mentalização”, focando e discutindo os estados mentais do aqui e agora do
paciente e dele próprio. As interpretações da transferência são mantidas
simples e dizem respeito a circunstâncias relativamente imediatas ou de
“experiências próximas” (O’DONOUHUE, 2010).
Mentalização é a capacidade de identificarmos e diferenciarmos
estados mentais próprios e do outro, implícita e explicitamente, em termos de
desejos, sentimentos e crenças. Permite o desenvolvimento da capacidade de
regulação emocional, do autocontrole e da atenção adequada. Através dessa
capacidade, aprendemos a “ler” os estados mentais alheios e a separá-los dos
nossos próprios, podendo fazer a distinção do eu/outro e desenvolver a
subjetividade.
Os pais são os primeiros a oferecer à própria criança, através de
um movimento especular, o desenvolvimento da primeira “consciência de si
própria”, que se dá por meio da representação de estados mentais.
Posteriormente, essa consciência pode ser ampliada, abrangendo o outro. Tais
processos, no entanto, só vão ocorrer num contexto de cuidados e segurança.
O desenvolvimento de um padrão seguro de apego, além de permitir o 
54
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desenvolvimento da capacidade de simbolização, capacita também o
funcionamento psíquico da mentalização na criança.
As principais características desse método baseiam-se na ideia
de uma psicoterapia reconstrutiva que possa promover uma transformação
estrutural dos pacientes que não puderam desenvolver adequadamente sua
personalidade em virtude do estabelecimento de relações e vínculos parentais
comprometidos. Dentro das modificações propostas nesse método,
encontramos uma maior definição dos limites do setting e das questões
relativas ao estabelecimento claro do contrato, visando diminuir a interferência
das manipulações e vivências paranóides do paciente.
Outra característica dessa abordagem é a mudança no papel do
analista, de uma postura mais neutra para um comportamento mais
participativo com os pacientes borderline. Utilizamos a clarificação como
instrumento principal durante os primeiros estágios da psicoterapia, deixando a
interpretação para estágios posteriores. Inicialmente, o foco das interpretações
se dá preferencialmente no “aqui-agora”. Nesse processo, o analista trabalha
com o paciente na identificação de seus estados mentais, visando à
modificação de padrões de apego estabelecidos na infância pelas experiências
terríveis com os cuidadores, através de uma atitude de continência.
As primeiras sessões de atendimento de pacientes borderline
foram muito difíceis para mim. Suas histórias de vida eram muito tristes,
realmente já haviam passado por vários profissionais que não haviam feito um
diagnóstico correto, encaminhando-os a tratamentos que não surtiram
resultados. Eles chegaram bem ariscos e arredios.
Os pacientes borderline que atendi chegavam totalmente
defensivos, com um discurso interrogativo e avaliador, tentando avaliar quão
presente eu estava durante as sessões e quanto podiam se sentir seguros e
confiar nessa relação. Só após um tempo de análise, passavam a confiar e
começavam a trazer suas histórias e segredos. A confiança, porém, era muito
tênue e constantemente tinham necessidade de se assegurar da veracidade
desse vínculo. Assim, as histórias eram contadas permeadas pelo medo de
não serem mais aceitos e de serem abandonados. 
55
Esses medos são consequências das vivências que tiveram
durante seu desenvolvimento de negligência, abusos, rejeições, abandono da
falência da imago parental. Para sobreviverem, tiveram que desenvolver
mecanismos de defesa e os utilizam de forma maciça com o objetivo de
proteção do ego frágil que possuem e do medo de desintegração frente a
novas vivências de abandono e rejeição.
Os indivíduos borderline buscam em suas relações interpessoais
a sensação de viverem simbioticamente sem a possibilidade de perdas ou
separações. A busca é pela vivência urobórica do paraíso eterno. Por isso
acredito que meu papel como analista inicialmente deve ser o de dar
continência, proporcionar um ambiente de aceitação para que o paciente possa
fazer uma regressão até esse espaço urobórico, podendo iniciar uma vivência
de aceitação e segurança para, aos poucos, fortalecer seu ego e poder
começar a diferenciar, a perceber os mundos interno e externo como duas
realidades diferentes, porém não excludentes.
Vivenciei concretamente a sensação de um abismo sem fundo, de
um vazio enorme durante várias sessões de atendimento desses pacientes.
Houve momentos em que não conseguia me diferenciar, parecia que o setting
terapêutico estava totalmente contaminado e a imagem que surgia em minha
mente era a de um rio lamacento inundando tudo. Nesses momentos, acredito
ter vivenciado uma invasão psíquica que, segundo Jung, é muito perigosa pela
possibilidade de nos vermos identificados com a psique do paciente,
começando a atuar os dramas interiores deles. A falta dos limites dentro-fora,
entre o eu-outro ficou muito claro. Percebi nesses momentos a importância de
uma boa supervisão para nos tirar desse lugar e nos ajudar a fazer as
diferenciações necessárias, as quais, muitas vezes, não conseguimos perceber
por estarmos mergulhados no processo.
A ambiguidade se manifestou no setting terapêutico em
momentos em que era projetado no papel do analista o grande e único
salvador para, logo em seguida, ser desidealizado e agredido como causador
de todos os problemas. A dificuldade que senti nesses momentos era de não
me identificar com nenhum dos papéis, passando a atuar a partir deles, 
56
tentando resolver os problemas pelos pacientes ou sentindo-me totalmente
incompetente.
O processo terapêutico de alguns pacientes foi marcado por muita
descontinuidade. Após uma sessão em que entravam em contato com suas
histórias e seus dramas interiores, ou em que faziam confissão de algo
significante, faltavam por uma ou duas sessões seguidas. A impressão que
ficava é que precisavam de um tempo para se organizar novamente e poder
retornar. Às vezes surgia vergonha pela exposição de “segredos”. Sempre
ficava claro e presente o medo de não serem aceitos e sofrerem um novo
abandono.
Ao mesmo tempo em que alguns pacientes traziam suas
ambiguidades, fragilidades e seus medos, parecia haver certa dificuldade na
aderência ao tratamento, interrompendo medicações. Quando eu ressaltava a
importância de estarmos sintonizados à medicação e à psicoterapia, repetiam
que não gostavam de tomar remédio ou mentiam, dizendo estar tomando, o
que era desmentido tempos depois. Não se comprometiam com os horários,
chegavam às vezes atrasados ou faltavam com muita frequência. Quando eu
falava sobre esses problemas, e colocava algumas imposições e limites, estes
eram seguidos por um determinado tempo e logo esquecidos, voltando ao
padrão anterior. Nesses momentos é importante que o contrato terapêutico
tenha sido estabelecido muito claramente e detalhado com esses pacientes,
para que possamos voltar sempre a ele e reforçar o compromisso assumido.
Houve atendimentos em que a agressividade emergiu com muita
intensidade e, algumas vezes, não dei conta, precisando, inclusive, interromper
a sessão para retornar na semana seguinte. Algumas vezes optei por mudar o
setting terapêutico de alguns casos, fazendo o atendimento na sala de terapia
infantil com recursos para atividades expressivas. Decidi fazer uma sessão
diferente e provocar um processo regressivo, indo para o lugar da infância, do
lúdico e da brincadeira. Nesses momentos apresentava vários materiais, para
que escolhessem o que fazer. Surpreendi-me com a reação de alguns
pacientes, que rapidamente entravam no jogo, os olhos brilhavam, escolhiam
materiais para pintar e me incluíam em suas brincadeiras, pedindo para que eu 
57
Resultado de imagem para personalidade borderline famosos
pintasse ou desenhasse também. Aos poucos, começavam a falar de seus
problemas e medos naturalmente e ouviam minhas intervenções, refletindo
sobre nossas falas. Percebia que nessas sessões, o tempo todo, o emocional
permeava o setting. Nesse momento instalava-se uma relação transferencial
positiva e eram dados os primeiros passos para entrarmos no mundo imaginal
e sairmos da concretude, dando espaço para que vivências passadas
pudessem ser ressignificadas. Mas havia pacientes que não conseguiam entrar
nesse tipo de relação, esquivavam-se e até mesmo se recusavam a participar
de atividades mais lúdicas.
Ao utilizar do desenho e da pintura para expressar os medos, a
agressividade e a raiva, abria-se no setting terapêutico a possibilidade de falar
desses sentimentos de uma forma simbólica e menos invasiva para alguns
pacientes borderline. No entanto, isso não era regra para todos pacientes;
enquanto alguns respondiam bem e com alguns avanços, outros se defendiam
e os mecanismos de defesa ficavam mais acionados.
Alguns pacientes traziam ou buscavam constantemente o desejo
que eu fosse a mãe deles ou que os adotasse, chegando a verbalizar tal
desejo. Nesses momentos, constatei a importância da regressão e da projeção
da imago da mãe boa na busca de uma relação fusionada no processo
terapêutico para permitir que essa relação possa ser constituída de uma
maneira diferente e possa aos poucos liberar os impasses e a atrofia das
constelações arquetípicas.
Nos relatos de anamnese dos pacientes borderline, observamos
vivências de abandono, negligência, violência e abusos desde a tenra idade.
Isso demonstra claramente que o desenvolvimento psíquico desses indivíduos
não ocorreu de forma contínua e adequada, proporcionando a eles dificuldade
na diferenciação entre o ego e o Si-mesmo, mantendo-os em uma relação
fusionada.
Nos momentos em que os sentimentos de vazio, tédio, rejeição
ficam mais críticos, a maioria dos pacientes borderline faz uso da automutilação
e se corta. Eles dizem sentir prazer com a dor e com a visão do 
58
sangue escorrendo, o que lhes daria a sensação de estarem vivos e de terem
um limite. Nesse sentido, a dor do corte minimizaria a sensação do vazio.
Em muitos momentos, traziam claramente o quanto era
insuportável aguentar o sentimento de vazio. Muitas vezes surgia o desejo de
se matar e alguns realmente colocaram sua vida em perigo. Nesses episódios,
constatei a importância de estar trabalhando em parceria com o psiquiatra; eu
constelava o papel da mãe acolhedora, colocando limites através de acordos, e
o psiquiatra colocava os limites mais claros, rígidos e determinados,
constelando o papel do pai discriminador e, inclusive, ameaçando de não mais
dar continuidade ao tratamento se eles continuassem a atentar contra a vida
nos momentos mais críticos.
Houve atendimentos em que me identifiquei com o drama interior
do paciente e fiz alguns acting-out, identificando meu paciente com o papel de
vítima e eu com o de sua defensora. Só depois da supervisão consegui
perceber minha atuação em defesa deles, e como eu os colocava no lugar de
uma criança frágil e indefesa, não percebendo que hoje já são adultos,
atraentes e sedutores. Portando, tinham também que rever suas atitudes e
assumir a responsabilidade por eles próprios, percebendo que, quando eram
realmente crianças, não possuíam ferramentas para se defender, mas que,
naquele momento, sabiam e podiam se defender.
Segundo Lambert (1981, apud MATCHTIGER 2005)
 A terapia fornece a oportunidade de repara ou reconstruir o
dano representado pelo distúrbio dos fronteiriços entre o ego e
o eu e entre o eu e o outro (...) a tenra infância pode ser
analisada “não só para reparar o dano com uma subsequente
liberação do desenvolvimento atrasado como também permitir
ao paciente ligar-se emocionalmente a sua infância e (...) mais
realisticamente ao Arquétipo da Criança Divina”. (...) os pais
verdadeiros precisam ser distinguidos dos arquétipos. O
fronteiriço pode ver-se imerso em ódio e rebeldia contra os
pais, ao mesmo tempo em que os idealiza. O meio continente
da transferência/contratransferência cria o espaço interior
necessário para “a delusão” de unidade entre analista e
analisando (LAMBERT, 1981). 
59
O analista, nos momento de regressão no processo terapêutico,
pode ajudar o paciente a entrar em contato com o Si-mesmo no polo de
aceitação. A imagem do casal parental danificada durante o desenvolvimento,
ou seja, sua não humanização, pode ser substituída por uma imagem de
plenitude por meio da projeção da imagem parental no analista. Conforme
pontuou Jung (1997), “(...) o que foi posto a perder com um pai só pode ser
refeito por um pai, e o que foi posto a perder pela mãe só pode ser reparado
por uma mãe”. Somente quando o paciente puder ter a experiência de
reconstruir uma relação positiva com uma imago parental, poderá se libertar do
limbo onde está preso, no polo negativo, destrutivo do arquétipo.
Durante o atendimento de alguns pacientes, ao constelar o
Arquétipo da Grande Mãe, acredito ter proporcionado momentos de relação
simbiótica, estabelecendo momentos de continência e acolhimento. Houve,
porém, episódios de muita agressividade, com os quais acredito não ter
conseguido lidar, demonstrando minha insegurança e medo; atitudes que
podem ter sido interpretadas por eles como abandono e não aceitação esse
pode ter sido o motivo de algumas de suas ausências em determinadas
sessões.
Muitas vezes, a própria atitude desses pacientes pode dificultar a
constelação da Grande mãe, positiva. A dificuldade de criar vínculos, o olhar
distorcido da realidade, as deficiências de empatia, as atitudes agressivas, os
ataques à psique do analista e as exigências constante de atenção podem
dificultar a possibilidade de nos tornarmos “analistas suficientemente bons”.
Precisamos estar em contato empático real com o paciente para que tenham a
oportunidade de reparar os danos existentes no eixo ego-Si-mesmo.
Como temos visto, inicialmente, nos pacientes borderline, ocorreu
falha no meio e insuficiências parentais crônicas e repetitivas no atendimento
de suas necessidades de desenvolvimento e amadurecimento. Como
mencionado anteriormente, essas falhas acabam levando à constituição de um
ego frágil e ao desenvolvimento de defesas muitas vezes rígidas, a ponto de
comprometerem a plasticidade de sua psique. 
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Resultado de imagem para personalidade borderline famosos
Como analistas, devemos nos propor a receber essa projeção
maciça do papel da Grande mãe e acompanhar a trajetória de nosso paciente
nesse processo de ressignificar as falhas existentes em seu desenvolvimento
para poder ir fortalecendo seu ego, diferenciando-se do Si-mesmo e ir
reconstruindo o eixo ego-Si-mesmo, a comunicação entre o consciente e
inconsciente. A aceitação dessa projeção algumas vezes pode se tornar muito
árdua, pois temos que estar o tempo todo atendendo as necessidades do
paciente. Devemos também aceitar muitas vezes nossas limitações e deixar
isso claro a eles, para que não se sintam abandonados e possam diminuir a
idealização projetada sobre nós.
Jung enfatiza a importância de reviver os eventos da infância para
poder integrar fragmentos na consciência adulta. “O subir e descer escadas ao
lado do pai e da mãe representa a conscientização de conteúdos infantis que
ainda não foram integrados” (JUNG, 2007). O borderline, por não conseguir ver
o outro como um ser independente de suas necessidades e desejos, vai
esperar dos relacionamentos mais importantes uma relação maternal,
cuidadora constante, buscando muitas vezes na transferência um estado de
simbiose, de fusão, como já dissemos.
No início do processo terapêutico, o estabelecimento de uma
relação simbiótica é até necessária porque facilita a exposição dos afetos e de
imagens arquetípicas em torno de fantasias, lembranças e imagens
inconscientes que podem invadir o ego para serem diferenciadas através da
identificação projetiva com o analista e, por fim, integradas de modo simbólico.
O campo terapêutico facilita a emergência de um campo simbiótico necessário
à liberação das imagens arquetípicas.
Nos estágios iniciais da transferência/contratransferência, o
analista é sentido como um objeto transicional e não como uma pessoa
diferenciada. A fantasia pelo estado de fusão está muito presente. Só quando o
analista consegue frustrar essa fantasia sem que o estado empático e de
confiança seja quebrado é que o paciente poderá iniciar seu processo de
diferenciação, porque a perda da ilusão dessa fantasia de fusão ou de simbiose 
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é um grande perigo para os pacientes borderline. Eles igualam essa perda à
perda de sua identidade e à loucura e julgam esse estado intolerável.
Uma das formas que encontrei para começar a quebrar essa
fantasia fusional foi esclarecer meus próprios limites e sentimentos que iam
surgindo durante as sessões, clarificando as emoções e procurando nomear as
percepções e sentimentos que o paciente trazia, relacionando-os com o “aqui e
agora”, dentro de um ambiente de continência permanente.
O objetivo principal no tratamento desses pacientes é realmente
criar um ambiente empático para que a confiança possa ser constelada e o
afeto demonstrado. Com isso, a relação simbiótica inicial pode ir se
desfazendo, sem que a relação empática seja rompida. Com a diferenciação
dos afetos, pode começar a surgir a raiva e a inveja e o analista, nesse
momento, terá que fazer o papel de mediador entre os opostos, não deixando o
paciente sucumbir. Nessas fases mais regressivas na análise, podem surgir
episódios de confusão, fragmentação e inundação emocional, que, no entanto,
podem estar anunciando a integração de alguns conteúdos. Como o maior
conflito nesse momento é a desistência de uma relação simbiótica em favor de
um estado mais diferenciado, um processo de reorganização pode
gradualmente surgir e o paciente começar seu caminho de desenvolvimento.
Por apresentarem dificuldade de simbolização, esses pacientes
têm um ego frágil que sofre constantes invasões de conteúdos do inconsciente
e são vivenciados de forma concreta. Muitas vezes fazem uma leitura
distorcida da realidade, por isso é necessário durante as sessões estar atento a
essas distorções, trazendo a eles o real e mostrando essas diferenças. O
analista deve utilizar-se das relações de transferência/contratransferências
para analisar e clarificar as maneiras distorcidas desses pacientes entenderem
as relações interpessoais.
Outra característica que percebi nesses pacientes é uma total
indiferenciação sexual; ora fazem sexo com homens, ora fazem com mulheres,
ora participam de orgias sexuais. Acredito que essa indiferenciação seja
consequência da não integração corpo/psique devido às experiências
traumáticas vividas não terem sido integradas e causarem essa dissociação. 
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Com tal indiferenciação, tornam-se mais vulneráveis a comportamentos de
risco e sujeitos a sofrerem novos abusos.
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Resultado de imagem para personalidade borderline famosos
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“A vivencia do amor é a mais eficiente vacina contra a angustia e contra
o peso da realidade da morte.”
Gilda Montoro
Ao tratarmos pacientes com Transtorno de Personalidade
Borderline, devido às peculiaridades e variedades de problemas de
personalidade e sintomas que esses pacientes tipicamente apresentam,
necessitamos de flexibilidade e integração das várias abordagens que se
dispuseram a investigar formas de tratamento dessa patologia. Para podermos,
como analistas, trabalhar com pacientes com graves distúrbios de apego e
vinculação, temos que enfatizar a empatia e a continência no setting
terapêutico. Temos também que reconhecer e aceitar nosso próprio sistema de
apego, temos de estar conscientes de nossas próprias feridas e atentos
constantemente a nossa sombra.
A contra-transferência deve estar consciente. Não devemos negar
a raiva, a irritação, o sentimento de impotência a depressão, pois isso constitui
um poderoso instrumento de nosso trabalho. Esses pacientes podem
constantemente estar atuando em nossas inseguranças, em nossas feridas e
em parte de nossa sombra, provocando uma contra-transferência patológica e
até mesmo um acting-out. Por isso, é extremamente importante trabalharmos
com supervisão, já que a demanda sobre o analista é muito grande. As crises e
oscilações durante a análise são repentinas e nem sempre previsíveis.
Devemos ter muita paciência e persistência ao lidarmos com
esses pacientes, porque somente aos poucos, apoiados no vínculo com o
analista e com a ajuda do seu próprio Si-mesmo e o do analista, os
sentimentos de desconfiança, destrutividade, demandas excessivas de amor
incondicional, falta de generosidade e sadismo ou masoquismo poderão ser
aceitos e integrados. A análise será uma experiência capaz de modificar os
modelos funcionais da pessoa e possibilitar transformações duradouras
(MONTORO,1994).
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Percebemos que, inicialmente, a criança vivencia um estado de
alienação com identificação total do ego com o Si-mesmo para, em seguida,
experimentar uma separação do Si-mesmo imposta pela realidade. Esses dois
movimentos são necessários para o desenvolvimento da consciência e os pais
são imprescindíveis nesse processo.
Na relação com o arquétipo da mãe, o ego da criança
experimenta uma vivência muito concreta do Si-mesmo. O amor maternal
nesse estágio é essencial e vital para a estruturação do ego, a fim de que
possa suportar os limites e frustações que a vida coloca. O arquétipo do pai,
enquanto terceiro elemento na dinâmica familiar, entra com a função de
separar a criança da mãe e está diretamente associado ao desenvolvimento da
consciência. Poderíamos afirmar que sem a figura masculina discriminatória, a
criança correria risco de ficar presa no universo inconsciente. Em geral, é
através do casal parental que a criança vivencia os arquétipos maternos e
paternos.
Com a presença das leis do arquétipo do pai, a criança tem
possibilidade de sair da relação simbiótica inicial que vive com a mãe, com a
vivência urobórica. O pai frustra a criança e mostra a ela a realidade externa.
Através dessa relação, a criança pode colocar limite em si mesma e no outro.
Essa experiência proporciona à criança a possibilidade de projetar seu mundo
interior e descobrir que existe outra realidade além daquela na qual estava
totalmente envolvida. É o arquétipo do pai que apresenta ao filho o mundo
externo e racional, que discrimina o eu e o outro que habita em nós. Para
podermos nos desenvolver, precisamos nos encontrar com nossa imagem de
mãe e pai. Enquanto o ego e a consciência não se fortalecerem e se
estruturarem, a criança não terá autonomia para diferenciar o dentro e o fora.
Só quando o indivíduo borderline conseguir ter a experiência de
uma relação positiva com uma figura parental, poderá libertar-se do aspecto
negativo e destrutivo a que se vê escravizado. Os pacientes borderline não
conseguem fazer o sacrifício simbólico da criança e realizar o luto pela perda
dos pais. Eles se mantêm fixados na imagem dos pais reais e, dessa forma,
não conseguem introjetar a vivencia dos arquétipos parentais globais.
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Esses pacientes vivenciaram a rejeição parental como uma
rejeição por parte de Deus. Essa experiência é incorporada à psique como
alienação permanente entre o ego e o Si-mesmo; eles têm duvidas em relação
a seu direito de existir. Na relação transferencial, o analista pode restaurar o
eixo ego-Si-mesmo danificado. O analista faz essa restauração, ajudando os
pacientes a sacrificar a experiência vivida com seus pais, a viver o luto por
essa perda, permitindo o acesso aos pais arquetípicos. A função simbólica do
analista ajudará o paciente a cruzar a ponte entre a concretude de suas
vivencias reais e as novas possibilidades de vivências simbólicas e
arquetípicas, integrando os papéis dos pais arquetípicos. Isso permite um novo
padrão de vinculação com o analista, com os outros e com o mundo.
Quem tem um complexo materno originalmente negativo, está
certo de não ser um indivíduo bom e de viver em um mundo ruim. Pensa que
seria melhor não existir. O mundo é tal como é e o indivíduo sente que é ele
mesmo o culpado de sua própria infelicidade. O complexo materno
originalmente positivo proporciona a uma criança o sentimento de incontestável
direito à existência, o sentimento de ser interessante e de ter parte em um
mundo que oferece tudo de que alguém necessita. A partir disso, esse eu
também pode entrar em contato, de modo confiante, com um “outro”. O corpo é
a base do complexo do eu (JUNG, 1986).
Como os pacientes borderline vivem uma cisão mente-corpo, a
relação do analista com o próprio corpo pode ser introjetada pelo paciente. O
analista pode usar suas próprias sensações corporais como uma estrutura de
referência e, refletindo sobre elas, descobrirá muitas ansiedades e temores
cindidos os quais poderiam de outra forma ficar escondidos, podendo, assim,
usar o corpo, como um veículo imaginal para acompanhar o processo do
paciente.
É desejável que a relação analista paciente se desenvolva em
duas fases: na primeira, o paciente testa a aceitação do analista, na segunda,
com uma mudança no padrão de transferência, o analista vale-se dessa
relação para estimular o paciente a enfrentar a situação que mais teme: a
diferenciação.
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Os pacientes borderlines nos fazem pensar de forma contundente
na importância do eixo ego-Si-mesmo como base na estruturação de toda
pesonalidade. O bom funcionamento desse eixo garante equilíbrio biológico e
psíquico. O grande desafio para nós, analistas, no tratamento dos pacientes
borderline, é conseguir construir um relacionamento, é criar um vínculo em que
eles possam se perceber aceitos e amados, em que possam reviver a relação
simbiótica inicial com a mãe, fortalecendo seu ego ao mesmo tempo em que
vamos colocando os limites e frustrando suas fantasias de deidade. Dessa
forma, é possível mostrar a realidade externa, o aqui e agora, proporcionando a
possibilidade de diferenciarem essas realidades de forma menos ameaçadora
e desintegradora do que foi a vivência real permeada por abandonos, rejeições,
abusos, negligências e agressividade. Para que isso ocorra, esse vínculo tem
que ser estruturado e percebido de forma real e genuína. A experiência de
aceitação pode restabelecer o eixo ego-Si-mesmo danificado, pode tirar o
indivíduo borderline do seu “deserto”, colocando-o em vinculação renovada
com a vida.
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